Em surto, jovem matou irmão com espeto em

Delírios, desconfiança excessiva, alucinações, alterações do pensamento e da afetividade, estes são alguns sintomas da esquizofrenia. A patologia não tem cura, no entanto, psiquiatras garantem que a medicação e acompanhamentos especializados reduzem significantemente as chances de surto, garantindo vida saudável para os pacientes e familiares. Os remédios e tratamentos não são baratos e devem ser disponibilizados pela saúde pública, que na teoria oferece o que é necessário para o quadro clínico estável, no entanto, familiares alegam que na prática a situação é diferente.

A equipe de reportagem do Jornal Midiamax, esteve em um Caps (Centro de Atenção Psicossocial) e foi informada sobre a falta de medicamentos. “Ficamos sem medicamente por uns 20 dias e depois a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde Pública) resolveu o problema”, admite um funcionário que não quis se identificar.

O problema de abastecimento também ocorre com outros medicamentos. Diagnosticada com depressão há pouco mais de um ano, Dovanir Boaventura, de 52 anos, diz ter ficado 30 dias sem a medicação. “Eu levei minha receita e disseram que não tinha o remédio que eu necessito tive de esperar 30 dias. Não tenho condições de comprar. É muito caro”, relata.

A família de Alberto Almeida Faria, de 36 anos, que matou o irmão Gilberto Almeida Faria, de 35 anos durante um surto de esquizofrenia na noite deste domingo (13), contou que a situação é ainda mais complexa. Segundo a mãe, Neura Almeida, de 66 anos, que vive em função do filho doente, a única forma de conseguir medicamento para Beto era dividindo os da irmã, que também sofre de esquizofrenia, ou comprando o que sobrava de outros pacientes, já que ele se recusava a procurar tratamento enquanto estava lúcido e não tinha paciência para esperar uma vaga nas unidades de saúde, quando estava em surto.

Consequência –

Como resultado da falta de medicação, Beto teve um surto e acabou matando o irmão, espetando o pescoço da vítima durante um jantar em família. Segundo o boletim de ocorrência, antes do ataque o paciente havia agredido a irmã com chutes. A vítima tentou defendê-la e foi assassinado.

O psiquiatra José Alaíde Lopes, afirma que com o uso do medicamento e com os acompanhamentos psicológicos e psicoterapeutas os surtos podem ser reduzidos.

“Não podemos evitar que a doença ocorra, mas podemos prevenir danos consequentes do não tratamento. A medicação é fundamental para a estabilização do paciente porque diminui muito a chance do paciente entrar em um surto psicótico”, explica.

Ao apresentar os primeiros sinais de agressividade, o paciente deve ser internado, orienta o especialista. “A família deve ficar muito atenta porque quanto mais surtos maiores a chance de pior evolução do paciente, mas quanto mais estabilizado menos riscos de surtos. Ao menor sinal de agressividade o paciente deve ser levado para uma unidade de saúde mais próxima. Se tivesse sido internado, evitaria que isso acontecesse”, observa.

O problema, segundo a mãe, é que se já era difícil conseguir a medicação, a internação parecia impossível para a família. Primeiro porque Beto não aceitava ir aos Caps no dia e hora marcados, e segundo, porque não tinha paciência para esperar por uma vaga em uma unidade de saúde. “Quando ele entrava em surto nós até conseguíamos levar no posto, mas ele não conseguia ficar esperando muito tempo, ainda mais sem medicação, já que os médicos diziam que estava em falta”, explica.

Ainda segundo a irmã mais velha, de 48 anos, que preferiu não se identificar, os médicos foram informados sobre o comportamento agressivo dele, mas mesmo assim afirmaram que não havia vagas e que a única coisa que poderia ser feita é aguardar. “Eu avisei que ele surtava, que batia na minha mãe e que ia acabar matando alguém, mas disseram que não podiam fazer nada além de pedir a vaga”, explicou.

Estatísticas –

Estudos revelam que a esquizofrenia atinge uma a cada 100 pessoas. Normalmente pacientes psiquiátricos apresentam os primeiros sinais da doença entre a segunda e terceira década de vida, no entanto, é possível que crianças e pessoas com mais de 40 anos manifestem a doença.

Registros do Corpo de Bombeiros mostram que em 2015 foram atendidas 2.035 emergências psiquiátricas em Mato Grosso do Sul, necessitando de contenção em 455 ocorrências. Em Campo Grande foram 876 atendimentos e 122 contenções.

Neste ano, de acordo com informações da assessoria de comunicação do Corpo de Bombeiros, foram 355 atendimentos com 79 contenções. Deste total 151 chamados com 25 contenções foram na Capital.

A assessoria de comunicação do Corpo de Bombeiros informa que o transporte dos pacientes para unidades básicas de saúde, Caps (Centros de Atenção Psicossocial) e hospitais são realizados conforme orientação do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência).

Conforme informações do Cnes (Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde) disponíveis no site do Datasus (Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde), no Estado existem 364 leitos psiquiátricos, sendo 233 do SUS (Sistema Único de Saúde).