O friozinho não espantou a criançada que fez fila para pegar os presentes  

Os termômetros marcavam 15 °C em na manhã deste domingo (11) e por volta das 8 horas, poucas pessoas se arriscavam a sair de casa. Na praça central da aldeia urbana Água Bonita, região norte da Capital, as ruas pareciam desertas. Tudo no mais tranquilo silêncio e assim permaneceria não fosse a ação orquestrada pelo grupo de amigos “Esquadrão da Juventude”.

De longe ouvimos o grito de quem já sabia o que procurávamos. “É ali, olha. Só pegar essa rua lateral e descer”. Pois bem, chegamos. Uma fila de mães e crianças empolgadíssimas nos receberam, sem nos dar grande atenção, afinal, o motivo de estarem ali era uma caixa enorme de brinquedos, uma cama elástica e doces. Tudo o que, do alto da pouca idade de uma criança, é o suficiente para se viver.

“Eles acordaram cedinho para vir pegar os brinquedos. Se fosse para ir para a escola, iam acordar chorando. Mas como é para ganhar brinquedo vieram na maior festa”, diz orgulhosa Nemia Dias, 27 anos, mãe de quatro crianças com 8, 6, 5 e 1 ano. Todos receberam presentes e, se não fosse a ação que alegrou a aldeia neste domingo, nenhum deles teria ganhado. “Está tudo muito difícil, não dá para comprar brinquedos não”, diz Nemia, que trabalha como faxineira.

Nemia faz parte do grupo de 138 famílias que se espremem em uma pequena faixa de terra nos fundos da aldeia Água Bonita há dois anos. De acordo com o cacique Nito Nelson, 50% delas são formadas por filhos dos primeiros moradores da aldeia e a outra metade é formada por indígenas que viviam em outros bairros de Campo Grande. Eles esperam a regularização do espaço que ocupam para que possam construir moradias definitivas nos terrenos que medem 10×20 metros cada.

“A gente fica muito feliz quando vem uma ação dessas para cá. Mostra para as outras pessoas que todos são bem-vindos aqui. É muito bom ver as mães tão felizes pela alegria das crianças”, conta o líder da aldeia que possui mais de 14 anos de história.

Algumas das crianças receberam presentes pela primeira vez em toda vida, como é o caso das irmãs Mikaely e Franciely Balbino, de 8 e 6 anos respectivamente. As duas ganharam uma boneca similar a famosa “Barbie” e estavam radiantes com as novas companheiras. “Estamos felizes é uma boneca bem bonita”, disse a tímida Mikaely em poucas palavras.

Quem gostaria muito de ter ganhado a tal “Barbie” é Ketellem, 10 anos, mas não foi desta vez que isso aconteceu. Seu pacote veio com um liquidificador de brinquedo, nada que a entristecesse. “Eu gostei bastante, queria a Barbie, mas esse é legal também por que tenho umas panelinhas e aí dá para brincar junto”, explicou ao aguardar na fila do pula-pula que,aliás, é a grande atração da festa. “Eu quero ir no pula-pula um monte de vezes”, disse uma criança enquanto outra em seguida respondeu: “eu que vou, pode parar”.

E é exatamente esta festa e encantamento que motivam as ações do grupo, como explica Fábio Rocha, 22 anos. Ele faz parte da diretoria do Esquadrão da Juventude, responsável pela ação. “A recompensa é sempre poder, de algum modo, contribuir para o sorriso de tantos pais e crianças. É pouco, só um brinquedo, uma manhã divertida, mas isso é muito para muita gente e o suficiente para fazer crianças felizes”, conta.

De acordo com ele, as arrecadações começaram em abril. Houve muito empenho para fazer do evento o maior que já realizaram nestes três anos de história do grupo. “Mesmo começando bem antes, este ano foi muito difícil, por conta da crise. Fizemos arrecadações e rifas, como muita gente não pagou, não participou por falta de dinheiro, quase não fizemos a entrega, mas nos juntamos nos últimos dias e conseguimos o que restava para dar presentes para todo mundo.”

Pelo menos 300 crianças vivem na aldeia e o grupo preparou 400 presentes, para não ter perigo de ninguém ficar sem. “Vai dar para todos e o que sobrar nós levamos para outra comunidade.” Um domingo frio e feliz para todos eles.  

Brinquedos e pula-pula mudam rotina de crianças em aldeia indígena

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