Senadores repudiaram, nas redes sociais, o ataque do presidente da República, Jair Bolsonaro, a um repórter do jornal O Globo, neste domingo (23), em frente à Catedral de . Questionado sobre o porquê dos 27 depósitos feitos entre 2011 e 2016 pelo ex-assessor Fabrício Queiroz na conta da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, que totalizaram R$ 89 mil, Bolsonaro disse ao jornalista querer “encher tua boca com uma porrada”, sem responder à pergunta. As agressões do presidente a jornalistas, principalmente os que publicam denúncias contra a família Bolsonaro, são reiteradas.

O líder da Minoria, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), protocolou, no Supremo Tribunal Federal (STF), pedido de abertura de inquérito para que a Procuradoria-Geral da República investigue a conduta de Bolsonaro, além de ter feito petição à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) para que o órgão acompanhe a violência contra a liberdade de imprensa no Brasil. Segundo o parlamentar, a mídia brasileira tem sido tratada com descaso pelo presidente, que também incita o comportamento violento de seus apoiadores contra os profissionais.

“Superamos a ditadura, somos uma democracia e Bolsonaro tem que respeitar os direitos adquiridos”, afirmou Randolfe no .

Na opinião de Randolfe, o medo de responder os questionamentos sobre o dinheiro depositado por Queiroz “é tão grande que Bolsonaro quer silenciar quem o fiscaliza”.

Essa visão é compartilhada por Humberto Costa (PT-PE). “A absurda ameaça feita por Jair Bolsonaro a um repórter de O Globo que perguntou sobre os depósitos suspeitos de Queiroz na conta da primeira-dama mostra o desespero do presidente. Até hoje, ele não deu qualquer explicação sobre o assunto. Por quê? Cadê a resposta, falastrão?”, questionou nas redes.

Na manhã desta segunda-feira (24), o presidente Jair Bolsonaro se manifestou via Twitter: “Há pelo menos 10 anos o sistema Globo me persegue e nada conseguiram provar contra mim. Agora, aguardo explicações da família Marinho [proprietária do Grupo Globo] sobre a delação do ‘doleiro dos doleiros’, onde valores superiores a R$ 1 bilhão teriam sido repassados a eles”.

Ele se referiu a denúncia feita por Dário Messer, conhecido por “doleiro dos doleiros”, que, em depoimento no dia 24 de junho, disse ter feito repasses de dólares em espécie para os Marinho em várias ocasiões a partir dos anos 1990. O doleiro foi investigado na CPI do Banestado, de 2003, e teve o nome citado no escândalo do Mensalão, em 2005.

Nenhum senador da base do governo se manifestou sobre as representações protocoladas pelo líder da Minoria.

Por quê?

Durante todo o domingo, os usuários do Twitter movimentaram a com a pergunta feita pelo repórter no domingo: “Presidente Jair Bolsonaro, por que sua esposa Michelle recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz?”. Os senadores Veneziano Vital do Rego (PSB-PB), Rogério Carvalho (PT-SE) e Jean Paul Prates (PT-RN) também publicaram o questionamento.

“Gostaria de perguntar olhando nos seus olhos, Jair: Por que sua esposa, Michelle, recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz? Se o Bolsonaro de 2018 que não tinha acordo, nem conversa com bandido e não admitia safadeza, se encontrasse com o Bolsonaro de hoje, será que daria porrada?”, tuitou o senador Major Olímpio (PSL-SP).

“Nada justifica o presidente da República ofender e ameaçar um repórter que faz uma pergunta simples e direta: porque o casal Queiroz transferiu quase 90 mil reais para a primeira-dama? Se não existir segredo nem crime, qual a dificuldade de responder? O Brasil espera a resposta”, opinou o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).

O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) lembrou ainda que a “Constituição brasileira garante liberdade de imprensa e liberdade de expressão. Atentar contra isso é crime. Chegamos ao medievalismo de ver um presidente ameaçar a integridade física de um jornalista”.

Entidades

As entidades que representam a imprensa publicaram notas repudiando a violência do presidente. A Associação Brasileira de Investigativo (Abraji) lembrou que a ameaça de agressão física se soma a um histórico de forte hostilidade de Bolsonaro contra jornalistas e marca um novo patamar de brutalidade.

Segundo a Abraji, desde o início de seu mandato, Jair Bolsonaro vem demonstrando “carecer de preparo emocional para prestar contas à sociedade por meio da imprensa, uma responsabilidade de todo mandatário nas democracias saudáveis”.

“A reação, ao ouvir uma pergunta incisiva, foi não apenas incompatível com sua posição no mais alto cargo da República, mas até mesmo com as regras de convivência em uma sociedade democrática. Um presidente ameaçar ou agredir fisicamente um jornalista é próprio de ditaduras, não de democracias”, diz o texto.

Segundo a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), falta compostura e decoro ao presidente, que mais uma vez “choca o país com seu comportamento grosseiro”. “Tal comportamento mostra não apenas uma inaceitável falta de educação. É, também, uma tentativa de intimidação da imprensa, buscando impedir questionamentos incômodos”, diz a nota.

Para a Associação Nacional de Jornais (ANJ), “é lamentável que mais uma vez o presidente reaja de forma agressiva e destemperada a uma pergunta de jornalista. Essa atitude em nada contribui para o ambiente democrático e de liberdade de imprensa previstos pela Constituição”.