Integrantes de duas frentes parlamentares e representantes de movimentos sociais se reuniram em live nesta segunda-feira (10) com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, para pedir a votação do Projeto 1975/20, que suspende despejos durante a pandemia de Covid-19.

Também foi a solicitada a derrubada, por meio de votação no Congresso Nacional, do veto presidencial ao artigo 9 do Projeto de Lei 1179/20, que impedia as ações de despejo.

Os pedidos foram reforçados em nota pública assinada pelas duas frentes – Frente Parlamentar Mista em Defesa da Reforma Urbana e dos Movimentos de Luta por Moradia; e Frente Parlamentar Mista em Defesa da Democracia e dos Direitos Humanos com Participação Popular – e pela Presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara (CDHM).

A nota também reivindica a suspensão do cumprimento de medidas judiciais, extrajudiciais ou administrativas de despejos, desocupações, reintegração de posse ou remoções durante o estado de calamidade pública decretado por causa do coronavírus.

Rodrigo Maia disse que a inclusão do Projeto de Lei 1975/20 na pauta de votações vai depender de decisão conjunta entre os partidos. “Vou tentar um acordo, não entrar com a votação deste projeto de qualquer forma. Quanto ao veto do presidente a um artigo do Projeto de Lei 1179, vamos seguir votando juntos, não vai haver problemas. Vamos tentar construir juntos um caminho para resolver essas questões”, afirmou.

Mobilização

O Projeto de Lei 1975/20 tramita em regime de urgência e em conjunto com o PL 827/20 e outros 19 projetos sobre o tema. Os participantes da reunião planejam uma mobilização envolvendo os autores das propostas, juntamente com movimentos sociais e classe artística.

“Impedir o despejo coletivo de famílias em situação de vulnerabilidade é uma questão humanitária. Há absurdos de famílias que já passaram por dois despejos. Tudo leva a um risco tremendo, pessoas ficam sem casa e aglomeradas. Articular a votação deste projeto é fundamental”, disse a autora do PL 1975/20, deputada Natália Bonavides (PT-RN).

“Temos recebido inúmeras denúncias de despejos pelo País e queremos um entendimento com a Presidência da Câmara para agilizar a votação de projetos que enfrentem o problema”, disse o presidente da CDHM, deputado Helder Salomão (PT-ES).

O deputado lembrou que também houve pedido feito pelo representante regional para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Jan Jarab, de atenção especial aos projetos de lei sobre direitos humanos no contexto da Covid-19.

Desabrigados

O presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Reforma Urbana e dos Movimentos de Luta por Moradia, deputado Paulo Teixeira (PT-SP), ressaltou que “a maior recomendação é que as pessoas fiquem em casa, mas aumenta o número de pessoas nas ruas, despejadas de suas casas, e continuamos com a média de mil mortos por dia por causa da pandemia”. “A derrubada do veto presidencial e a votação dos projetos de lei são fundamentais para a população”, afirmou.

A preocupação com os despejos também foi manifestada pelo deputado Marcelo Freixo (-RJ), que é presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Democracia e dos Direitos Humanos com Participação Popular. “Nas grandes cidades, o número de moradores de rua aumentou muito e, neste momento de pandemia, o risco é muito grande. E os números de óbitos causados pela pandemia mostram que as maiores vítimas são os pobres. Essa política de despejos não tira só as casas, mas também a vida pessoas”, disse Freixo.

“Essa questão nos persegue desde o início da pandemia, apesar das recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e de outras instituições. Os despejos são dramáticos. Precisamos de uma solução que enfrente essa situação, como esse projeto de lei e a derrubada do veto do presidente Bolsonaro. Muitas famílias que pagavam o aluguel certinho tiveram o salário reduzido ou perderam o trabalho. Isso é uma falta de sensibilidade”, disse a representante do Movimento Nacional pela Moradia, Ivanisa Rodrigues.

O representante da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam), Getúlio Vargas, alertou sobre o aumento do déficit habitacional após mudanças, em 2019, no programa Minha Casa, Minha Vida. Ele disse também que “o Congresso é um dos únicos canais de diálogo hoje, e esse projeto de lei é importante para que famílias não sofram mais violações”.

Conflitos no campo

O presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT), dom André de Witte, informou que, em 2019, foram 1.254 despejos envolvendo mais de 10 mil famílias, um aumento de 12% em relação a 2018 nos casos de ameaças de despejo judicial e tentativas de expulsão. Além disso, de acordo com o relatório da CPT “Conflitos no Campo 2019”, o primeiro ano do governo Bolsonaro teve o maior número de hectares em conflito: 53 milhões de hectares, uma área equivalente ao território da Bahia.

“Estamos falando da defesa da vida. Alguns desses conflitos são casos que se arrastam há até 30 anos, com pessoas construindo, plantando, e sempre sob o risco de despejo”, afirmou.

Integrante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Alexandre Conceição criticou a falta de atuação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (). “Temos um Incra paralisado diante dos despejos. Um órgão que não exerce a sua função. Hoje, temos 66 áreas prontas para assentar milhares de famílias e nada é feito. Mesmo assim, continuamos produzindo alimentos para todo Brasil”, disse.

Quilombolas

O representante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Biko Rodrigues, lamentou a situação atual. “Hoje, temos mais de 200 ordens de despejo de comunidades quilombolas em todo o País. Já morreram 145 pessoas [dessas comunidades] por causa do Covid-19 e temos 3 mil quilombolas infectados, principalmente na região Amazônica, onde existem várias obras em territórios quilombolas. Nosso inimigo não dorme”, afirmou.

O deputado Rogério Correia (PT-MG) alertou sobre a necessidade de evitar o despejo de famílias do acampamento Quilombo Campo Grande, na Fazenda Ariadnópolis (MG). A ordem da Justiça para reintegração de posse está prevista para esta quarta-feira (12), e a Presidência da CDHM tem feito gestões sobre o tema. “Estamos correndo contra o tempo, e o risco de atrito é muito grande. Peço que a Presidência da Câmara pondere com o governo e o Judiciário mineiros para evitar este despejo”, disse Correia.

Também na reunião, o representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Paulino Montejo, pediu que o Parlamento continue sendo “uma trincheira da democracia e de equilíbrio das relações institucionais”. “Estamos sob a mira de políticas, práticas jurídicas e econômicas há mais de 500 anos. Somos solidários aos movimentos do campo e da cidade pelos direitos coletivos”, declarou.