Governos usam tecnologia e identidade digital para diminuir burocracia
O uso intensivo de tecnologia no setor público e a adoção de carteiras de identidade digital tem permitido que países como Estônia, Índia e Uruguai eliminem ou diminuam a burocracia na relação entre governo e cidadãos. As estratégias desses governos são destaque no GovTech Brasil, conferência organizada pelo BrazilLAB e pelo ITS-Rio (Instituto de Tecnologia e […]
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O uso intensivo de tecnologia no setor público e a adoção de carteiras de identidade digital tem permitido que países como Estônia, Índia e Uruguai eliminem ou diminuam a burocracia na relação entre governo e cidadãos.
As estratégias desses governos são destaque no GovTech Brasil, conferência organizada pelo BrazilLAB e pelo ITS-Rio (Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro), que teve início nesta segunda-feira (6), em São Paulo.
Em um painel sobre a experiência do país europeu, o ex-presidente da Estônia Toomas Hendrik Ilves (2006 – 2016), apresentou o avanço do país em digitalização do governo nas últimas duas décadas.
Pela internet, é possível obter o registro de identidade, votar, receber uma prescrição médica, abrir e fechar empresas -tudo em um único portal oficial.
O investimento foi feito no sistema de autenticação: cada cidadão tem uma identidade online única que equivale a uma assinatura física, como as feitas em cheques ou contratos.
Basicamente, tudo que é preciso fazer de forma presencial no Brasil, o estoniano faz pelo celular ou pelo computador.
Ilves diz que a digitalização gera uma economia de 2% do PIB (Produto Interno Bruto) para o país europeu. México e Panamá se preparam para adaptar o sistema aplicado na Estônia em suas realidades, diz Ilves.
“Quando você faz algo assim, há uma revolução na burocracia. Isso permite processamento de informações em paralelo, as coisas são feitas de uma vez. Você pode abrir um negócio em 15 minutos, enquanto na maior parte da União Europeia leva meses”, afirmou Ilves.
A identidade permite que os dados fiquem armazenados e os cidadãos não precisem repassá-los ao governo toda vez que precisarem usufruir de um serviço.
É preciso ressaltar, no entanto, que a Estônia segue uma legislação rígida que impõe regras de proteção de dados e segurança, o GDPR (Regulamento Geral de Proteção de Dados da Europa, na sigla em inglês). A lei determina normas que assegura que Poder Público e empresas protejam as informações de cidadãos contra vazamentos e violações de privacidade.
Segundo Ilvez, é possível garantir isso sem abrir mão da liberdade dos cidadãos. A Estônia disputa com a Islândia o posto de país com o maior nível de segurança da informação, afirma.
O ex-presidente conta que a iniciativa de tornar o país digital surgiu da competição com a Finlândia. Em 1938, as duas nações, que dividem laços culturais e possuem línguas parecidas, tinham o mesmo PIB. Após a Segunda Guerra Mundial, a Estônia enfrentou problemas econômicos e precisou se reinventar. Traçou um plano e, a partir dos anos 1990, com a popularização da internet, investiu nos estudos de computação nas escolas.
Também contou com auxílio financeiro de 50% da iniciativa privada para criar seu sistema de autenticação. “A questão não é de tecnologia. Ela é tão barata atualmente que não é mais uma barreira. O que você precisa é de vontade política para fazer isso, para digitalizar a sociedade”, disse Ilves.
América do Sul
Já o Uruguai, tema de outro painel, fornece a todos os cidadãos o direito de uma identidade digital ao nascer. O programa digital do Poder Público é semelhante ao da Estônia. Há um portal unificado para diferentes serviços.
José Clastornik, da Agesic (Agência de Governo Eletrônico e Sociedade da Informação e Conhecimento do Uruguai), destacou o papel da tecnologia no combate à desigualdade social. A rastreabilidade de alimentos, por exemplo, é disponível para toda a cadeia agropecuária, não apenas para grandes produtores que têm poder aquisitivo para terem chips e sistemas de processamento.
Em termos de digitalização do governo, o Uruguai é líder da América Latina. Todas as empresas, segundo Clastornik, têm internet de fibra ótica e podem emitir notas fiscais digitais.
Para segurança e privacidade, o país também conta com uma lei de proteção de dados, o que atrai investimentos da Europa, que exige parâmetros legais para a transação internacional de dados.
“Quando falamos de governo digital, não falamos só de burocracia, mas de serviços eletrônicos e inovação. Por que estamos em primeiro? Não só pela liberdade de informação, mas pela maneira com que criamos os espaços digitais para que possamos colocar em prática o governo aberto”, afirma.
A expectativa é que, em 2020, toda população com mais de 20 anos tenha um cartão de identidade digital e possa autenticar diferentes tipos de transações com ele, incluindo as financeiras. Outro objetivo é digitalizar 100% dos serviços públicos em dois anos (hoje, o número é de 50%).
A Índia é outro exemplo de digitalização, que será destaque em painel nesta tarde, com palestra do investidor Sahil Kini. Há seis anos, o país iniciou uma mudança na área ao investir na identidade digital. Hoje, já não é preciso ir a um banco para abrir uma agência, a um departamento público para solicitar benefícios sociais ou a um colégio para realizar uma matrícula.
E o Brasil?
Para Ronaldo Lemos, colunista da Folha de S.Paulo e diretor do ITS-Rio, um dos idealizadores do evento, todos os governos do mundo se transformarão em plataformas tecnológicas e a democracia será exercida por meio da tecnologia. O Brasil, nesse sentido, está obsoleto.
Em março deste ano, o país aprovou uma Estratégia para a Transformação Digital, que busca digitalizar o país em diferentes áreas. Na opinião de Lemos, o texto é “uma peça literária interessante no papel”.
“Não tem cronograma, não tem meta e não tem orçamento. O governo tem acelerado agendas equivocadas. O Documento Nacional de Identificação, por exemplo, pode unificar diferentes bases de dados. Todas as experiências bem-sucedidas mostram que você deve unificar o serviço ao cidadão, mas distribuir as bases de dados por uma questão de segurança.”
A carteira digital de motorista é outro exemplo de como o governo ainda não consegue usar a tecnologia para reduzir a burocracia. A adesão é de cerca de 0,4%. O documento não oferece novas facilidades ao cidadão, é apenas uma versão digital do documento físico.
Apesar do atraso em relação aos três países, o Brasil subiu cinco posições no Global Innovation Index, que mede a inovação de governos. O país ocupa o 64º lugar.
Outro fator importante para promover mais inovação é a necessidade de instaurar uma regulação relativa à proteção de dados pessoais. Embora o Senado tenha aprovado um projeto no mês passado, especialistas temem que o governo vete pontos essenciais da lei.
O GovTech deve reunir 400 pessoas, incluindo 20 palestrantes nacionais e 16 internacionais, nos dois dias de evento.
Nesta terça (7) haverá debate entre candidatos à Presidência Geraldo Alckmin (PSDB), João Amoêdo (Novo) e Marina Silva (Rede) já confirmaram presença, segundo a organização do evento.
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