Manifestantes em Salvador protestam contra morte de pessoas LGBT

50 entidades representativas

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50 entidades representativas

Na noite de hoje (15), o tradicional e boêmio bairro do Rio Vermelho, em Salvador, foi palco de um protesto contra as mortes de pessoas LGBT (Lésbicas, gays,  bissexuais, transexuais e transgêneros). O evento Chega de LGBTfobia foi criado no Facebook depois que o jovem Leonardo Moura, de 30 anos, morreu, no início desta semana, após sair de uma boate voltada para o público LGBT. O psicólogo Gilmaro Mendes, criador do evento na internet, diz que o ato ocorreu em conjunto com cerca de 50 entidades representativas, de forma coletiva.

“A ideia surgiu em um grupo de mães de pessoas LGBT e eu apenas criei o evento. Muita gente começa a pensar nos amigos, filhos, parentes que sofrem e podem sofrer homofobia e estão aqui, porque todo dia tem um caso novo, cada vez mais próximo, como aconteceu com um companheiro meu, que foi vítima de latrocínio, mas foi muito maltratado durante sua morte por ser homossexual”, diz Mendes.

Não ao ódio

Na orla do Rio Vermelho, em frente à boate onde Leonardo Moura esteve antes de morrer, militantes, intelectuais, artistas e sociedade civil reuniram-se e, com palavras de ordem, disseram não suportar mais o ódio e a discriminação com que os homossexuais são tratados na Bahia e, sobretudo, na capital Salvador.

Felipe Mendes, de 27 anos, participou do ato e disse ter dificuldades para demonstrar carinho e afeto pelo marido, com quem é casado há sete anos. Para ele, é um risco estar em público de mãos dadas com o companheiro.

“São poucos os lugares onde me sinto à vontade para abraçar e beijar meu marido por causa do preconceito e da intolerância. Hoje, o que mais falta é respeito e isso assusta a gente, porque você perde o seu direito de ir e vir e de viver”, disse o assistente de produção.

A publicitária Vanessa Moura, de 23 anos, disse que anda sempre em grupo com meus amigos e acredita que, por isso, nunca foi vítima de violência ou preconceito. “Mas o machismo ainda é forte, porque os homens nos sexualizam [mulheres] independente da nossa orientação sexual, e acham que têm espaço nas relações entre duas mulheres”, diz.

Mortes na Bahia

O Grupo Gay da Bahia, um das entidades envolvidas no evento, diz que, somente este ano, 20 pessoas morreram no estado, com motivações relacionadas à homofobia e ao ódio às pessoas LGBT. A 20ª vítima foi Leonardo Moura, cuja morte ainda não foi elucidada, pois a polícia continua investigando o caso. Apesar disso, a família do rapaz acredita que o crime foi motivado por homofobia.

Outro coletivo que participou do protesto foi o grupo Mães pela Diversidade, composto por mães de pessoas que se enquadram no universo LGBT. A administradora de empresas Efigênia Cardoso tem um filho homossexual de 29 anos e diz que lida normalmente com a sexualidade dele, mas a preocupação é com a intolerância e o ódio nas ruas. “Ele não mora mais comigo, mas eu não durmo enquanto não me der notícias porque a cidade está muito violenta em relação a tudo e, principalmente, aos homossexuais”.

Para o professor da Universidade Federal da Bahia  e pesquisador na área de cultura e sexualidade, Leandro Colling, o Brasil retrocedeu, nos últimos anos, em relação à tolerância e ao respeito pelas diferenças. Ele atribui isso à falta de políticas públicas de enfrentamento à homofobia e apoio a pessoas LGBT e também ao espaço que vem sendo conquistado por representantes fundamentalistas, sobretudo nos legislativos municipais, estaduais e federal.

“Antigamente, as pessoas tinham vergonha de ser preconceituosas e hoje algumas têm orgulho de ser assim. Há bancadas conservadoras dominantes nas três esferas, muito articulados e em grande escala. O fundamentalismo religioso, por exemplo, é uma expressão disso: elege como inimigos determinados setores, como os LGBTs, os praticantes de religiões de matrizes africanas, as feministas etc”, diz.

Segundo Colling, não existem políticas públicas efetivas contra a homofobia nas cidades, nos estados e nem no país, apenas ações isoladas. “[Isso] não resolve o problema da homofobia. Política pública é política de estado, independente de quem está no governo. Essas políticas devem existir em várias esferas: políticas de comunicação, de cultura, de educação, saúde, Justiça, e que atravesse os governos e seja transversal, mas a gente não tem isso”, disse.

Intolerância

Apesar das conquistas que algumas pessoas vêm adquirindo de forma individual, a intolerância e o desrespeito continua perseguindo o universo LGBT, conforme relatos dos participantes do ato contra a homofobia e a transfobia. Ariane Peres de 32 anos é transexual e seu nome já consta no documento oficial. Prestes a concluir a faculdade de psicologia, ela diz que vem conquistando espaços aos poucos, mas o desrespeito e a falta de conhecimento ainda atingem as pessoas do mesmo universo que ela.

“Além da transfobia que acontece na rua, existe também a transfobia institucional. A gente vê a violência duas vezes: a chacota e a violência nas ruas e quando vamos registrar isso nos órgãos públicos, como em uma delegacia por exemplo. A gente percebe essa transfobia também nos servidores, com a exclusão e a dificuldade na denúncia”, diz Ariane, que esteve no ato, acompanhada pelo marido.

Após a concentração em frente à boate, centenas de pessoas seguiram em passeata pela orla do Rio Vermelho, até o mercado do peixe, onde encerraram o ato, ao som de tambores. Violência contra pessoas LGBT devem ser denunciadas, por telefone, no Disque 100.

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