“Nunca falei com um brasileiro sobre o ‘mensalão'”, disse Mujica

O presidente do Uruguai José Mujica negou na sexta-feira (8) que tenha conversado com Luiz Inácio da Silva sobre o escândalo do “mensalão”, rebatendo informações neste sentido que constam de sua biografia autorizada “Uma ovelha negra no poder”.

“Aparece o amigo Lula ali conversando comigo sobre o ‘mensalão', mas nunca falei com um brasileiro sobre o ‘mensalão', por questões minhas. (José) Dirceu para mim não é um criminoso, está condenado, mas é um formidável lutador”, disse Mujica sobre o ex-chefe da Casa Civil, condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção.

Segundo a biografia de Mujica, escrita pelos jornalistas uruguaios Andrés Danza e Ernesto Tulbovitzii, o ex-presidente brasileiro “não é um corrupto” e viveu o escândalo do “mensalão” com “angústia e alguma culpa”.

De acordo com a biografia, Lula teria contado a Mujica no início de 2010, numa reunião em Brasília, que tinha que “lidar com muitas coisas imorais, chantagens” e que “esta era a única maneira de governar o Brasil”.

O Instituto Lula emitiu um comunicado que cita uma nota do portal de notícias G1 segundo a qual Andrés Danza nega que tais reflexões se referem ao “mensalão”.

Lula sempre negou ter qualquer informação sobre o escândalo que comprometeu grande parte da estrutura política do Partido dos Trabalhadores (PT) e do aparato governamental.

Em 2005, quando os detalhes do esquema de pagamentos mensais para comprar apoio político começaram a aparecer na imprensa, um indignado Lula disse se sentir traído pelas práticas inaceitáveis das quais não tinha conhecimento.

Esta prática é muito antiga, “grandes políticos da história precisaram recorrer a mecanismos similares”. “As vezes este é o preço infame das grandes obras', disse Mujica.

“Lula não é corrupto como foi (o ex-presidente Fernando) Collor de Mello e outros presidentes brasileiros”, refletiu Mujica, de acordo com a biografia.

Andrés Danza, um dos autores, afirmou que boa parte do livro se debruça em reflexões sobre o Brasil. “Mujica vê Dilma (Rousseff) e Lula como uma espécie de padrinhos, os dois lhe ajudaram muito. Sobre Dilma diz que sempre esteve a serviço do Uruguai, que é mais executiva do que Lula, mas que tem menos carisma”.

A biografia também traz comentários sobre o ex-presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que teria revelado a Mujica que durante um desentendimento com a Colômbia o presidente russo, Vladimir Putin, aconselhou-o militarmente para um eventual confronto com o país vizinho.

 

E ainda fala sobre o apoio da presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, a Mujica durante as eleições de 2009.

Nas linhas do livro, também abundam críticas a membros do seu partido, ao Poder Judiciário, a organizações sociais e grupos feministas, e mesmo ao ex-vice-presidente Danilo Astori, que é descrito por Mujica como um homem sem carisma e “sex appeal”.

O ex-presente admitiu aos jornalistas outras curiosidades como, sendo presidente, andava armado quando saia sozinho. “Podem me limpar, mas com certeza levo algum junto”, disse Mujica.

Os autores observam que Mujica teria informações de um suposto complô para derrubá-lo desde os primeiros anos de sua administração, e que, “para evitar um golpe de Estado, depôs ministros e líderes de todos os escalões, promoveu leis controversas, assumiu o protagonismo em conflitos internacionais, recebeu refugiados sírios, aceitou abrigar ex-prisioneiros de Guantánamo (…) tudo feitos para não deixar nenhuma dúvida de quem era o presidente”.

Danza comentou que depois de ler a biografia, Mujica disse que concordava com algumas coisas e discordava de outras. “Ele provavelmente não queria que algumas coisas fossem escritas. Uma coisa sobre ele é que ele é verdadeiro, fala o que pensa, e isso às vezes trabalha a favor e outras contra”.