Presidente do STF analisou caso de presa preventiva por tráfico de drogas

A grávida Renata Gonçalves Cardoso, de 24 anos, presa preventivamente por tráfico de drogas, conseguiu ontem no STF (Supremo Tribunal Federal) o direito de cumprir pena em casa. A decisão é do presidente da Corte, ministro , que, ao conceder o benefício, considerou tanto a gestação avançada da presa — de nove meses — quanto sua condição de cardiopata. Ontem, o tribunal enviou à Penitenciária Feminina da cidade de São Paulo um ofício, determinando a imediata transferência de Renata à prisão domiciliar. A decisão tem validade apenas para esse caso, mas uma lei — geralmente ignorada — garante à gestante presa preventivamente o direito de passar os últimos três meses de gravidez em casa, independentemente de sua condição de saúde.

De acordo com Lewandowski, mesmo se ficar comprovado que a presa é culpada, o bebê não pode ser penalizado por isso. Ele citou trecho do artigo 5º da Constituição, que estabelece que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”.

Especialistas ouvidos concordam em um ponto: a decisão do STF é um marco na luta pelo direito das presas, entretanto, é “triste” o fato de ter sido necessário chegar à Corte Suprema para garantir o direito da grávida . Para o defensor público e chefe do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria de São Paulo, Bruno Shimizu, é urgente que os juízes das primeiras instâncias apliquem a lei que já existe:

“Esse caso é uma vitória, mas também uma derrota no sentido de que tivemos que chegar ao STF para aplicar a lei. Os juízes estão se negando, talvez por achar que cadeia seja bom. Há um preconceito por parte do Judiciário para colocar essa legislação em prática. Parece que não está entre os objetivos do TJ garantir a dignidade das pessoas presas.”

Segundo a Defensoria, São Paulo tinha, em 2013, 2.422 mães presas. Delas, 147 estavam grávidas, e 247, amamentando. No sistema carcerário do Rio de Janeiro, por sua vez, há, atualmente, 25 presas grávidas. O dado é da Secretaria de Administração Penitenciária fluminense.

Coordenadora do Fórum Nacional de Conselhos Penitenciários Estaduais, Maíra Fernandes torce para que a decisão do STF reflita em outras políticas para o sistema prisional feminino.

“A prisão não é pensada sob uma ótica de gênero. São prisões masculinas, adaptadas para se tornarem femininas”, disse.

 

Pela saúde física e psíquica

Na decisão, o ministro citou as Regras Mínimas para Mulheres Presas, aprovadas em dezembro de 2010 pela ONU (Organização das Nações Unidas). No documento, está previsto o uso de alternativas à prisão para mulheres infratoras, “considerando o histórico de vitimização de diversas mulheres e suas responsabilidades maternas”. Lewandowski explicou que, pela lei, o poder público é obrigado a oferecer atendimento prioritário às gestantes. Isso entraria em conflito com o fato de que o presídio onde Renata está tem capacidade para 604 detentas, mas, em dezembro, sua lotação era de 685 pessoas.

 

Antes de o habeas corpus chegar ao STF, Renata teve o mesmo pedido negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça). A decisão do STJ foi tomada no dia 26, no regime de plantão adotado durante o recesso forense. Ao analisar a ação, Lewandowski ponderou que o caso de Renata era de “flagrante violação aos direitos humanos”, portanto, concedeu o habeas corpus.

O presidente do STF ainda considerou que houve ilegalidade na decisão que transformou a prisão provisória de Renata em preventiva. O primeiro tipo tem poucos dias de duração, a critério do juiz. Já o segundo pode durar meses, também conforme decisão judicial. Renata foi presa em 20 de maio. Oito dias depois, o juiz determinou sua prisão preventiva com base na gravidade de seu crime (tráfico de drogas), e não em evidências de que a ré teria cometido o ilícito. Segundo Lewandowski, não há previsão em lei para decisões com esse fundamento.

No pedido ajuizado no STF, a Defensoria Pública de São Paulo argumentou que as péssimas condições dos presídios paulistas causam “efeitos deletérios à saúde física e psíquica de qualquer pessoa”. Os efeitos seriam ainda piores sobre uma grávida em estágio avançado.

De acordo com o processo, Renata tem outros dois filhos: um de seis anos e outro de nove. Ontem, a Defensoria foi procurada para saber sobre a gravidez da presa, mas não soube informar se a criança já havia nascido.