A juíza Aline Beatriz de Oliveira Lacerda, da Vara de Fazenda Pública e Registros Públicos de Três Lagoas, cidade sul-mato-grossense, situada na divisa com o estado de São Paulo, afastou da política o ex-prefeito Ângelo Chaves Guerreiro, 56, do PSDB, até o ano de 2033, período de oito anos.
Caso confirme a sentença, o episódio frustra os planos de Guerreiro, que planeja retornar à Assembleia Legislativa como deputado estadual.
O ex-mandatário foi sentenciado por suspeitas de irregularidade num contrato firmado com a Financial Construtora Industrial Ltda, coletora de lixa, sem licitação e, em regime de urgência. Havia na cidade empresas interessadas em prestar o serviço a um custo menor, mas foram preteridas pelo prefeito.
Além da punição política, o ex-prefeito e a empresa favorecida no negócio, pela condenação, terão de devolver em torno de R$ 10,5 milhões aos cofres públicos, determinou a magistrada. As cifras referem-se ao dano causado ao município e, também o que a magistrada chamou de “multas civis”.
Ângelo Guerreiro nega a irregularidade. Os sentenciados ainda podem recorrer.
O caso
A condenação da empresa e do ex-prefeito ocorreu graças a duas ações, uma por improbidade administrativa, movida pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) e, outra, por Vanderlei Amaro da Silva Junior, ex-candidato a deputado federal, que ingressou com ação popular contra Guerreiro.
De acordo com as ações, há anos a Financial Construtora Industrial Ltda, do também processado, o empresário Antônio Fernando de Araújo Garcia, presta serviços de coleta de resíduos sólidos e operação de aterro público em Três Lagoas. Que, inicialmente por sagrar-se vencedora em procedimento licitatório e, sequencialmente, mediante seleção, por meio de dispensa de licitação, firmou sucessivos contratos e aditivos de prorrogação de prazo, em total “desrespeito à vedação contida no art. 24, IV, da Lei de Licitações cujo prazo máximo para contratações emergenciais é de 180 dias”.
Citam as ações, também que o prefeito Ângelo Chaves Guerreiro, também requerido, determinou a realização de novo procedimento de dispensa de licitação — número 53/2017, valor de R$ 3.435.047,87 -, em caráter emergencial, para a realização do aludido serviço, enquanto não se decidisse pela realização ou não de parceria público privada acerca da coleta de lixo, mesmo ciente de que não cabia mais prorrogação de prazo do contrato firmado com empresa Financial Construtora Industrial Ltda.
Narra o apelo, ainda, que o argumento utilizado foi o de que a escolha foi baseada em critério técnico, estabelecido pela legislação.
Ainda conforme o relatório acerca das ações Adelvino Francisco de Freitas, então chefe do setor de licitação da prefeitura de Três Lagoas, “manejou procedimento para a contratação direta e emergencial, pelo prazo de três meses, de empresa para a execução do serviço de coleta e disposição final do lixo, sendo que na ocasião cinco empresas foram selecionadas e cotadas pelo própria prefeitura e apresentaram seus preços, de forma que o preço apresentado pela Financial Construtora Industrial Ltda (a que venceu) mostrou-se como o mais elevado com uma diferença de R$ 931.574,49 ao final de três meses”.
Sustentou também o relatório, que Adriano Kawahata Barreto, então diretor de Infraestrutura da prefeitura, o qual efetuou a análise das propostas e “acenou pela contratação da Financial, chegou a relatar que não houve análise técnica das ‘concorrentes’, não obstante, tenha assinado a Análise Técnica das Propostas. Já o requerido e então secretário municipal Daynler Martins Leonel, que coordenava o setor de licitações, definiu inclusive as empresas a serem cotadas”.
Detalhe: a testemunha Lorivaldo Fabricío, à época trabalhava e chefiava a cotação do setor de licitação, e disse que houve uma anterior análise técnica quanto às propostas relativas à coleta de lixo feita por Adriano K. Barreto, na qual foi apontada a empresa Kurica Ambiental S/A como a proposta vencedora e não destoante da média histórica, contudo, como não havia interesse na contratação da Kurica, mas sim na manutenção da Financial, todos os arquivos de computador daquele setor foram simplesmente apagados”.
Depoente informou ainda que para justificar o valor da Financial, houve aditivo do contrato anteriormente firmado elevando-o em 6,72% por meio de ato do requerido pelo então prefeito Ângelo Guerreiro, em 27 de abril de 2017.
O contrato suspeito foi firmado para o período de 2017 e 2019.
Cita ainda o relatório, que, posteriormente, “houve tentativa de realização de procedimento licitatório, sendo contratada a FAPEC, no valor de R$ 170.000,00, contudo, o edital por ela confeccionado foi objeto de anulação pelo Poder Judiciário diante das irregularidades constatadas”.
Segue o relatório: “em um período de três anos, foram realizadas sucessivas dispensas de licitações com prorrogações que perduraram no tempo, totalizando até o ingresso com a inicial o valor de R$ 9.626.169,73”.
Completa o relatório: “que, as vias de encerrar a atual gestão municipal, a administração pública não conseguiu realizar procedimento licitatório que se faz necessário há muito tempo, de modo que foram extrapolados todos os limites da utilização do dispositivo, não havendo como sustentar uma contratação em caráter emergencial decorrente do mesmo fato que perdura por anos e que continua até os dias atuais”.
Decisão
A partir do relatório, a juíza condenou os ex-prefeito Ângelo Chaves Guerreiro, Financial Construtora Industrial Ltda e o dono do empreendimento, Antônio Fernando de Araújo Garcia, solidariamente, no ressarcimento integral do erário no valor de R$ 7.366.349,40, incidindo correção monetária pelo IPCA-E e juros moratórios de 1% a.m desde a data do ajuizamento da ação de improbidade administrativa. Ou seja, a conta deve ser paga por Guerreiro e o empresário.
Além do ressarcimento de R$ 7,5 milhões, o ex-prefeito foi condenado a pagar de multa civil equivalente à metade do valor do dano, com correção monetária pelo IPCA-Ee juros moratórios de 1% a.m desde a data do ajuizamento da ação de improbidade administrativa, bem como na suspensão dos direitos políticos pelo período de 8 (oito) anos.
Ou seja, Guerreiro terá de pagar outros R$ 3,5 milhões pela fraude no contrato com a Financial.
A reportagem tentou falar com o ex-prefeito e o empresário, sentenciado pela juíza, contudo até o fechamento deste não tinha conseguido. Se houver manifestações, a reportagem será atualizada. Acerca do caso, Guerreiro divulgou uma nota.
Ex-prefeito, em nota, diz que:
“Após as notícias sobre a procedência de uma Ação Judicial que questiona contratos da Prefeitura de Três Lagoas com empresa de coleta de lixo, o Sr. Ângelo Guerreiro vem a público através da presente nota esclarecer que jamais praticou qualquer ilícito ou conduta que caracterize ato de improbidade administrativa.
O Sr. Ângelo Guerreiro possui mais de 20 anos de vida pública, trabalhando incansavelmente pelo desenvolvimento e protagonismo de Três Lagoas-MS, tendo exercido e encerrado seus mandatos com aprovação recorde da população, sempre agindo com lisura e responsabilidade no trato com a coisa pública. Lamentamos profundamente que as regras processuais que devem reger os litígios em um Estado Democrático de Direito tenham sido ignoradas a ponto de ofender diretamente o contraditório e a ampla defesa, suprimindo-se da instrução atos processuais essenciais, impedindo-se os réus de produzirem provas, formularem quesitos e impugnarem especificamente elementos produzidos pela parte adversa, o que eiva o processo de nulidades absolutas.
Na mesma esteira, eventuais metas para julgamento acelerado de processos em trâmite não podem funcionar em sacrifício do Direito de Defesa. O Sr. Ângelo Guerreiro reforça a sua confiança no sistema judiciário e pleiteará, através dos meios judiciais cabíveis, a anulação do processo e a improcedência da ação, ao tempo em que reitera seu compromisso com as boas práticas na administração pública e com a população de Três Lagoas”.
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