Diálogos captados pela investigação que revelou esquema de desvio de R$ 10 milhões na educação em Água Clara, a 207 quilômetros de Campo Grande, revelou pedido explícito de propina.
Episódio em questão foi revelado na denúncia proposta pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), braço do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), que denunciou dez pessoas, entre as quais secretárias municipais, servidores públicos e empresários, por organização criminosa, fraude em licitação e corrupção.
Chamam a atenção dois trechos da denúncia, os quais o Jornal Midiamax teve acesso. Em conversa pelo WhatsApp, um empresário e uma servidora pública da prefeitura de Água Clara evidenciaram a proximidade com a organização criminosa, segundo o Gaeco, que arrecadava dinheiro do município por meio de fraudes em processo licitatório.
Assim, aparecem no diálogo Mauro Mayer da Silva, empresário, dono da Zellitec Comércio de Produtos Alimentícios e Royal Soluções Comércio & Serviços, que venciam sempre as licitações promovidas pela Secretaria Municipal de Educação, uma servidora do município e uma atendente de uma agência bancária da Caixa Econômica Federal, em Campo Grande.
Narra a denúncia do MPMS: “Em 12 de junho de 2023, um desses episódios de pagamentos de propina chamou a atenção, ante o descaramento dos envolvidos”.
Segue contando o Gaeco: “Pois bem. O denunciado MAURO MAYER DA SILVA foi contatado por uma funcionária da Caixa Econômica Federal, identificada apenas como “Angelita”, que durante o fechamento do caixa no banco havia identificado um déficit de R$ 4.800,00 e, para localizar o erro, entrou em contato com diversos clientes que haviam realizado saques de alto valor naquele dia, entre os quais o denunciado MAURO MAYER DA SILVA, a fim de verificar se algum deles havia recebido um valor superior ao solicitado“.
Em resposta, o denunciado Mauro Mayer informou que estava em posse de R$ 13.000,00 e que a outra parte do dinheiro sacado, no valor de R$ 18.000,00, já teria ido ‘pra frente’ — isto é, já havia sido repassado para terceira pessoa que moraria ‘fora de Campo Grande’.
Apesar disso, o empresário Mauro comprometeu-se a entrar em contato com a funcionária do banco para verificar se o valor repassado a ela estava de acordo com o que deveria receber. “Eu vou conseguir te falar só amanhã, mas você pode ficar tranquila, tá, é pessoa de confiança, e se passou mesmo a mais, eu vou no banco, na quarta-feira, né, como a gente havia combinado, e a gente faz só o, como se tivesse feito o saque, tá, dos 4 e 800”, disse o empresário.
Fica claro, nesse trecho do áudio, pela fala de Mauro, que ele devolveria os R$ 4,8 mil caso a bancária tivesse passado o dinheiro a mais.
A pessoa de ‘confiança’ citada pelo empresário, revela o Gaeco, seria Ana Carla Benette, servidora da prefeitura de Água Clara, denunciada pela trama da corrupção.
Daí, Ana Carla, prepara um vídeo e manda ao empresário como meio de justificar que, ela havia recebido das mãos do empresário R$ 18 mil reais. As imagens mostram a servidora contando o dinheiro.
Para reforçar o grau de envolvimento com o esquema de pagamento de propina, o Gaeco incluiu na denúncia: “Tal era o vínculo entre o empresário e a servidora pública, que MAURO MAYER DA SILVA, ao se referir à denunciada ANA CARLA BENETTE para a funcionária da CEF na mensagem, anotou se tratar de ‘pessoa de confiança’, revelando o intenso comprometimento dela com o esquema, que estava a enriquecendo ilicitamente“.
Depois de exibir o vídeo em que a servidora conta o dinheiro, o Gaeco assim se expressa:
“A sensação de impunidade e a ausência de qualquer freio inibitório acabaram por levar a denunciada ANA CARLA BENETTE a gravar um vídeo, dirigido ao denunciado MAURO MAYER DA SILVA, que é o corruptor ativo, filmando a propina recebida, em situação, no mínimo, extravagante”.
Na denúncia não é citado se a funcionária da Caixa Econômica recupera o dinheiro perdido. Caso contrário, teria que tirar do bolso e amargaria um prejuízo de quase R$ 5 mil.
Propina para turbinar campanha eleitoral

Noutro trecho da denúncia, surge um novo e comprometedor diálogo, desta vez com Adriana Rosimeire Pastori Fini, 54, que era secretária de Educação em Água Clara. Ela também foi denunciada pelo MPMS e já exonerada do cargo.
“Tanto que, em meados de 2023, a denunciada ADRIANA ROSIMEIRE PASTORI FINI, que tinha a ideia de se lançar candidata em 2024, solicitou o repasse mensal de propina para custear sua campanha. Vou sair candidata. Ai vcs sabem que o salário cai pq tenho que me afastar. Preciso ver se consegue me passar um valor mensal, pra eu cobrir as despesas da campanha (…)”.
Pelo dito, Adriana concorreria a uma vaga na Câmara Municipal de Água Clara. Isso não é revelado na denúncia. Contudo, o nome dela não aparece na relação de candidatos que disputaram o pleito ano passado.
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Operação ‘Malebolge’
Operação deflagrada pelo Gaeco e Gecoc (Grupo Especial de Combate à Corrupção) teve como objetivo cumprir 11 mandados de prisão preventiva e 39 de busca e apreensão. Então, os mandados foram cumpridos em Campo Grande, Água Clara, Rochedo e Terenos.
Segundo nota oficial, o grupo especial do MPMS apontou que empresário comandava esquema que fraudou contratos que ultrapassam os R$ 10 milhões nos municípios de Água Clara, administrado por Gerolina Alves (PSDB) e Rochedo, cujo prefeito é Arino Jorge (PSDB).
Assim, as investigações apontaram que o esquema contava com pagamento de propinas a servidores para fraudar licitações, principalmente na área da educação.
Por fim, “Malebolge”, termo que dá nome à operação, é uma referência à Divina Comédia, obra clássica de Dante Alighieri, que descreve a jornada de um homem pelos reinos do inferno, purgatório e paraíso. Dentro do inferno, o “Malebolge” é a região onde punem os fraudadores e corruptos conforme a gravidade de seus pecados.
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