Uma disputa judicial entre a Inpasa Agroindustrial S.A. e a Prefeitura de Sidrolândia marca o início da operação da companhia na cidade.
A fábrica de processamento de grãos ingressou com uma Ação Declaratória contra o Município, localizado a 70 km de Campo Grande, buscando garantir na Justiça o direito à isenção do ISSQN (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza).
O benefício fiscal, concedido por lei municipal, tinha o objetivo de incentivar a construção do complexo industrial da empresa na cidade, um empreendimento com investimento superior a R$ 1,2 bilhão.
A ação, que inclui um pedido de tutela de urgência para suspender a cobrança do imposto, tem como cerne a alegação de que a prefeitura tem criado obstáculos e apresentado interpretações contraditórias para impedir o usufruto da isenção, gerando um débito que ultrapassa os R$ 25 milhões.
Em março deste ano, a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) autorizou a operação da segunda fase da unidade da Inpasa em Sidrolândia (MS).
A ampliação da planta garantiu à indústria a capacidade produtiva anual de 800 milhões de litros de etanol, 480 mil toneladas de DDGS (Dried Distillers Grains with Solubles, Grãos Secos de Destilaria com Solúveis), 46 mil toneladas de óleo de milho e 465 gigawatts-hora de energia elétrica renovável.
Em números gerais, a companhia afirma que foram investidos aproximadamente R$ 2,3 bilhões no município, que detém a quarta unidade da empresa no Brasil. Outras plantas estão em Dourados, Nova Mutum (MT) e Sinop (MT).
Promessa não cumprida
Para a instalação da nova planta industrial destinada à produção de biocombustíveis e óleos vegetais, a Inpasa afirmou ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que obteve do município de Sidrolândia, por meio da Lei Complementar Municipal nº 183, de 14 de novembro de 2023, a isenção de impostos municipais, incluindo o ISS incidente sobre serviços de construção civil e correlatos contratados durante a fase de construção do complexo.
Conforme o processo ao qual o Jornal Midiamax teve acesso, trata-se de uma isenção fiscal onerosa, condicionada a contrapartidas por parte da empresa. Conforme o artigo 2º da lei municipal, a Inpasa deveria:
- Implementar o parque industrial para produção de etanol de milho;
- Realizar um investimento mínimo de R$ 1,2 bilhão;
- Gerar um número mínimo de empregos diretos.
A defesa da empresa afirma ter cumprido integralmente todas as condições, com a fábrica atualmente em plena operação, empregando 499 funcionários diretos e gerando mais de 3 mil empregos indiretos.
O problema, segundo a Inpasa, surgiu da falta de regulamentação na lei sobre como a isenção deveria ser operacionalizada.
O sistema eletrônico da prefeitura para registro de notas fiscais de serviço não permitia a emissão de documentos sem o destaque do ISS. Diante disso, os prestadores de serviço contratados pela Inpasa continuaram a destacar o imposto nas notas, e a empresa, por sua vez, reteve os valores correspondentes.
Buscando esclarecimentos, a Inpasa consultou o Departamento Fiscal do município. A orientação recebida, conforme e-mails anexados ao processo, foi de que a empresa deveria:
- Registrar as notas fiscais com o destaque do ISS e posteriormente protocolar um “requerimento para homologação do benefício”, para que a administração tributária municipal desse baixa nos débitos de ISS gerados automaticamente pelo sistema.
A Inpasa alega ter seguido rigorosamente este procedimento. Contudo, foi surpreendida com decisões da prefeitura indeferindo seus pedidos de homologação.
A justificativa do município, segundo a petição inicial, foi contraditória à orientação inicial: a prefeitura passou a argumentar que os prestadores de serviço também estariam cobertos pela isenção e que, portanto, a Inpasa não deveria ter retido o imposto.
Essa mudança de posicionamento é o ponto central da acusação da Inpasa, que agora se vê penalizada por seguir instruções da administração como órgão fiscalizador.
Ação na Justiça
Assim, a Inpasa baseia sua ação em três pilares principais do Direito Tributário:
- Irrevogabilidade da Isenção Onerosa (Art. 178 do CTN e Súmula 544 do STF): a empresa argumenta que, por se tratar de uma isenção concedida por prazo certo e mediante o cumprimento de condições onerosas (investimentos e geração de empregos), ela não pode ser comprometida pelo poder público. Para a defesa, uma vez cumpridas as contrapartidas, o contribuinte adquire o direito ao benefício.
- Observância das Normas Complementares (Art. 100 do CTN): a orientação fornecida por escrito pela autoridade fiscal do município (sobre como proceder para obter a isenção) é considerada uma “norma complementar” da legislação tributária. O Código Tributário Nacional (CTN) estabelece que o contribuinte que segue tais normas fica isento de penalidades, juros e da própria cobrança do tributo principal, caso a orientação se mostre, posteriormente, incorreta sob a ótica da própria administração.
- Princípio da Proteção da Confiança Legítima e da Boa-fé: a defesa alega a fábrica agiu de boa-fé ao seguir as instruções da prefeitura. A mudança de entendimento, segundo os advogados, fere a confiança legítima que o contribuinte depositou nos atos da administração pública, gerando insegurança jurídica.
Diante da situação, a empresa cobra que a Prefeitura suspenda imediatamente a exigência dos débitos de ISS, para que a indústria possa obter certidões de regularidade fiscal e não sofra atos de cobrança, como a inscrição em dívida ativa e a execução fiscal, enquanto o mérito da ação é julgado.
A defesa pede também que o juiz declare o direito da empresa de usufruir da isenção do ISS prevista na Lei Complementar Municipal nº 183/2023 e proceda o cancelamento de todos os débitos de ISS gerados em decorrência da negativa da prefeitura em aplicar a isenção.
Caso o tribunal entenda que o imposto é devido, os advogados da Inpasa pedem que sejam excluídos quaisquer juros e multas, com base no artigo 100 do CTN, uma vez que a empresa seguiu as orientações do fisco municipal.
O que alega a Prefeitura de Sidrolândia?
A Prefeitura Municipal de Sidrolândia contesta a Ação Declaratória movida pela Inpasa Agroindustrial S.A.
A administração defende a impossibilidade jurídica de conceder a isenção ISSQN e aponta supostas irregularidades na conduta da companhia.
Conforme os argumentos da procuradoria municipal, a Lei Complementar Municipal nº 183/2023, que concedeu o benefício, não delimita o conceito de “planta industrial e suas dependências administrativas”. Essa ausência de clareza, segundo o município, impede a discriminação dos limites objetivos da isenção.
Para a defesa, a legislação tributária exige interpretação literal.
Outro ponto sustentado é que a Inpasa não apresentou provas suficientes da efetiva prestação dos serviços para os quais busca a isenção. A defesa aponta que a empresa se limitou a anexar notas fiscais, sem juntar contratos ou outros documentos que comprovem a contratação e a execução dos trabalhos.
A prefeitura acusa a Inpasa de conduta irregular ao reter valores de ISS sem ter obtido o reconhecimento administrativo prévio da isenção. Para o município, essa prática representa uma violação a um dever legal e demonstra que a própria empresa deu causa ao processo.
Caso a Justiça reconheça parcialmente o direito à isenção, o município solicita que notas fiscais listadas em anexo sejam excluídas do benefício, por não se enquadrarem nas hipóteses previstas na lei.
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(Revisão: Bianca Iglesias)