Assessor mandou despachante controlar repasses para Beto Pereira e chamava propina do Detran-MS de ‘panfleto’

Despachante que integrava quadrilha tenta acordo para delatar político do PSDB apontado por ele como chefe da corrupção no Detran-MS

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Assessor braço direito de Beto Pereira, Thiago Gonçalves tinha controle sobre repasses aos integrantes do grupo (Montagem: Divulgação / Arquivo, Jornal Midiamax)

A organização criminosa que operava esquema de fraudes no Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul) e seria supostamente chefiada por Beto Pereira (PSDB) mantinha contabilidade das propinas, ou panfletos como eles chamavam o dinheiro ‘sujo’.

Assim, David Cloky Hoffaman Chita, despachante que confessa participação no esquema e tenta delatar o candidato do PSDB à prefeitura de Campo Grande, Beto Pereira, que seria o verdadeiro chefe da organização, possui extenso rol de provas obtidas durante cerca de 1 ano e meio, tempo pelo qual o esquema operou. São trocas de mensagens, fotos e gravações que comprovam tudo o que afirma e está disposto a disponibilizá-los ao MPMS (Ministério Público de MS), se o órgão aceitar seu pedido de delação.

Conforme a denúncia de Chita, Beto Pereira colocou seu assessor direto e braço direito, Thiago Gonçalves, para fazer o controle do ‘lucro’ obtido com as fraudes, que teria como finalidade turbinar o caixa não oficial da campanha do PSDB para as eleições deste ano.

Em áudio enviado por Thiago a Chita, o assessor de Beto Pereira confirma que o ‘controle’ deve ser repassado. “Só uma dúvida meu amigo. Com relação à diferença daqueles papéis que a gente deu início ontem lá na tratativa, você faz o controle e você me passa, né? Só para eu ficar ciente”.

Depois, em troca de mensagens, David cumpre o combinado e envia o que eles chamam de ‘panfletos’. Primeiro, Thiago pede para o despachante enviar os ‘panfletos’ que foram repassados ao ‘chefe’, que é como os integrantes da quadrilha chamavam Beto Pereira.

Então, David apresenta a listagem dos pagamentos que teriam sido feitos ao ‘chefe’. No total, até aquele momento, haviam sido nove pagamentos, sendo oito no valor de R$ 30 mil e um no valor de R$ 10 mil, totalizando R$ 250 mil.

Chita revelou que fazia repasses mensais para o grupo liderado por Beto, sendo que o chefe recebia R$ 30 mil mensais. No entanto, os valores deveriam subir conforme as eleições se aproximassem. Na reta final, o combinado era que deveriam ser destinados R$ 300 mil de dinheiro ilícito para a campanha do PSDB. Hoffaman crava que destinou cerca de R$ 1,2 milhão de dinheiro das fraudes no Detran-MS diretamente para as mãos de Beto Pereira.

Leia também – Beto Pereira colocou prima como diretora para facilitar corrupção no Detran-MS, revela David

Apesar de tentar direito de resposta, negado pela Justiça, o político e servidores implicados seguem mantendo a tática do silêncio, quando acionados pela reportagem do Jornal Midiamax. Todas tentativas de contato estão devidamente documentadas e o espaço segue aberto para manifestação.

Esquema tinha que crescer e exigia controle do grupo

Chita denuncia que, por exigência de Beto Pereira, o esquema fraudulento no Detran-MS teria que crescer para arrecadar cada vez mais dinheiro ‘sujo’. Para isso, seria necessário a participação de cada vez mais integrantes.

Então, para manter o controle da organização, Beto teria escalado seu braço direito, Thiago, para monitorar o fluxo do dinheiro ilícito, bem como repasses das propinas a todos os integrantes e nomeações estratégicas, para que as fraudes ganhassem corpo.

Servidores do Detran-MS confirmaram ao Jornal Midiamax que as fraudes ganharam ‘fôlego’ após Beto Pereira assumir a chefia do esquema.

Em outro print que está à disposição para o MPMS analisar, Chita envia uma tabela que seriam de valores repassados a integrantes do grupo.

A tabela contém data, placa do veículo com registro fraudado no Detran-MS e nomes de quatro pessoas, que operavam o esquema, com valores destinados a cada um. A primeira integrante é ‘Jasmin’, que seria Yasmin Osório Cabral, colocada no Detran-MS por indicação de Thiago e do qual recebia ordens diretas para praticar as fraudes. Ela chegou a ser presa e, atualmente, cumpre regime domiciliar. Foi denunciada pelo MPMS.

Na tabela enviada a Thiago, Hoffaman também cita valores repassados a Gonçalves, que é o próprio Thiago, Netinho, que é Juvenal de Assunção Neto. Companheiro do PSDB e de Assomasul de Beto Pereira, Neto foi nomeado para diretor-adjunto do Detran na época, também por influência do deputado federal.

Por fim, aparece outro apelido, ‘Sertanejo’, que é outra pessoa que participava no esquema, mas que não foi citada, neste momento, por David, que deverá dar todos os detalhes assim que for requerido pelo MPMS.

Thiago Gonçalves, fiel escudeiro de Beto Pereira

Apontado como braço direito de Beto Pereira, Thiago Gonçalves acompanha o tucano há pelo menos 10 anos. Primeiro, foi nomeado para atuar no gabinete de Beto Pereira na Alems (Assembleia Legislativa de MS), em 2015. Filiou-se ao PSDB em fevereiro de 2019, assim que o Beto Pereira assumiu seu mandato como deputado federal.

No mesmo mês, foi nomeado par ao cargo de secretário parlamentar no gabinete do chefe, na Câmara Federal, com remuneração de R$ 7,7 mil na época, valor que chegou a R$ 14,3 mil antes de deixar Brasília, em março de 2023, período em que as nomeações indicadas por Beto Pereira no Detran-MS se concretizaram para que o grupo pudesse iniciar as operações fraudulentas no órgão.

Atualmente, exerce cargo em comissão como diretor da escola do legislativo, na Alems.

Chita aguarda resposta e acusa MPMS de blindar políticos

O despachante, que confessou operar no esquema, alega que órgãos de investigação de Mato Grosso do Sul estariam agindo deliberadamente para blindar políticos implicados no caso. Assim, ele quer formalizar um acordo de colaboração e garante que tem provas para mostrar que Beto Pereira seria o verdadeiro chefe do esquema de corrupção no Detran-MS.

David fez oficialmente no último dia 24 um pedido de acordo de colaboração e afirma que, com a delação, poderia ajudar o MPMS a chegar aos poderosos por trás do esquema de corrupção no Detran-MS.

No requerimento formalizado ao MPMS, Hoffaman afirma que tem provas que implicam agentes políticos, autoridades e servidores públicos.

Em entrevista ao Jornal Midiamax, o despachante adiantou que tem um extenso rol de provas como trocas de mensagens, conversas gravadas, vídeos, fotos e até comprovantes de Pix que comprometem os integrantes do grupo e confirmam Beto Pereiro como o chefe do esquema.

Na semana passada, o Jornal Midiamax revelou que David propôs pedido de colaboração premiada ao MPMS. O requerimento foi encaminhado pelo PGJ (Procurador-Geral de Justiça), Romão Ávila Milhan Júnior, ao Gecoc (Grupo Especial de Combate à Corrupção).

Apesar de o Jornal Midiamax ter solicitado informações ao MPMS sobre o andamento do requerimento desde a manhã da última quinta-feira (26), o órgão se mantém calado. No entanto, neste fim de semana, estranhamente, ‘vazou’ cópia do ofício do PGJ, datado do dia 27 de setembro, para veículos ligados à campanha de Beto Pereira.

No documento, ao afirmar não ser de atribuição do PGJ, Milhan alega que não viu fato novo, mesmo com o pivô das operações dizendo que existe um conluio entre o MPMS, delegados e políticos para blindar o suposto chefe do esquema, que seria Beto Pereira. “Não há indicação de qualquer fato e de qualquer pessoa com prerrogativa de foro que traria atribuição a este PGJ para análise“, diz ao encaminhar o requerimento de colaboração premiada ao Gecoc.

Corrupção no Detran-MS: pauta antiga e operações com suspeita de blindagem

No entanto, o Jornal Midiamax há vários anos investiga inúmeras denúncias de corrupção no Detran-MS. Várias delas provocaram operações policiais e levaram até ao indiciamento de servidores, como o primo de Beto Pereira e ex-prefeito de Rio Negro, Joaci Nonato Rezende, réu por corrupção justamente junto com o despachante que agora resolveu delatar Beto Pereira e outros políticos.

Segundo David Chita, as operações seriam sempre orquestradas para ‘dar satisfação à opinião pública’ e salvar a pele dos poderosos implicados. Por isso, ele alega que resolveu falar enquanto está foragido da justiça e diz que corre risco de morte caso ‘caia’ numa prisão em Mato Grosso do Sul.

Hoffaman também revelou que outra prima de Beto Pereira, Priscila Rezende de Rezende, içada ao posto de diretora de registro de veículos no Detran-MS assim que o deputado federal do PSDB o chamou para trabalhar juntos, ajudaria a blindar o esquema dentro do órgão estadual.

Em todas as etapas da apuração jornalística, a reportagem do Jornal Midiamax sempre acionou todos os citados pelo despachante foragido, como é praxe.

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