Justiça manda Governo cortar 164 cargos usados como ‘cabide de empregos’ no Detran-MS
Procuradoria do órgão alegou que denúncias de nepotismo não passariam de ‘fofocas’
Adriel Mattos –
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A 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande declarou a nulidade de quatro decretos estaduais que criaram 164 cargos comissionados no Detran-MS (Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul). A criação do “cabide de empregos” foi feita gradualmente após a Lei 4.197/2012.
A denúncia partiu do MPMS (Ministério Público do Estado de MS), que relatou que após a lei reestruturar o órgão com 145 cargos em comissão, o Governo do Estado criou outros 164, por meio dos Decretos 13.450/2012, 13.515/2012, 13.609/2013 e 13.885/2014.
Os cargos foram preenchidos em funções técnicas como atendimento ao público, mesmo havendo um concurso com pessoas aprovadas e aptas a serem convocadas. O preenchimento seria por indicação política.
“Vagas para as quais, na grande maioria, houve a realização de concurso público, ainda vigente, cuja maioria dos aprovados não foi nomeada, os quais se submeteram a seleção impessoal e técnica, e hoje são preteridos por comissionados, que desempenham as mesmas funções, e, segundo informações dos próprios servidores do órgão, são indicações políticas, típicas de atos de corrupção como troca de favores”, escreveu o titular da 29ª Promotoria de Justiça, Adriano Lobo Vieira de Resende.
Para ele, o Detran-MS se tornou “cabide de empregos”, com a nomeação de parentes de diretores do órgão, além de pessoas de confiança de parlamentares.
“Inobstante, após novas informações, foram realizadas pesquisas cadastrais e elaborado o Relatório Técnico do Centro de Pesquisa, Análise, Difusão e Segurança da Informação, que apontou diversas nomeações para cargos em comissão enquadradas na vedação ao nepotismo, tratando-se de prática comum no órgão o favorecimento de interesses privados e a promoção de ‘cabide de empregos’ para aqueles que possuem vínculo de parentesco com as autoridades nomeantes ou servidores com funções de confiança e cargos em comissão”, pontua Resende.
Os decretos citados pelo MPMS foram revogados em junho de 2022, em ação do Governo do Estado para revisar e anular atos administrativos em desuso.
Detran-MS alega que denúncias de nepotismo são ‘fofocas’
A Procuradoria Jurídica do Detran-MS contestou a denúncia e alegou que apenas o governador do Estado pode anular decretos, logo a ação não era o caminho correto. Além disso, a discussão teria sido superada com a Lei 5.305/2018, que fez nova reestruturação de cargos estaduais.
Defende ainda que o chefe do Executivo tem a prerrogativa constitucional de editar decretos de transformação de cargos. Além disso, as denúncias de nepotismo não passariam de “fofoca”.
“O autor [MPMS] precisa parar de ser induzido a erro e acreditar nas fofocas do sindicato dos servidores do Detran-MS. No caso, as pessoas indicadas na petição inicial, que segundo o autor ocupam cargos comissionados em situação de nepotismo, já foram exoneradas e/ou voltaram a seus órgãos de origem em atendimento a recomendação do próprio autor”, destacou o procurador Aladnir Cabral da Rocha.
As denúncias partiram de candidatos aprovados no concurso de 2014. Mas segundo o Detran, esses denunciantes foram na verdade reprovados.
“Por mais que esse conceito de aprovado e reprovado seja óbvio, parece que escapa ao autor e aos candidatos denunciantes, como a senhora que incide em equívoco alvar ao acreditar e se intitular aprovada, se ficou em 11º lugar para o cargo concorrido que dispunha de 6 vagas. A verdade é que essa senhora, se não se classificou dentro do número de vagas, foi reprovada. Não compreender nem essa conceituação já explica o porquê”, pontuou Rocha.
Ele prossegue garantindo que o governo convocou todos os candidatos aprovados. “Vale consignar que muitos dos ocupantes de cargos em comissão citados pela parte autora já foram exonerados, o que acarreta no esvaziamento do objeto da demanda, que é precisamente a invalidação das nomeações dos cargos em comissão”, ponderou.
Assim, o Detran pediu a improcedência da denúncia ou a perda de objeto da ação, já que os comissionados denunciados teriam sido exonerados.
Juiz aponta que cargos comissionados deveriam ser criados por lei e anula decretos
Em sua decisão, o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa observou que a Constituição Federal e a jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal) não permitem a criação de cargos comissionados por meio de decreto. Além disso, ele assinalou que as provas trazidas aos autos demonstram que os comissionados exerciam funções de efetivos, no qual haveria concurso em aberto.
“A prova colhida deixa evidente que a transformação e transferência de cargos em comissão do Detran-MS por meio de decretos do chefe do Poder Executivo Estadual com aumento significativo da quantidade de servidores em tal situação e em desproporção ao número de servidores efetivos serviu de sucedâneo à verdadeira reestruturação do referido órgão público sem a edição da lei necessária para tal fim, bem como que parte dos ocupantes dos cargos comissionados criados não exerciam exclusivamente atividades de direção, chefia ou assessoramento, mas sim próprias da carreira e do quadro de pessoal efetivo do Detran/MS, conforme verificado da descrição das atividades desenvolvidas por cargos efetivos inseridas no Edital nº 01/2014 -SAD/Sejusp/Detran/MS, o que não se pode admitir”, pontuou.
Nantes Corrêa destacou que o Detran se limitou apenas a informar que não haveria mais nepotismo após as exonerações, mas ainda haveria outros nomeados ainda nos quadros do órgão.
Para o magistrado, a transformação ou criação de cargos “deveria ser objeto de lei em sentido estrito, a qual foi editada somente em 21.12.2018 (Lei Estadual nº 5.305/2018) e viabilizaram ou ao menos facilitaram a nomeação de pessoas em cargos de provimento em comissão em situação de nepotismo ou nepotismo cruzado, nítida a nulidade”.
Assim, ele determinou a anulação dos decretos e as respectivas portarias de pessoal que nomearam pessoas para esses cargos, devendo observar o limite de funções comissionadas previsto em lei. A sentença cabe recurso.
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