Amanheceu nesta segunda-feira (22) protegido por senha o procedimento que estreou as novas regras para investigação de pessoas blindadas por foro privilegiado no MPMS (Ministério Público Estadual de Mato Grosso do Sul). A denúncia, delegada pelo Procurador-Geral de Justiça, Paulo Cézar dos Passos, nos moldes que os políticos pediram, acabou revelando detalhes que podem atrapalhar as investigações antes mesmo de começarem, como nomes dos envolvidos e até a possibilidade de um acordo de delação.

Após o Jornal Midiamax revelar o ‘vazamento’ de detalhes do procedimento com dados da portaria que atribuiu ao promotor Lindomar Tiago Rodrigues a responsabilidade de investigar suspeita de corrupção em município no interior de MS com foro, o chefe do Ministério Público de Mato Grosso do Sul não detalhou se houve um equívoco.

O caso envolve suposto esquema de pagamento de ‘mensalinho’, direcionamento de licitação, nepotismo, agiotagem por dívida de campanha e até eventual tráfico de influência por escritório jurídico em município do interior de Mato Grosso do Sul.

Tudo dentro das novas regras do MPMS definidas após o chefe do órgão levar ‘puxão de orelha’ em público até do governador Reinaldo Azambuja (PSDB), que mandou Passos ‘controlar’ supostos excessos de membros midiáticos.

Só que, com a portaria, o gabinete do atual tornou público o número do procedimento. Com este dado, a reportagem, e quem mais quisesse, conseguiu acesso completo aos detalhes da denúncia que originou o procedimento.

Procurado pela reportagem, Passos, via assessoria, se limitou a dizer que procedimentos no âmbito do MPMS seguem normas traçadas pelo CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) e “também aquelas aprovadas pelo Colégio de Procuradores de Justiça, inclusive quanto à restrição de acessos”.

Enterrando a delação premiada

Em rápida consulta ao banco de dados do MP-MS pela internet – o que qualquer pessoa poderia fazer –, a reportagem teve acesso a todos os detalhes da denúncia, como quem são os investigados, como funcionaria o suposto esquema denunciado, que teria garantido a reeleição de um prefeito e, incrivelmente, até que já haveria vereador envolvido cogitando fazer delação premiada.

Para não atrapalhar as investigações e para preservar os direitos constitucionais dos citados, a reportagem não identificou os implicados. Três dias após a revelação das informações, no entanto, elas já não mais estão disponíveis para consulta pública. Agora, o acesso aos autos só é permitido para quem tem senha.

Os dados – agora fechados -, segundo membro do órgão ouvido pelo Jornal Midiamax por telefone, expõem absurdamente os denunciados, e ‘matam qualquer chance de sucesso na investigação antes do começo’. Com o nome do político que supostamente teria interesse em um acordo de delação, por exemplo, ele pode até se tornar alvo de crime de pistolagem, comuns em Mato Grosso do Sul.

“Quero acreditar que isso é só mais uma triste trapalhada desse gabinete que, infelizmente… assim se mostra desastroso. Se isso fosse adotado de praxe, os implicados que são inocentes serão duramente prejudicados. E, os verdadeiramente implicados, podem comemorar, já que ficarão sabendo com antecedência quando se tornarem alvo de procedimento”, pondera.

Cumpriu o protocolo

Ao receber a denúncia, a ouvidoria do órgão cumpriu exatamente o protocolo determinado pelo Colégio de Procuradores e remeteu imediatamente os autos a Paulo Passos. Ele, por sua vez, delegou a outro membro a responsabilidade pela investigação.

E foi neste ato oficial que o chefe do MPMS acabou permitindo a qualquer um ter acesso aos dados da denúncia recebida. O suposto esquema revelado com a portaria de Passos envolveria direcionamento de licitação para beneficiar uma farmácia, cujo dono, agiota, teria ‘emprestado’ de forma ilícita dinheiro para garantir a reeleição do prefeito.

Além disso, a liberação do número do procedimento na portaria expôs até um Promotor de Justiça. Além do prefeito, acusado de usar empresas para garantir governabilidade na Câmara Municipal, pagando, em tese, propina a vereadores. a denúncia aberta cita um vereador que teria procurado a promotoria local para ‘contar tudo’, mas “sem sucesso”.

O esquema implicaria, ainda, contratação ilegal de escritório de advocacia, nepotismo e promoção irregular a “chefe do chefe” de servidor concursado que seria parente de vereador.

Comemoração…

A portaria delegando a atribuição do Procurador-Geral de Justiça para um promotor acontece 10 dias após a ‘solução’ encontrada por Passos para pôr fim à crise com a classe política. Texto assinado por ele ‘disciplinou’ a atuação de promotores de Justiça em inquéritos civis, referendando a delegação de competência só após análise do PGJ.

Até membros do MPMS manifestaram insatisfação com a mudança no regramento. Para alguns, a mudança blindaria ainda mais suspeitos de em MS. Os políticos comemoraram a resolução do chefe do MPMS, e na sequência retiraram a emenda que tinham apresentado a projeto de lei do Ministério Público proibindo as delegações de atribuições do Procurador-Geral.