Lavagem de Dinheiro: Amorim mantém empresa na Holanda e ligação com Baird
Sem endereço válido, companhia usa telefone de ‘criadora de offshore’
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Sem endereço válido, companhia usa telefone de ‘criadora de offshore’
Ligações no exterior tornam dois dos maiores fornecedores de Mato Grosso do Sul suspeitos de integrarem suposto esquema para lavar dinheiro em paraísos fiscais. João Amorim, proprietário da Proteco Construções Ltda. que foi detido durante a Operação Lama Asfáltica, e João Roberto Baird, proprietário da Itel Informática, mantêm em comum no currículo sociedade com Elza Cristina Araújo dos Santos e vínculos com uma empresa na Europa.
O Jornal Midiamax apurou na Holanda que João Amorim é titular de uma empresa que o liga à suposta operação de offshore. João Baird também tem laços com a Holanda que o ligam a Amorim por meio de Elza. Com várias alterações societárias nas empresas e as companhias que teriam apenas endereços na Europa, deixam rastros que, segundo a Polícia Federal, apontam para lavagem de dinheiro.
A investigação realizada pela PF, MPF, Receita Federal e Controladoria-Geral da União, investiga suposto esquema que teria desviado R$ 11 milhões de obras com recursos federais contratadas pela Agesul (Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos) durante o governo de André Puccinelli (PMDB).
O valor é pequeno, se comparado com o montante movimentado pelos dois empresários em inúmeros contratos com o governo de Mato Grosso do Sul. Somente no segundo mandato de Puccinelli, entre 2010 e 2014, João Baird e João Amorim receberam juntos mais de R$ 452 milhões dos cofres públicos sul-mato-grossenses.
O valor é três vezes superior à Mega-Sena da Virada de 2014, maior prêmio já pago pela loteria brasileira, e ainda não inclui contratos anteriores a 2010 e posteriores a 2014, que não aparecem no Portal da Transparência do governo de MS.
A equipe de reportagem do Jornal Midiamax consultou os órgãos responsáveis pelos registros empresariais na Holanda, onde João Alberto Krampe Amorim dos Santos figura como diretor da Stichting van Shelling. Segundo os documentos da KvK, ou Câmara de Comércio, que é o órgão equivalente à junta comercial da capital holandesa, a Stichting van Shelling, com registro KvK-34258255, foi criada para financial holding, ou seja, para lucrar com investimento em outras empresas.
Apesar de ativa na Holanda, a empresa tem como endereço a casa de João Amorim em Campo Grande (MS) e ele figura como diretor. De acordo com a legislação holandesa, no entanto, sem nenhum integrante holandês, e sem a sede no país, a empresa deve ser encerrada. O telefone que consta no registro da empresa holandesa de Amorim é de uma empresa internacional especializada em operações de offshore, esquema muito usado para lavar dinheiro sem origem licita em outros países.
Sócios durante o mandato de Puccinelli
Coincidentemente, Elza também tem ligações na Holanda e chega a se apresentar perante as autoridades brasileiras como representante da empresa Arklyleius Holdings CV. A ex-funcionária de Amorim assumiu a administração da Kamerof Participações Ltda. em 7 de maio de 2009 e, por meio desta empresa, se torna sócia de João Baird na Itel Informática Ltda. em 1º de abril de 2010.
Essa sociedade, que coloca João Amorim e João Baird no mesmo conglomerado empresarial, durou até 19 de dezembro de 2014, quando acaba o governo Puccinelli e a sócia de Amorim abandona a sociedade com Baird.
As pequenas empresas são suspeitas de terem sido criadas por companhia internacional especializada em esquemas de offshore com sede na Suíça, Inglaterra e Holanda e mantêm endereços em conjuntos arquitetônicos conhecidos como brievenbus bedrijf, ou endereços para correspondência. A empresa de Amorim, por exemplo, usa como telefone de contato para as autoridades holandesas o número do escritório de uma dessas empresas na Suíça.
As atividades de offshore, apesar de legais quando realizadas dentro das regras fiscais dos países, são comumente utilizadas em esquemas de lavagem de dinheiro e usam os brievenbus bedrijf como escritórios de fachada.
Mesmo assim, Elza Cristina aparece como elo entre João Amorim e João Baird. A suspeita é de que ela seja uma espécie de ‘laranja’ de quem operaria o suposto esquema com ligação nos dois núcleos empresariais e um núcleo político.
Em relatório da Polícia Federal, há relatos de que a ex-funcionária seria sócia de empresa que poderia enviar ilegalmente recursos para o exterior, em suposto esquema de lavagem de dinheiro.
Doações oficiais para políticos
Juntas, a Itel Informática e a Proteco Construções Ltda. somam R$ 452 milhões em contratos com o governo do Estado, referentes somente à segunda gestão de André Puccinelli e aos dados cadastrados no Portal da Transparência do Estado. Contratos de antes de 2010 e após 2015 não constam no portal.
O montante é dividido entre os dois empresários quase que igualitariamente. R$ 212 milhões são da Itel Informática, e a maior parte, R$ 240 milhões, vem dos contratos conquistados por João Amorim.
Para sustentar essa capacidade de negociação com o poder público, as empresas de Amorim e Baird estão entre os maiores doadores oficiais de dinheiro para as campanhas eleitorais em MS.
Somente nas três últimas eleições, de 2010, 2012, e 2014, foram mais de R$ 16 milhões injetados. As candidaturas beneficiadas com as doações são, na maioria, ligadas ao grupo político do ex-governador André Puccinelli (PMDB).
Na Operação Lama Asfáltica, inclusive, políticos são suspeitos de se beneficiarem do suposto esquema de desvio de dinheiro público.
Mas não há exclusividade ou ‘fidelidade partidária’ nas doações. Baird, por exemplo, apostou nos três candidatos que estavam melhor posicionados nas pesquisas para a última eleição de governador. Ele repassou R$ 650 mil a Delcídio do Amaral (PT), R$ 630 mil a Nelson Trad Filho (PMDB) e R$ 200 mil a Reinaldo Azambuja (PSDB). Quem menos recebeu acabou eleito.
Elza e Amorim aparecem ainda como doadores da deputada estadual Antonieta Amorim, irmã de João Amorim. Elza doou R$ 5 mil e João, o Amorim, R$ 17 mil. A Proteco Construções Ltda. é contumaz doadora de campanha. Em 2010, ela distribuiu R$ 300 mil para Carlos Eduardo Xavier Marun (R$ 60 mil), Lidio Nogueira Lopes (R$ 50 mil), Youssif Assis Domingos (R$ 50 mil), Edson Giroto (R$ 50 mil), entre outros.
Em 2012, doou R$ 1,4 milhão ao Comitê Financeiro Único do PMDB de Campo Grande. Em 2014, foram R$ 386 mil a Direção Estadual do PMDB, R$ 386 mil ao ex-cunhado de Amorim, Nelson Trad Filho e R$ 1,4 milhão para Antonieta Amorim.
Já o proprietário da Itel, João Baird, costuma fazer doações em seu próprio nome. Em 2010, Baird repassou R$ 1,7 milhão a André Puccinelli. Em 2012, foram R$ 300 mil a Paulo Roberto Duarte, candidato a prefeito de Corumbá, e R$ 50 mil a Jesus Queiroz Baird, que não foi eleito prefeito em Costa Rica. Além disso, passou oficialmente R$ 1 milhão ao Comitê Financeiro Único do PMDB de Campo Grande e R$ 50 mil ao Comitê Financeiro Único do PSDB de Figueirão.
Já em 2014, outros R$ 2,4 milhões foram distribuídos entre candidatos a deputados federais e estaduais. Ao todo, a fortuna foi distribuída com 119 depósitos nas contas de mais de 90 políticos.
Pela Itel, em 2010 foram R$ 500 mil a Puccinelli. Em 2012 a dois candidatos não eleitos, sendo R$ 430 mil a Jesus Queiroz Baird e Ildo Furtado de Oliveira com R$ 105.010,00, além de R$ 500 mil ao Comitê Financeiro Único do PMDB em Campo Grande e R$ 22,9 mil ao Comitê Financeiro para Prefeito do PMDB de Costa Rica. Em 2014, doou R$ 600 mil a diretórios e comitês. Foi R$ 1,5 milhão em doações diretas aos candidatos, entre eles o candidato Delcídio do Amaral R$ 450 mil e Antonio João Hugo Rodrigues R$ 200 mil, que não foram eleitos.
Em Campo Grande, a equipe de reportagem tentou falar com João Baird para comentar a ligação indireta a João Amorim. Por telefone, na sede da Itel a secretária de Baird disse que desconhece a existência da Kamerof e que o patrão não estava disponível. Ficou com o telefone do jornal e prometeu pedir a ele para ligar, mas não houve retorno.
João Amorim e Elza Cristina também não foram encontrados na sede da Proteco Construções Ltda. para comentar a existência das empresas holandesas suspeitas de serem apenas endereços comerciais. Já André Puccinelli disse ter até uma nota pronta para divulgar sobre as investigações, mas que só se pronunciará quando oficialmente for citado pelas autoridades.
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