‘Terceirizar o hospital é um risco desnecessário’, diz deputada Federal sobre HR ser entregue para OS
Parlamentar comenta que é necessário se ‘espelhar’ em modelos de saúde de outros países
Anna Gomes, Dândara Genelhú –
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Deputada federal, Camila Jara (PT) criticou a possibilidade de entrega do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul a uma OS (Organização Social de Saúde). Para a parlamentar, a ‘terceirização’ é um ‘risco desnecessário’.
“Terceirizar a administração de um hospital fundamental para o Estado como o HR, ainda mais para uma empresa que já é investigada em diversos outros estados por denúncias de superfaturamento e falta de transparência e de qualidade técnica, é correr um risco desnecessário. Enquanto isso, Campo Grande não tem um Hospital Municipal, o que é muito grave, uma vez que ficamos dependentes de unidades particulares, que também já trabalham no limite da demanda”, disse Jara.
A petista ainda relata que é necessário se ‘espelhar’ em modelos de saúde de outros países.
“Precisamos buscar modelos de saúde que deram e dão certo de verdade, como Reino Unido, Japão e Espanha, e começar e fazer os ajustes para chegar lá. Não é algo rápido nem simples, mas a longo prazo é uma solução eficiente e acertada. E é isso que buscamos”, explicou.
Entrega de hospitais a OS custou R$ 176 milhões ao Governo de Mato Grosso do Sul em um ano
O Governo de Mato Grosso do Sul tem quatro contratos ativos com OSs responsáveis por gerir três hospitais regionais do interior do Estado e outro que opera a Unidade de Apoio das Ações de Regulação da SES (Secretaria Estadual de Saúde). Os quatro contratos custaram ao cofre público estadual R$ 176,2 milhões apenas em 2023. Reportagem do Jornal Midiamax desta segunda-feira (22) revelou que decisão do Estado de retomar a gestão do HRMS de Campo Grande abre caminho para entrega do hospital a uma OS.
A contratação de OS – uma espécie de terceirização – para gestão da saúde no interior começou em 2019, quando o Governo de Mato Grosso do Sul firmou contrato com o Instituto Acqua para gestão do Hospital Regional de Ponta Porã. O contrato inicial era de R$ 27 milhões com duração de 5 anos e valor mensal de R$ 4,5 milhões.
Até agosto de 2023, o contrato recebeu 22 termos aditivos. O valor mensal do contrato segue em R$ 4,5 milhões, que se soma a R$ 567 mil referentes a reajuste financeiro anual de 11,3% e R$ 663 mil de reajuste financeiro anual de 10,2%. Somados a mais dois aditivos, em dezembro de 2023, o Governo repassou R$ 7 milhões ao Instituto Acqua.
Instituto Acqua é investigado em vários estados
A atual OS (Organização Social de Saúde) contratada pelo Governo do Estado para gerir os Hospitais Regionais de Mato Grosso do Sul tem histórico de investigações em estados por onde passou. Em 2020, o Jornal Midiamax noticiou que o TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul) pediu, por meio de liminar, o afastamento da instituição do hospital regional de Ponta Porã.
Improbidade, superfaturamento, desvio, ausência de qualidade técnica e até ações trabalhistas integram a denúncia contra a entidade, contratada em março de 2019 por processo de dispensa de licitação. Encerrado o prazo de 180 dias da contratação, que custou R$ 27 milhões aos cofres públicos, o Acqua sagrou-se vencedor de licitação e aguarda assinatura de contrato administrativo.
Governo quer gestão estadual de saúde
O Governo de Mato Grosso do Sul tem feito mudanças na saúde para criar um Plano de Atenção Hospitalar Estadual com unidades próprias. Os hospitais regionais de Campo Grande, em Dourados, Três Lagoas e Ponta Porã passam a compor o plano.
Para isso, o Governo não renovou o Protocolo de Cooperação com a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde), e decidiu assumir a gestão do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul. Na quinta-feira (18), a SES (Secretaria de Estado de Saúde) publicou a resolução número 159 que cria o comitê no DOE (Diário Oficial do Estado).
Em entrevista exclusiva ao Jornal Midiamax, a secretária adjunta da Secretaria de Estado de Saúde, Christinne Maymone, detalhou os planos do Governo do Estado para os hospitais regionais de Mato Grosso do Sul.
“Estamos em um novo modelo de gestão e fizemos vários estudos de como queremos a saúde estadual. Muitos estados têm uma rede estadual também, que geralmente visa atender o maior número de pessoas e estamos migrando aqui”, afirma a secretária adjunta do Estado.
Autoridades criticam ‘terceirização’ da saúde
A transferência de gestão de hospitais públicos para as chamadas OSs é uma prática adotada por vários estados, mas criticada por especialistas em saúde pública por vários fatores. O principal deles é por desvincular o hospital do comando do SUS (Sistema Único de Saúde), se afastando das prioridades definidas em termos de gestão.
Assistente Técnica da Superintendência Estadual do Ministério da Saúde no Mato Grosso do Sul, Silvia Uehara critica o que ela chama de “fragmentação de comando”. Ela cita como exemplo a Santa Casa e o Hospital Universitário, que são entidade beneficente contratualizada e serviço público federal, respectivamente, mas estão sob gestão plena municipal do SUS.
“O Estado diz que não prejudicará em nada, mas a intenção oculta parece ser transferir toda a rede estadual para organizações sociais que não terão interesse em resolver até a alta complexidade. Casos importantes de Três Lagoas e Ponta Porã continuam sendo transferidos para Campo Grande para resolução”, detalha Silvia em entrevista ao Midiamax.
Analisando o plano de gestão do Governo para rede estadual de saúde, a representante da Superintendência Estadual do Ministério da Saúde em MS chama a atenção para a falta de neurocirurgia nas unidades macrorregionais, e a radioterapia no HRMS em Campo Grande. “Nenhum Hospital Regional do sul do Estado terá atendimento de terapia intensiva em pediatria?”, questiona.
Para Silvia Uehara, a transferência dos hospitais para as organizações sociais faz com que o controle social, que define as prioridades sanitárias, perca a voz sobre essas instituições de saúde. Ela ainda critica a saída do hospital da rede municipal sem conversas prévias.
“A iniciativa foi deles de saírem da rede sem antes colocar a situação às claras, sem consultar o controle social do Conselho Municipal e Estadual de saúde, desconsiderando o impacto à rede de saúde de todo o Estado de MS”, afirma Silvia.
Hospital Regional passa por falta de insumos e profissionais
No dia 15 de janeiro, o Hospital Regional de Mato Grosso do Sul suspendeu as cirurgias eletivas por cinco dias e limitou as visitas a pacientes, sob alegação de alto número de funcionários com atestado médico. Mas reportagem do Jornal Midiamax revelou que, na verdade, a suspensão das cirurgias ocorreu por déficit de quase 300 profissionais só do setor da Enfermagem.
Ricardo Bueno, do Sindicato dos Trabalhadores em Seguridade Social de MS, afirma que atualmente o Hospital Regional tem 300 profissionais da enfermagem contratados, sem vínculo empregatício. Esse número representa em torno de 25% do quadro da enfermagem do hospital.
Além disso, diversas reportagens do Jornal Midiamax mostram a falta de insumos básicos no hospital estadual, como copos descartáveis e até álcool 70. A secretária adjunta da SES, Christinne Maymonne, afirma que o Estado terá mais celeridade nos processos de licitação para compra de insumos, sem falar sobre um possível sucateamento do hospital.
Governo abre concurso após denúncias
Em segunda edição extra do Diário Oficial do Estado de quinta-feira (18), o Governo do Estado, por meio da SAD (Secretaria de Estado de Administração), divulgou abertura de concurso público para 279 cargos vacantes em Gestão de Serviços Hospitalares.
A publicação acontece após reportagens do Jornal Midiamax retratarem a defasagem no quadro de funcionários e a demora em oito meses para lançar edital do concurso, mesmo com certame autorizado.
O último concurso realizado para preencher vagas no Hospital Regional de Mato Grosso do Sul foi há 10 anos. Com a saída de muitos funcionários, seja por aposentadoria, licenças ou outros motivos, o quadro está cada vez mais defasado.
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