“Venci esse obstáculo, mas vivo os traumas”, diz jovem abusada quando criança durante campanha política

Desde então mulher nunca mais voltou a cidade e só agora teve coragem para denunciar

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Ilustrativa. (Nathalia Alcântara, Midiamax)

A jovem, hoje com 29 anos, que denunciou estupro ocorrido entre os anos de 2007 e 2008 em uma cidade de Mato Grosso do Sul, contra familiar de um político na época, relata o que viveu ao longo dos anos após o crime, até o momento em que tomou coragem para denunciar.

O autor é um homem, de 37 anos, familiar de um político que concorria às eleições municipais naquela época.

Medo, insegurança, culpa, suja, mudança de comportamento e até três tentativas de suicídio. 

A jovem lembrou que o pai dela na época trabalhava há anos com a família do autor, família de políticos. “Meu pai tinha muita consideração, respeito por eles. Depois saiu de lá porque foi desrespeitado. Na época eu tinha 5 anos”, lembra.

O pai entrou em novo emprego, e a menina cresceu. Aos 12 anos, ela foi chamada para participar da campanha política, fazendo bandeirada. 

“Eu tinha muita vontade de fazer um curso de beleza em Campo Grande. Era sonhadora. A cidade não tinha muitas oportunidades”, explicou.

Segundo o relato, ela receberia R$ 1,5 mil para bandeirar. Disse ainda que questionou se não daria problema por ser menor de idade, e disseram que não. 

Durante a campanha na época, os trabalhos eram feitos em aldeias, estradas e em bairros longes. Ao final do trabalho, todos eram deixados em casa.

“Naquele dia eu fui a última e estranhei porque sempre era a primeira a ser deixada em casa. Ele desviou o caminho e parou em uma estrada próximo da fazenda da família dele. Eu comecei a gritar e ele pediu pra eu me acalmar”, lembra com a voz embargada, ao relembrar o sentimento de medo daquele dia.

Ela contou que disse para ele que era criança e pediu para levá-la para casa, mas ele teria abaixado o banco da frente a arrastou para trás onde cometeu o estupro.

“Entrei em estado de choque. Não sei como cheguei em casa, só lembro que às 3h da manhã eu saí do quarto e fui tomar banho. Eu me lavei tanto, me esfreguei tanto que me feri”, disse.

No dia seguinte ela chegou a ligar para o homem para dizer que não trabalharia mais, e ainda questioná-lo sobre o crime, mas recebeu como respostas a pior frase: ‘Você é uma putinha, foi horrível ter feito isso em você. Eu não gostei’. Ele ainda teria pedido para ela fazer um favor pra ele e sair da cidade.

Depois daquele dia a vida dela mudou. “Não tinha mais sede de viver, de sair, não tinha amizades. eu me fechei mudei totalmente minha vida. Me tornei antissocial, uma pessoa difícil, passei a culpar meus pais, tentei suicídio três vezes, até ser hospitalizada, onde conheci uma pessoa que me ajudou a sair da cidade”.

Ela explicou que ficou com muito medo de engravidar e pegar doença já que teve hemorragia e não parava de sangrar, mas ia no medico e ninguém achava o ‘problema’. “Ficou anos assim. Anos isso na minha cabeça”.

Tempo depois do crime, a jovem conseguiu sair da cidade. “Durante esses anos me formei, me estabilizei, casei com um homem bom. Tenho família de estrutura estabilizada. Consegui vencer esse obstáculo, mas vivo os traumas e a dor frequentemente ainda, que refletem no meu casamento, na minha vida como mãe”, afirma.

Ela diz que ainda não tem amizades, não consegue confiar nas pessoas. Tem superproteção com os filhos, cisma de tudo. Tem pânico de ficar em ambiente fechado, de a abraçarem.

Sobre a denúncia, ela diz que conseguiu que ele confessasse e pedisse desculpas, mas que nenhuma palavra vai reparar o dano.

“Meu coração vai ficar em paz quando eu souber que ele foi punido pelo que fez comigo. e eu sei que tem outras vítimas. Não tenho raiva, nem sentimento de vingança, eu só quero justiça”, afirma.

O caso foi registrado como estupro de vulnerável e está sendo investigado.

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