Estudo aponta queda nas mortes violentas, mas execução de traficante iniciou ‘guerra’ na fronteira

Anuário de Segurança Pública aponta que execução de Jorge Rafaat, em 2016, foi ponto de virada e escalonou conflitos de facções

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Perícia
(Ilustrativa, Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

Foi divulgado nesta quinta-feira (20) o Anuário de Segurança Pública 2023, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Documento traz levantamento detalhado quanto ao cenário de segurança nos estados brasileiros e apontou uma queda de 2,4% para cada 100 mil habitantes nas mortes violentas registradas no Brasil entre os anos de 2021 e 2022. Em Mato Grosso do Sul, houve aumento de um ano para o outro na quantidade de homicídios. Enquanto em 2021 foram registrados 486 homicídios dolosos, em 2022 número aumentou para 496 no mesmo comparativo. Apesar disso, Estado fechou o ano passado com redução de -0,2% no número de mortes violentas intencionais.

São consideradas mortes violentas intencionais (MVI) as decorrentes de homicídios dolosos, latrocínios, lesão corporal seguida de morte, intervenção policial e morte de policiais. Conforme o levantamento, em números absolutos, foram 14 casos de latrocínio em 2021 e 13 em 2022. Em contrapartida, o crime de lesão corporal seguida de morte registrou redução de 11 para seis casos em um ano.

Estudo também levou em conta mortes decorrentes da intervenção policial. Enquanto em 2021 foram 53 registros, em 2022 foi 45. Numa série histórica, Mato Grosso do Sul registrou redução nas mortes violentas intencionais nos últimos cinco anos e fechou o ano de 2022 com queda de -0,2% em comparação a 2021.

No entanto, nenhuma cidade de Mato Grosso do Sul está entre as 50 cidades mais violentas do país, segundo a taxa de Mortes Violentas Intencionais, com população acima de 100 mil habitantes. O pódio é composto por Jequié – BA (88,8); Santo Antônio de Jesus – BA (88,3); e Simões Filho – BA (87,4).

No cenário brasileiro, o país registrou 47.508 mortes violentas intencionais (MVI) em 2022, categoria criada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) que agrega as vítimas de homicídio doloso (incluindo feminicídios e policiais assassinados), roubos seguidos de morte, lesão corporal seguida de morte e as mortes decorrentes de intervenções policiais. Esse número só é maior daquele observado em 2011, primeiro ano da série histórica monitorada pelo FBSP. Em termos relativos, a taxa de mortalidade ficou em 23,4 por grupo de 100 mil habitantes, recuo de 2,4% em relação ao ano de 2021.

Queda é considerada positiva

Para o Fórum, queda é considerada positiva e precisa ser realçada, no entanto, não é fator decisivo quanto ao nível de segurança no país. “Estamos longe disso. Ainda somos uma nação violenta e profundamente marcada pelas diferenças raciais, de gênero, geracionais e regionais que caracterizam quem são e onde vivem as vítimas da violência letal”, explica.

Na escala subnacional, o estado mais violento do país em 2022 foi o Amapá, com taxa de MVI de 50,6 por 100 mil habitantes, mais do que o dobro da média nacional. O segundo estado mais letal foi a Bahia, com taxa de 47,1 por 100 mil e, na terceira posição, o Amazonas, com taxa de 38,8 por 100 mil. No outro extremo, as unidades da federação com as menores taxas de violência letal foram São Paulo, com 8,4 mortes por 100 mil habitantes, Santa Catarina, com 9,1 por 100 mil e o Distrito Federal, com taxa de 11,3. Ao todo, 20 estados registraram taxas de MVI acima da média nacional.

Em média, 91,4% das mortes violentas intencionais vitimam homens, enquanto 8,6% vitimam mulheres. Este percentual varia de acordo com a ocorrência: entre os mortos em intervenções policiais, 99,2% das vítimas eram do sexo masculino.

Em relação ao perfil étnico-racial das vítimas, 76,5% dos mortos eram negros. “Negros são o principal grupo vitimado pela violência independente da ocorrência registrada, mas chegam a 83,1% das vítimas de intervenções policiais”.

Assassinato de Rafaat foi ponto de virada

Lembra desse caso? O megatraficante Jorge Rafaat foi executado em 2016 em Pedro Juan Caballero, na divisa com Ponta Porã. Para o estudo, a execução do traficante foi o ponto de virada que escalonou o conflito quando as entidades de segurança pública tentavam coibir a expansão do PCC.

“Com o assassinato de Rafaat, o PCC passou a dominar a região, muito estratégica para a produção em larga escala de maconha, mas também operando como hub para o preparo da cocaína produzida nos países andinos, que é trazida para o Brasil para consumo interno, mas também exportada para os países da Europa e da África. Hoje o PCC é a maior facção criminosa do país, conta com ao menos 35 mil integrantes, sofisticados métodos de lavagem de dinheiro e se conecta com organizações criminosas em todo o mundo, tal como a máfia italiana ‘Ndrangheta’”, explica o Fórum.

Suicídio de policiais

Diante dos casos envolvendo a segurança pública no Brasil, o anuário também traz levantamentos sobre os suicídios de policiais, sobretudo em Mato Grosso do Sul. Enquanto em 2021 três entre policiais militares e civis se suicidaram, número aumentou para quatro em 2022, uma variação total de 33,3%. Porém, assunto é alvo de críticas, uma vez que o Fórum Brasileiro de Segurança Pública afirma ter sentido falta no fornecimento desses dados. Assim, quando dados não apontam a real situação, intervenções não são realizadas.

Desaparecimento em Mato Grosso do Sul

Em 2022, o Brasil registrou 74.061 pessoas desaparecidas, média de 203 desaparecimentos diários. Assim, casos de desaparecimentos são constantemente registrados em Mato Grosso do Sul. Por isso, o número de pessoas encontradas no Estado é menor do que as desaparecidas, especialmente no ano de 2021.

Na época, 1.204 desapareceram e apenas 762foram encontradas. Cenário ficou mais positivo em 2022, quando 1.402 pessoas desapareceram, com um taxa de 50,9, e 1.189 foram localizadas.

Crimes contra população LGBTQIA+

Mato Grosso do Sul é considerado um dos Estados mais violentos contra pessoas LGBTQIA+. Assim, o anuário apontou uma variação de 47,4% nos casos de lesão corporal dolosa contra pessoas da comunidade, uma vez que foram 19 casos e 2021 e 28 em 2022.

Já o homicídio doloso registrou uma variação de -37,5% entre 2021 (8) e 2022 (5). Em ambos os anos, foram 11 casos de estupros.

Violência contra mulher aumenta em 2022

Enquanto isso, o Brasil teve 4.034 homicídios com vítimas mulheres em 2022, 69 a mais do que no ano passado. O número de feminicídio do ano passado foi de 1.437. Em números absolutos, Mato Grosso do Sul teve 75 mulheres vitimadas em homicídios em 2022, enquanto em 2021 o número era de 70, o que representa uma variação de 6,1%.

Já quanto ao feminicídio, foram 33 em 2021 e 40 em 2022, uma variação de 20%. Assim, a proporção de feminicídios em relação a homicídios com vítimas mulheres é de 53,3%. Além disso, foram 1.338 casos de perseguição em 2022 em MS em comparação a 2021 (928), que representa 96,3% de variação. Enquanto isso, casos de violência psicológica no Estado aumentaram de 143 para 399 em um ano.

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(Ilustrativa, Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

O crescimento dos casos reflete na quantidade de medidas protetivas pedidas no ano passado no Estado, que chegou a 12.684. Não é à toa que cenário em Mato Grosso do Sul acompanha o do Brasil, uma vez que houve o maior registro de estupros da história no país.

Estupros

Conforme o levantamento, foram 74.930 vítimas de estupros registrados, sendo 56.820 estupros de vulnerável, o que acumulou um crescimento de 8,2% em 2022 em relação a 2021. A maioria das vítimas são mulheres (88,7%) em comparação aos homens (11,3%). Dados ainda revelam que as mulheres vítimas são negras (56,8%), brancas (42,3%), indígenas (0,5%) e amarelas (0,4%).

Exclusivamente os casos estupro somaram 18.110 vítimas em 2022, um crescimento de 7% em relação ao ano anterior. Já os casos de estupro de vulnerável, com um total de 56.820 vítimas, teve incremento de 8,6%.

Segundo o fórum, 10,4% das vítimas de estupro eram bebês e crianças, com idade entre 0 e 4 anos; 17,7% das vítimas tinham entre 5 e 9 anos e 33,2% entre 10 e 13 anos (a faixa etária mais afetada pelo crime). Ou seja, segundo os dados, 61,4% das vítimas tinham no máximo 13 anos.

Em Mato Grosso do Sul, os números também são preocupantes. Enquanto em 2021 foram 383 estupros, quantidade subiu para 426 em 2022, o que representa uma taxa de 15,5 no ano passado e uma variação de 10,2%.

Os dados são ainda mais preocupantes quanto aos estupros de vulneráveis, que registraram um quantitativo equivalente a 1.834 casos em 2021. Porém, houve uma pequena redução de -4,7% com 1.765 casos em 2022. No Brasil, em média, 68,3% dos casos somados de estupro e estupro de vulnerável ocorreram na residência da vítima.

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(Ilustrativa, Arquivo Jornal Midiamax)

Investimentos em segurança pública

Segundo o anuário, os investimentos em segurança pública no país em 2022 totalizaram R$ 124,8 bilhões, um crescimento de 11,6% em relação ao ano anterior. Estudo aponta que aumento se deu principalmente ao maior volume de despesas dos Estados e Distrito Federal (R$ 101 bilhões), que tiveram alta de 12,9%, em relação a 2021.

Então, em 2022, em comparação com o ano anterior, tiveram alta de mortes violentas intencionais os estados: Acre (21%), Alagoas (4,2%), Mato Grosso (18,9%), Minas Gerais (2,2%), Pará (0,6%), Paraná (7,2%), Pernambuco (1,3%), Piauí (4,5%), Rio Grande do Sul (3,8%), Rondônia (14%), São Paulo (1,3%) e Tocantins (5,5%).

Registraram queda: Amapá (-25%), Amazonas (9,3%), Bahia (-5,9%), Ceará (-9%), Distrito Federal (-10,1%), Espírito Santo (-4,8%), Goiás (-5,6%), Maranhão (-6,5%), Mato Grosso do Sul (-0,2%), Paraíba (-6,9%), Rio de Janeiro (-5,8%), Rio Grande do Norte (-7,7%), Roraima (-18,4%), Santa Catarina (-9%) e Sergipe (-3,9%).

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