Quinze anos após a morte de Eliza Samúdio, nem todo mundo sabe que a modelo tinha um irmão caçula e que o garoto cresceu com o sobrinho, Bruninho, em Campo Grande (MS). Hoje, aos 26 anos, Arlie Moura se sente apagado da história da irmã e invisibilizado pela própria família, que o bloqueou nas redes sociais.
Quando Eliza morreu, ele era apenas uma criança de 11 anos de idade. Do mesmo modo como preservou o rosto do neto por anos, Sônia Fátima Moura, a mãe, também protegeu a intimidade do filho pequeno, optando por não citá-lo em entrevistas ao longo da última década, além de não mencionar que o caçula morava na mesma casa que o neto e o marido.
Contudo, Arlie questiona se a ocultação de sua figura seria apenas por proteção. Conforme o jovem, foram pouquíssimas as vezes que veículos de imprensa expuseram o fato de que Eliza tinha um irmão menor e que ele também sofreu consequências do crime, pois tornou-se adulto no centro da aflição causada pelo assassinato.
Ele diz que até a Netflix ocultou seu nome ao não procurá-lo para o documentário lançado em 2024, omitindo, assim, parte da história da própria Eliza. Mas, afinal, por que o irmão ficou tanto tempo sem falar? Para esta e tantas perguntas, o campo-grandense, que hoje vive em São Paulo, tem respostas.
“Reacender uma parte da história da minha irmã que foi apagada. Todo mundo acha que a Eliza é filha única, até uma amiga minha. Mas não, ela tem eu. Nós somos irmãos por parte de mãe e ela também tem irmãos por parte de pai. Eu decidi falar por isso”, afirma.

Ser irmão de Eliza Samúdio foi segredo por muitos anos
Ao Jornal Midiamax, Arlie relata que Eliza Samúdio tinha uma vida nômade. Eles nunca moraram juntos e se encontravam em ocasiões pontuais. “A última vez que a gente se viu, estávamos entrando em um carro em Foz do Iguaçu, saindo, acho que para um restaurante; eu e minha mãe tínhamos ido visitar ela. Lembro que ela era uma pessoa muito amorosa e simpática”, recorda.
Os irmãos não conviviam e a diferença de idade era um obstáculo para um elo mais forte. Eliza era a filha mais velha de Sônia, fruto de um relacionamento do passado no Paraná, enquanto ele, o caçula nascido em Campo Grande (MS), oriundo de um novo casamento. Por isso, Arlie não se lembra de como a irmã o tratava e nem de mais detalhes dos encontros entre os dois.
Em 2010, o assassinato da modelo impactou a todos e não deixou de respingar em seu amadurecimento, no início da pré-adolescência. “Acabei me fechando, foi uma situação muito complicada. A gente não sabia o que tinha acontecido, era tudo pela mídia. Levei muitos anos pra processar, muitas coisas não eram comentadas na minha frente, até certa idade”.
Por algum motivo que não sabe explicar, Arlie preferiu não contar que era irmão de Eliza para as pessoas com quem estudava e nem para amigos, só os mais íntimos sabiam que ele era parente da modelo vítima do goleiro Bruno e que vivia com a mãe e o filho dela em Campo Grande.
“Só falava quando eu tinha uma certa intimidade, com pouquíssimas pessoas. Mas teve uma vez, quando eu cursava Nutrição em uma universidade de Campo Grande, que um colega de curso fez um comentário infeliz sobre a Eliza, e aí eu tive que falar. Não deu pra ficar quieto”, lembra.

Arlie afirma que preconceito o fez ir embora
Dentro de casa, a relação com o sobrinho sempre foi tranquila. Arlie conta que era um adolescente parceiro da criança: ajudava nas tarefas escolares, brincava e dava suporte na criação. Os dois eram amigos. Já com os pais, o convívio ficou extremamente delicado depois que ele se assumiu homossexual, aos 16 anos. A partir de então, passou a sofrer preconceito dentro da própria casa.
“Acabei tendo minha privacidade invadida. Eu não podia sair e só consegui minha liberdade quando bati o pé na porta. Um dos motivos para a Eliza não querer morar com minha mãe foi porque ela queria ter liberdade, ela queria viver”.
Seguindo os passos da irmã, em 2019, ele decidiu ir embora de Campo Grande e mudou-se para São Paulo. No entanto, o contato à distância não impediu que algumas discussões acaloradas acontecessem.
Há uma semana, a última delas, foi a gota d’água para Arlie, que assumiu este nome e se reconheceu como uma pessoa não binária há dois meses. Ele e a mãe conversavam por WhatsApp sobre os pertences de Eliza que a polícia devolveu recentemente, quando ela o chamou pelo antigo nome.
O ato gerou um grande desentendimento e, mais uma vez, o jovem se sentiu invalidado, decidindo procurar a imprensa para dizer que existe. Ele, contudo, não nega a gradual aceitação da mãe em relação à sua sexualidade e admite que Sônia o ajuda financeiramente sempre que precisa, mas afirma que agora quer “viver longe do preconceito”.
“Ela pede pra eu não fazer posts maquiados, usar certas roupas… e aí acaba virando briga”, lamenta.
Bruninho o bloqueou no Instagram
Apesar de ter crescido com Bruninho, tio e sobrinho ficaram totalmente distantes depois que Arlie deixou Mato Grosso do Sul. “Não sei por qual motivo, eu sou bloqueado no Instagram do meu sobrinho. Agora, sou bloqueado no Instagram da minha mãe também”, revela.
Ainda sobre a relação com o filho de Eliza, Arlie diz que nunca sofreu preconceito por parte do garoto. “Sempre foi muito respeitoso e me tratou muito bem. Tive o contato dele um tempo atrás, mas ele começou a me enviar umas figurinhas políticas que eu não compactuo, aí mandei ele caçar o que fazer. Foi aí que a relação começou a descer”, expõe.
Hoje, Arlie afirma que sabe mais dos familiares pela mídia e comenta que, diante de tudo o que acompanha, acha a mãe uma boa avó. “Amo muito ela, mas prefiro a distância”, declara.

‘Expor isso é difícil, não quero fama’
Desde o final de 2019, o irmão de Eliza Samúdio vive em São Paulo, enquanto Sônia e Bruninho, atualmente, residem no Rio de Janeiro. Na capital paulista, Arlie mora em uma casa alugada, trabalha em uma empresa de telemarketing e expressa o orgulho de ser quem é: uma pessoa não binária e pansexual.
“Não quero fama, surfar em nada. Pra mim, isso é dolorido. Tirar forças pra contar e expor isso é difícil. Estou buscando o mínimo, que é o respeito, não estou buscando aceitação. Da minha família, não espero nada, nem uma aproximação. Se me procurarem, a única coisa que eu busco é o respeito. Posso ter falhado em muitas questões e não atendido a muitas expectativas, mas, se a gente tiver um contato, eu quero respeito”, declara.
Por fim, ele gostaria que o apagamento em relação a seu nome e à sua existência na história de Eliza fosse desfeito. “Quero preservar a memória da minha irmã”, finaliza, dizendo não acreditar que os restos mortais da modelo sejam encontrados algum dia.

O Jornal Midiamax conversou com a mãe de Arlie Moura e Eliza Samúdio. À reportagem, dona Sônia deu sua versão da história, mas preferiu que suas declarações não fossem publicadas.
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