Na margem do Rio Paraguai, corumbaense banha São João e pede fim dos incêndios no Pantanal

Mato Grosso do Sul começa a última semana de junho com o registro de 2.481 focos de incêndio até o dia 23

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Gilsy banha São João (Foto: Alicce Rodrigues/ Jornal Midiamax)

Às margens do rio Paraguai, em Corumbá – cidade a 450 km de Campo Grande, um grupo de amigos banhava uma imagem de São João no pôr do sol do dia 23 de junho. No horizonte, as chamas corroboram o pedido dos fies, enquanto o Pantanal é devastado pelo fogo.

“Vim pedir pro São João ajudar a acabar com o fogo no Pantanal”, disse a corumbaense Rogeria Fonseca. O pedido é carregado de esperança, de quem assiste às chamas se alastrando e a população sofrendo com a fumaça que invade a cidade.

Em Corumbá e Ladário, comemorar o São João é uma tradição, considerada Patrimônio Cultural e Imaterial de Mato Grosso do Sul e do Brasil. A festa junina tem cortejo de andores e batismo do santo nas águas do rio Paraguai, como manda a tradição regional.

Chamas consomem o Pantanal (Foto: Alicce Rodrigues/ Jornal Midiamax)

Rogeria é devota do santo. No ano passado, ela e o marido Rossini Benicio desceram a ladeira Cunha e Cruz para comemorar 30 anos de casados. Mais de 100 pessoas participaram da comemoração, que neste ano teve outro pedido. O casal e amigos banharam o santo para pedir dias sem fogo.

O banho de São João é uma tradição que conta com influências da cultura portuguesa e incorporação de danças indígenas e africanas. É um costume que remete ao batismo de Jesus, feito por João Batista no Rio Jordão, e revela a mistura entre o catolicismo e outras religiões de matriz africana.

População unida na comemoração

O cenário é atípico. Os dias de clima ameno deram lugar ao calor e a úmida, antes presente, agora é escassa e os moradores respiram fumaça. Enquanto a natureza pede socorro e os moradores tentam lidar com as mudanças, chega o São João para lembrar que sempre é época de comemorar a vida.

A servidora pública Kely Baná, 39, afirma que não tem como parar tudo que já estava programado. “Esse tipo de festa no interior é um marco, além de trazer renda extra para a população, lazer para famílias, crianças e idosos se unem, um momento para espairecer a cabeça”.

O funcionário público de Ladário, Luiz Henrique Coelha, 58, participa todos os anos e se diz ‘ladarense raiz’. “Se a gente for ligar para as dificuldades não vive, além disso, quem ia adivinhar que as queimadas viriam bem na época do São João”.

São João em Ladário (Foto: Henrique Arakaki/Jornal Midiamax)

Já o professor André Motta, 39, destaca que é preciso continuar com alegria e a festa vem para ajudar. “Esse não é o período das queimadas, nesse mês estávamos acostumados e envolvidos com as funções da festa. É claro que nesse cenário tudo fica mais estressante e difícil, mas a festa é justamente um canal para que a população consiga descansar da preocupação diária”.

Vinicius Soares, 25, vendedor, afirma que a fumaça que paira no ar é oportunidade para conscientizar sobre as queimadas. “A cidade toda está reunida, então é uma oportunidade de levar informações, falar sobre as queimadas, cuidados necessários, é uma forma de chamar a atenção para o problema”.

Repercussão nas redes sociais

Vídeo do incêndio que atinge o Pantanal, publicado em uma rede social mostrando o contraste da realidade da cidade de Corumbá, distante 425 km de Campo Grande, está chamando a atenção. O vídeo já acumula mais de 370 mil visualizações.

Enquanto as chamas consomem a vegetação em uma margem do Rio Paraguai, do outro lado, a população da cidade aproveita o tradicional Arraial do Banho de São João. A celebração está sendo alvo de críticas na internet porque o fogo consumindo a mata mostra o contraste entre a tragédia ambiental e a diversão.

Fogo e festa de São João (Montagem: vídeo das redes sociais e foto de Clóvis Neto, Prefeitura de Corumbá).

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