Uniformizados, sentados diante do pastor para alguns minutos de conversa, ânimo e “partiu”. Antes “soldados” da droga, hoje trabalhadores, reintegrados à sociedade que um dia os condenou como contraventores.

A função dos orientadores religiosos é devolver a dignidade a estas pessoas. Já o trabalho dos assistidos é vender sacos de lixo, diariamente, nos semáforos e nas casas, superando a substância tóxica que era vício. No meio do caminho alguns desistem, mas, quem fica pode retomar sonhos e relacionamentos.

Neste dia do trabalho (1º), o MidiaMAIS saiu em busca de conhecer mais detalhes do projeto Clínica da Alma, que existe há duas décadas. O pastor Milton Marques é quem coordena, sendo também o fundador. Autoridade diante dos assistidos, fala com firmeza, expõe pensamentos e diz duras palavras, exige frases “altas e em coro” por diversos momentos, mas, também é aquele que chora quando sabe que a filha de algum assistido mandou cartinha, agradecendo ao trabalho dele e “devolvendo” a mãe ou o pai para esta criança.

Após 26 anos longe do vício, época em que foi morador de rua, o pastor consegue falar de “igual para igual” com os antigos usuários. Aliás, a maioria dos pastores, orientadores e executores do projeto são pessoas que tiveram a mesma experiência e conseguem acolher como ninguém qualquer pessoa que escolha e decida passar por uma transformação.

“Todos aqui poderiam estar perdidos nas drogas, poderiam ser mais um contraventor na sociedade, cometendo erros, porém, estamos aqui para oportunizar a entrada na Clínica da Alma. Não é apenas restaurar e parar de usar drogas, é levantar cedo e, às 7h30, estar saindo daqui para trabalhar. É se tornar um líder e hoje todos aqui exercem essa liderança. São novas pessoas na sociedade e não mais cabos ou cabresteados pela droga. Elas têm a responsabilidade de ir e voltar”, afirmou o pastor.

Da cueca virada ao saco de lixo

(Foto: Nathália Alcântara / Jornal Midiamax)

No mês de abril, ainda de acordo com Milton, ao menos 40 pessoas novas chegaram ao projeto. “Hoje temos tudo muito organizado, com as vendas dos sacos de lixo. Mas, não começou assim não. Tivemos inúmeras fases. Uma vez, lembro que recebemos a doação de 5 mil kg de farinha. Na hora, eu pensei: ‘O que vamos fazer com isso?’ Foi aí que alguém falou em fazer cueca virada. Passa canela, passa açúcar e deu certo. Volta, faz de novo, passa na canela, passa no açúcar e vendeu tudo”, relembrou.

Do doce, o projeto passou a vender balas, fruto de outra doação. “Depois oferecíamos a pipoquinha e não tinha um valor fixo. Tinha gente que pegava uns três pacotes e dava R$ 0,10. Hoje estamos com os sacos de lixo, tem a nossa logo, tem tudo explicado lá e ainda tem os vendedores. Pessoas que vão para as ruas e muitas vezes ajudam outras, falam palavras de incentivo e até orientam os motoristas. Este último vai fazer três anos, dando o direito de escolha para cada um dos trabalhadores”, comentou.

De ex-usuário a estudante de direito, de ex-mendigo a pastor

(Foto: Nathália Alcântara / Jornal Midiamax)

Cinquenta e dois processos, atuando na maior “boca” nas proximidades da antiga rodoviária, pedinte, mendigo, ladrão e “destruído”. É desta forma que Felipe Soares da Rocha, de 38 anos, resumiu a vida quando envolvido no vício. Restaurado há mais de 10 anos, hoje é voluntário no projeto, pastor, empresário, acadêmico de direito e pai de duas meninas.

“Eu estava em tudo que é reportagem, mas, tive o encontro com o social real, a restauração de vida mesmo, na Clínica da Alma. Fui de ex-mendigo a pastor, de ex-usuário de droga a acadêmico de direito. A minha esposa era usuária também e eu a conheci na Clínica da Alma. Quando conheci aqui, não quis mais sair. Eu virei fruto do projeto e agora sou colaborador voluntário, 2º pastor e coordenador geral”, ressaltou.

O pintor e estudante do curso técnico em enfermagem, Jonas Gonçalves de Oliveira, de 46 anos, é alguém que busca restaurar sonhos. Veja depoimento dele em vídeo. Da mesma forma, o polidor automotivo Silvio Alexandre Ajala, de 37 anos, é também exemplo de restauração. Assim como Jonas, ele ficou 11 anos na cadeia e é “testemunho vivo” dos benefícios do projeto. Hoje, trabalham em prol do bem, da acolhida, da restauração e da superação diária do vício das drogas.

“Eu cheguei aqui com uma sacola cheia de remédios. Participei do projeto e depois me tornei voluntário na chácara masculina. Depois, fui para chácara feminina e continuei aqui, seguindo as normas, desempenhando e exercendo com toda responsabilidade, até que me tornei líder de setores. Trabalhei nas ruas com os sacos de lixo também”, finalizou.

Clique para assistir:

Serviço:

Quem se interessar e quiser saber mais detalhes, saiba que o trabalho é do Projeto Fraternidade na Rua, da Organização Humanitária Fraternidade Sem Fronteiras, em parceria com a Clínica da Alma de Campo Grande – MS.