Atair pensou que morrer seria saída após acidente grave de moto, mas ‘encontro com Deus’ o salvou

Flamenguista “roxo”, Atair Ramos, que está prestes a completar 50 anos, escreve autobiografia e sonha em assistir a uma partida de futebol no Maracanã

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Atair no jardim do Lar dos Idosos, em Campo Grande, onde mora há 8 anos. Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax

São poucas as vezes em que um repórter senta de frente para um computador e não sabe o que escrever. Aliás, não é que não sabe, é que fica reflexivo e imagina “vários ganchos” ao ouvir uma história tão forte. Superação? Resiliência? Fé? Perseverança? Atair Ramos, que está prestes a completar 50 anos, demonstra ser tudo isto junto! E ainda existe uma missão: divulgar para o mundo que esse flamenguista “roxo” sonha em ver um partida no Maracanã, mesmo com todas as limitações que o deixaram tetraplégico.

O episódio que mudaria a sua vida ocorreu no ano de 2004, às 22h30 de uma semana comum. Mecânico industrial, Atair saía do trabalho e estava a caminho de casa, na avenida Gunter Hans, sentido Centro, em Campo Grande, quando o pior aconteceu: ele se envolveu em um acidente de trânsito, no qual pilotava uma moto, foi atingido por um carro e o corpo “voou longe” por conta do impacto da batida.

Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax

Na ocasião, Atair fala que o motorista que estava atrás e presenciou a batida era um policial. “Ele seguiu porque a pessoa largou o carro e tentou fugir a pé. O homem ficou lá esperando a polícia chegar e foi preso. Só que na época não tinha a Lei Seca, então ele pagou fiança e saiu na mesma noite”, argumentou.

Enquanto isso, Atair ficou em coma por um tempo e permaneceu na Santa Casa por um ano e dois meses, entre idas e vindas. Em seguida, foi para o Hospital São Julião para tratamento e peregrinou em vários locais, como a casa de um tio, depois uma irmã, onde o pai deles ajudava financeiramente, e, por último, viveu por dois anos na casa da ex-esposa, onde conviveu com ela, o atual marido e o filho.

Atair foi diagnosticado com depressão e ansiedade após acidente

Aliado a todas estas mudanças, Atair também foi diagnosticado com depressão e ansiedade. Isso cinco meses depois e, como ele próprio diz, “não é fácil para nenhum mortal”. Foi quando teve pensamentos suicidas por diversas vezes e viu que seria complicado até para se matar.

Enfermeiro diz que Atair é amigo pessoal dele, mas o “defeito é ser flamenguista”, brinca. Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax

“Eu pensei que, com as mãos atrofiadas, seria difícil até para me matar. Fiquei um tempo pensando o que poderia fazer e pedir ajuda para meus filhos não seria opção. Mas, fiquei tomado por isso um tempo e fiz exercícios com as mãos, com a intenção de levar uma delas até a minha boca e morder o pulso”, relembrou.

Intercalando minhas palavras com a autobiografia que Atair começou a escrever, no dia 25 de julho de 2019, é este um trecho do depoimento dele: “Às vezes, eu ficava com os pensamentos e as emoções anestesiadas, à beira de um precipício, ficava muito indeciso… conseguia disfarçar a tristeza com sorrisos disfarçados de alegrias para todos aqueles que estavam ao meu lado, e me querendo bem”, descreveu.

“Tive um encontro com Deus quando estava pensando no pior”, diz Atair

Atair usa caneta touch para escrever no celular. Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax

Atormentado em uma destas ocasiões, Atair diz que adormeceu tentando morder o pulso. “Antes do acidente eu nunca fui um homem de reclamar, de xingar, mas, depois de tudo fiquei noites inteiras chorando. E nesta tentativa do pior acontecer eu adormeci e tive um encontro com Deus. Tenho certeza disto e sei descrever este sonho, este momento, com riqueza de detalhes”, comentou.

Após este episódio, Atair fez uma promessa que somente queria ir embora quando os três filhos estivessem bem e formados. “As duas meninas já estão formadas e o meu menino começou um curso, parou, começou outro e agora pretende retomar. Eu até brinco que ele pode esperar mais um pouco, porque lembro da minha promessa para Deus. E agora tenho netas também, de 8, 7, 6 e 1 ano. Estou sempre vendo a rede social, acompanhando tudo”, disse.

Atair está sempre sorridente e convive muito bem com colegas e funcionários do Lar dos Idosos. Foto: Marcos Ermínio/Jornal Midiamax

No Lar de Idosos Sirpha, no bairro Nova Lima, região norte da cidade, onde está atualmente, Atair distribui atualmente muitos sorrisos, vontade de viver e perseverança, entre outros bons sentimentos. Uma das pessoas que convive com ele é o enfermeiro Anderson Gonçalves, de 27 anos, que brinca que o único defeito é o amigo ser flamenguista.

“A gente brinca aqui que o Atair é o nosso influencer. Ele gosta muito das redes sociais, sabe tudo o que está acontecendo. Eu não o vejo como paciente há muito tempo, mas, sim como um amigo. O Ata, como a gente o chama aqui, tem o meu Whatsapp pessoal e a gente sempre está brincando e conversando de tudo”, afirmou.

Diariamente, Atair fala que levanta às 7h e convive diariamente com 180 pessoas, entre pacientes e funcionários do Sirpha. “A vida tem altos e baixos e a gente precisa ter persistência. Gosto da minha rotina, levando às 7h, converso com o pessoal, vejo o meu celular e minha qualidade de vida melhorou muito depois que ganhei a cadeira motorizada da Liga do Bem. Mas ainda tenho um sonho: assistir uma partida do Flamengo lá no Maracanã, no Rio de Janeiro”, finalizou.

Para quem tiver interesse, segue um trecho do livro que Atair está escrevendo, no qual ele relata o “encontro com Deus”.

Eu estava com pensamentos negativos e parecia que eu estava sendo atormentado espiritualmente, quando de repente adormeci, vi um homem alto de barba cerrada ao lado da minha cama falando comigo ele dizia:

– Segura a minha mão e venha comigo.

Me senti com uma paz espiritual. Parecia que eu tinha me encontrado sem saber o dia, a hora, e o que foi que aconteceu, mas acho que foi o Espírito Santo de Deus que me tocou.

E me levou para uma viagem em outro mundo, nessa viagem saímos como humanos, e no decorrer da viagem, viramos pontos de luz. Essa viagem não era de ônibus, de bicicleta ou de carro, nós estávamos flutuando, e de repente voamos com muita velocidade sobre um imenso rio, com muitas cachoeiras e com muitas montanhas, e pontes de cordas com madeira que ligava uma montanha a outra.

De repente paramos em cima da ponte, e ele me disse: ‘Agora você segue nessa ponte sozinho, comecei a caminhar pela ponte com um pouco de receio, pois era muito alta, e comecei a caminhar, logo avistei um senhor que com uma tesoura de jardim, aparava uma ramada com espinhos e folhas entrelaçadas na corda à beira da ponte, e de repente, ele pisou em uma ramada com espinho que ele já havia cortado, e no meu impulso abaixei e tirei o espinho e joguei ponte abaixo.

Aí ele pegou e pediu a minha mão e começamos a flutuar até pararmos em outro lugar no qual eu me via com uma espada um escudo e um chicote enrolado e preso em minha cintura. E uma carroça atrelada a quatro cavalos e uma gaiola de madeira rústica com algumas pessoas dentro, entre homens e mulheres. A carroça se encontrava debaixo de uma árvore e nela haviam várias pessoas penduradas, algumas pelos pés e outras enforcadas.

Algumas dessas pessoas sem os braços, outras sem as pernas e muito sangue no chão. Eu estava sujo de sangue porque eu quem arrancava os braços e as pernas das pessoas ainda com vida inclusive algumas gritavam e outras gemiam de dor. Eu não aguentava mais ver aquilo e chorando muito me vendo fazendo tudo aquilo com aquelas pessoas então pedi ao senhor que está comigo que parasse de me mostrar tudo aquilo:

– Me leva embora por favor! Quero voltar a minha vida mesmo que tetraplégico em uma cama! Não reclamarei mais da minha vida e não tentarei mais o suicídio! Vou continuar até que Deus faça a vontade dele em minha vida!

Quando eu lembro de tudo isso que eu passei em outra vida peço desculpa a todas as pessoas e também a Deus por tanta maldade com nossos irmãos. Nesta minha vida, depois que sofri o acidente e fiquei tetraplégico, já morei em vários lugares. Já passei por muitas coisas boas e ruins cheguei a pesar apenas 37 kg. Fiz umas sete cirurgias e o médico me desenganou. Mandou chamar os familiares para se despedirem de mim, mas não reclamei da vida e tampouco das pessoas, para não criar conflito entre elas por minha causa.

… Minha experiência com a minha vida, ou seja, com “Deus”, foi muito grande, porque de repente, depois de um acidente de moto, que me deixou tetraplégico, eu me deparei em um hospital implorando a Deus que ele poupasse a minha vida…

Sobre os sonhos, um dia sonhei com o acidente que eu sofri, mas na época eu achava que não era comigo…Parecia que eu não queria acreditar que era eu no meu próprio sonho, “fui avisado”….

Atair Ramos

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