Moradores em situação de vulnerabilidade enxergaram o território dos imóveis como oportunidade de habitação e, há mais de quatro anos, ocupam o local vivendo de forma irregular e passando por muitas necessidades. Hoje, a conta com mais de cinco mil famílias divididas em 6 polos de lideranças para melhor organização.

Alexsandra de Lima Coelho, de 37 anos, vive há 3 na comunidade. Ela é líder do polo 1, que abrange 269 famílias das cinco mil. Na função de representante, a mulher já está há dois anos.

Ao Jornal Midiamax, a moradora relata que a necessidade a levou até ali. “Vim pra cá porque sou mãe solteira com muitos problemas de saúde. Depois de ficar 6 meses com aluguel atrasado, água e luz cortados, não vi outra oportunidade a não ser morar na ocupação. Mesmo assim, as dificuldades não cessaram, mas agradeço muito a Deus por ter um cantinho onde sonho ser a dona da minha casa”, diz ela.

Casa de Alexsandra na comunidade (Foto: Arquivo Pessoal)
Casa de Alexsandra na comunidade (Foto: Arquivo Pessoal)

Desempregada, a mulher vive esperando o benefício do Loas, pois é portadora de lombalgia crônica — dor na coluna lombar de característica prolongada. A lombalgia crônica é uma doença multifatorial, ou seja, não existe uma única causa, nem solução. Debilitada, Alexsandra compartilha a situação em que é obrigada a viver. “Fico só em casa mesmo, não aguento nem varrer o chão”, lamenta.

Por ser líder de um grande número de habitantes da favela, ela começou a desenvolver um trabalho para arrecadação voluntária aos moradores do polo que representa. Seu trabalho se destaca e é sinônimo de gratidão para quem recebe a ajuda. Alexsandra conta que a iniciativa começou com a identificação da grande demanda de necessidade dos residentes.

“Como eu também preciso de muita ajuda e faço parte da liderança daqui da ocupação, tive a ideia de fazer campanha para ajudar quem precisa e, com isso, também sou beneficiada. Uma andorinha sozinha não faz verão, né? Através de colaboradores e ONGs que viram nossa luta e nosso dia a dia, estamos conseguindo apoio com trabalho formiguinha, porque o que recebemos não atende nem metade da população carente que mora aqui”, pontua.

Alexsandra, ao centro, em uma das ações de arrecadação para as 269 famílias (Foto: Arquivo Pessoal)
Alexsandra, ao centro, em uma das ações de arrecadação para as 269 famílias (Foto: Arquivo Pessoal)

Aos poucos, eles têm se ajudado trabalhando em conjunto e união, conforme afirma Alexsandra ao MidiaMAIS. “Somos carentes de tudo: água, luz, esgoto… tudo aqui é irregular. E, com meu trabalho, faço o possível e impossível para ajudar. Muitos me julgam por politicagem, mas não tenho vínculo algum. Meu lado é a necessidade de todos”, diz ela.

“Não é fácil, mas também não é impossível. Com a campanha do armazém solidário, todos participam aqui mesmo, dentro da comunidade. Assim, estamos trabalhando para fazer o melhor. Toda e qualquer doação é bem-vinda. As crianças precisam de entretenimento, pois não temos nenhuma área de esportes, ou até mesmo um projeto para tirá-las das ruas”, sonha.

“Todos lutam como podem”

Diante do caos provocado pela pobreza e situação de miséria, Alexsandra diz que se viu na obrigação de fazer algo por ela e pelos outros. O espírito voluntário na busca pela sobrevivência contribuiu para algumas, mesmo que pequenas, melhorias na vida de muitos.

“Famílias sempre me procuram atrás de ajuda, principalmente de cesta básica. Mães solteiras são as que mais sofrem, é de cortar o coração quando uma mãezinha me procura e não posso ajudar. Pessoas debilitadas com comorbidades também fazem com que essa luta não pare. Muitas vezes pensei em parar e desistir, pois não consigo agradar a todos, e com isso vêm as pedradas e a falta de reconhecimento, mas as famílias não permitem e é aí que ganho força pra continuar, sem dar importância para as críticas, que são muitas. Deus é o meu refúgio”, avalia.

Cenário é de carência e necessidade (Foto: Arquivo Pessoal)
Cenário é de sobrevivência (Foto: Arquivo Pessoal)

Segundo a moradora, as brigas são constantes por conta da alta demanda e pelo fato da comunidade ser muito populosa, o que não permite com que ela consiga saber da real necessidade de todos e investigar quem realmente precisa. “Faço minha parte junto com colaboradores, agora, se o morador usa de má-fé, vai da consciência dele”, pensa. “A ocupação é muito carente e necessita de muita ajuda. O pouco para uns é o muito pra quem não tem nada”, pontua.

“Passo por situações onde choro vendo a felicidade da família feliz levando suas doações para casa, me emociono e peço graça para continuar ajudando. Eu não faço nada, sou apenas uma ponte para que o caminho seja mais curto. Não tenho palavras para descrever nossa realidade, mas uma palavra que poderia resumir seria ‘LUTA’, pois todos os dias são de luta e vitória”, reflete.

Viver na ocupação não é fácil e o local é habitado por pessoas cheias de sonhos (Foto: Arquivo Pessoal)
Viver na ocupação não é fácil e o local é habitado por pessoas cheias de sonhos (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Sonho

Mãe solo, Alexsandra vive com dois filhos na Comunidade da Homex: um menino de 16 anos e uma menina de 13. “Eu morava de aluguel, já passei por altos e baixos porque crio meus filhos sozinha. Minha vida nunca foi fácil, mas, por maiores que sejam as dificuldades, sou feliz aqui. Aprendi que nada é impossível aqui onde moro. Tenho uma grande família, somos muito unidos e é de arrepiar a união de todos na hora da dificuldade”, se orgulha ela.

“O meu maior sonho é ter minha vida organizada para segurança dos meus filhos, minha casa própria, água e luz de qualidade. Não quero muito, apenas o básico pra ter uma vida digna. Somos tratados com indiferença, porque o invasor é visto com maus olhos por quem não precisa da ocupação para sobreviver”, finaliza a representante.

Atualmente, mais de 5 mil famílias vivem na área abandonada pela construtora (Foto: Arquivo Pessoal)
Atualmente, mais de 5 mil famílias vivem na área abandonada pela construtora (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Residencial Homex

Em 2013, a empresa mexicana abandonou a obra de construção das moradias que começou a ser erguida em 2011. Na época, a Homex informou que estava passando por dificuldades financeiras. O empreendimento contava com dez blocos residenciais, no entanto, apenas seis foram entregues. Com a falência da construtora, o restante da documentação não foi concluída, deixando muitas famílias no prejuízo. 

Antes composto basicamente pelo mato e por ruínas das inacabadas obras da Homex, o cenário foi tomado por pedaços de madeiras, telhas e lonas usadas no alicerce dos barracos que, ao longo dos últimos quatro anos, se modernizam e crescem com construções avançadas no local.

O perfil da maioria que mora ali é quase o mesmo: pessoas que viviam de aluguel e enfrentavam sérias dificuldades para conseguir se manter convivendo com duras condições de miséria. “Para alguns, isso aqui é a última saída, já que não conseguimos ser sorteados com casas da Prefeitura. Não tem como ficar pagando aluguel porque precisamos comer, beber e vestir”, disse ao Jornal Midiamax uma empregada doméstica da ocupação, em 2017.