O sol é democrático. Não faz distinção, “nasce para todos”, e é impossível escapar dos seus raios. O astro-rei é fonte de vida, luz e agora se transforma em energia limpa, renovável e inesgotável. 

A energia solar ganhou força em Mato Grosso do Sul nos últimos anos e cresceu 88%, conforme dados da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), compilados pela Semadesc (Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação). Já Campo Grande é a terceira maior cidade do país na produção do recurso. 

Os “raios” dessa tecnologia se estendem pelo Estado e chegam ao campo. Milton de Castro Ferreira, proprietário da Chácara Dois Irmãos, próximo ao distrito de Quebra Coco, em Sidrolândia, a 70 km da Capital, conta que as placas solares chegaram há um ano e meio na propriedade que abriga uma granja de aves. 

Além de gerar energia limpa, o investimento revolucionou as finanças do local. A conta de energia elétrica saiu da média de R$ 4 mil para R$ 100, o que representa uma economia de 97.5%.

“Investi por causa da sustentabilidade e da economia, que foi bem grande. Não tinha outro projeto que daria retorno. Se fizesse uma poupança, por exemplo, não ia voltar nada. Para mim foi o melhor investimento, além da sustentabilidade e energia limpa”, garante. 

Energia solar em granja de MS. (Arquivo Pessoal)

Milton investiu na granja de frango para corte em 2009 e hoje cria uma média de 52 mil animais em dois galpões. O viveiro é um ambiente controlado e manter o conforto térmico e o devido funcionamento, a base de energia elétrica, é fundamental para que a produção não seja prejudicada. 

Apesar do investimento ser alto na época, não se arrepende em nenhum momento. Os painéis solares foram instalados em novembro de 2022 e, fazendo as contas, Milton acredita que o valor irá “se pagar” em menos de dois anos. O baixo custo para manutenção até o momento, com apenas duas lavagens nos painéis para retirada de poeira e otimização da captação dos raios solares, é outro ponto exaltado.

Além de manter a granja, a energia solar abastece também a casa de um casal de funcionários que, assim, não tem nenhum gasto na conta de energia.

“É um baita investimento, mas tem retorno para os animais porque precisa ser super controlado, tudo depende da energia. Se tiver queda de energia, tem gerador para substituir, mas não compensa porque em uma noite vão 100 litros de óleo diesel, é muito dinheiro […] Aqui [na chácara] achei oportunidades e foi maravilhoso, primeiro foi a avicultura e depois a energia solar que me deram muito retorno”, elogia. 

Soluções para a agricultura e pecuária

Energia solar é fonte verde de energia. (Arquivo Pessoal)

Mato Grosso do Sul enfrenta graves prejuízos no agronegócio devido às secas severas dos últimos meses. Uma das chaves para solucionar esse problema seria a irrigação, que depende especialmente de energia elétrica para o funcionamento e eleva os custos de manutenção. 

Assim, o investimento em energia fotovoltaica nessa área pode ser uma das chaves para resolver esses obstáculos no campo, barateando o processo. 

Conforme o presidente do SRCG (Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho), Alessandro Oliva Coelho, há programas de créditos como o FCO (Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste) que oferecem condições especiais e prazos maiores para quem decide adotar essas tecnologias. 

“A seca vem muito forte com com grandes perdas na produtividade, tendo em vista a falta da chuva e nós somos o estado hoje com a segunda maior disponibilidade hídrica do Brasil aonde um pouco mais 1% da área vem com irrigação. Então temos um potencial gigantesco para irrigar o nosso Estado e a fonte de energia solar é fonte extremamente viável”, pontua.

Na visão do presidente do sindicato, a energia solar também tem potencial para equacionar problemas simples de falta de energia em lugares mais remotos, como o Pantanal. O programa Ilumina Pantanal, do Governo do Estado, por exemplo, levou eletricidade por meio da energia fotovoltaica e viabilizou que os pantaneiros tivessem uma geladeira ou televisão ligados permanentemente. 

“A energia solar é uma fonte extremamente viável para soluções, não somente no caso de irrigação. Estamos falando também dessa questão da seca. O Pantanal, que é uma região que fica extremamente alagada na época da chuva, chega na época de secas e, em anos secos como este, sofre com a falta d’água. Essas energias solares com o sistema off-grid, que a gente chama de baterias, com sistema de bombas hoje tocadas diretamente com as placas solares, seria uma grande alternativa para que o produtor rural viesse a solucionar problemas de dessedentação animal nas áreas que sofrem com estiagem, como é o caso do Pantanal”, ressalta Coelho. 

Presidente do SRCG, Alessandro Coelho (Marcos Ermínio/Jornal Midiamax)

O próprio sindicato rural já adotou há alguns anos o sistema de eletrificação solar. Neste caso, o modelo é o on-grid, ligado a rede da concessionária de energia elétrica. Todas as atividades internadas são desenvolvidas com a energia fotovoltaica, como os cursos técnicos oferecidos pelo Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural).

“É um sistema extremamente funcional que reduz as despesas com energia elétrica, fornece energia para outras pessoas que utilizam esse sistema de transmissão. Fizemos parcerias com empresas para beneficiar os produtores rurais com descontos em formas de pagamento facilitado para poder adotar aí o sistema solar dentro da sua propriedade”, explica. 

Desafios em MS

A crise, por definição, é um momento crítico e que apresenta uma situação difícil, a qual exige uma decisão certeira, principalmente para o problema não ocorrer novamente. Na maioria das vezes, pode ser previsto. E o que dizer sobre o prejuízo acima de R$ 12 bilhões que Mato Grosso do Sul teve na safra 2023/2024? Poderia ser antevisto, de forma que os produtores rurais não estivessem agora amargando dívidas e, inclusive, buscando formas de renegociar créditos? A resposta, a exemplo de muitos casos bem sucedidos, está no investimento em tecnologia.

Neste Estado, em específico, o monitoramento do milho, referente à segunda safra do ano agrícola, apresentou recuo de 5,4% em relação ao ciclo passado (2022/2023). Sobre a soja, conforme balanço da Aprosoja/MS (Associação dos Produtores de Soja), a produtividade foi estimada em 50,5 sacas por hectare e representou uma diminuição de 19,12%.

Granja depende de energia para funcionamento. (Arquivo Pessoal)

Ao falar do assunto, na mais recente edição da Showtec, a maior feira agropecuária de Mato Grosso do Sul, o presidente da Aprosoja-MS, Jorge Michelc, disse que a safra de soja do Estado – o quarto maior produtor do Brasil – sofreu impactos com a seca, durante a época do plantio, e isso reduziu o potencial de produção local e ocasionou o prejuízo bilionário, conforme também ressaltou o governador do Estado, Eduardo Riedel.

“Momentos bons e ruins na agricultura e na pecuária são cíclicos. A perda de R$ 12 bilhões terá um grande impacto, não apenas no bolso dos produtores, mas em toda a sociedade sul-mato-grossense. É investimento, é giro, é dentro das cidades que os municípios sentem, mas não é a primeira e nem será a última. É um processo que a gente, ao longo do tempo, quem é da atividade, quem convive com a atividade, sabe que esta não é uma atividade de curto prazo. São 20, 30, 40, às vezes olhando uma geração pra frente e olhando duas três pra trás, a gente vem se fortalecendo ao longo do tempo….”, argumentou Riedel.

Tecnologia e ciência minimizaram perdas de produtividade

Em todo este cenário de perdas, a tecnologia e a ciência minimizaram os resultados de perdas de produtividade. E isso se deve ao enfrentamento das intempéries climáticas, fazendo a rotação de culturas, uso de plantas de cobertura – saindo da tradicional dicotomia soja-milho.

Outro aliado nesse cenário é o uso de pivôs para irrigação de determinadas culturas, especialmente os que funcionam com energia solar. Há a “ousadia” daqueles que fizeram o investimento em placas e estão se adaptando às modernidades inseridas também no meio rural.

“A energia solar tem a proposta de trazer solução para o agronegócio, tanto é que participamos pelo quarto ano consecutivo, na grande feira agropecuária que é a Showtec. Aqui a nossa solução apresentada é o pivô movido a energia solar. E qual é o seu diferencial? É ter o funcionamento dele com energia sustentável e por meio de baterias, então, por exemplo, eu não necessito da conexão deste pivô com a rede elétrica. Eu não preciso e é como se fosse um gerador”, explicou o engenheiro civil e diretor da MS Energy Engenharia, Ary Zornitta.

Seca extrema traz vários prejuízos, incluindo favorecimento de incêndios florestais. (Bruno Rezende, Gov MS)

Atuante no segmento fotovoltaico desde 2015, Zornitta ressalta que a bateria, na verdade, vai atuar como backup. “Eu preciso de energia? De onde eu retiro? Da bateria. E aí faz esse funcionamento do pivô. É claro que, para funcionar, é preciso entender a dinâmica de funcionamento, qual será o motor, a capacidade, o tempo de uso, para que a gente faça o dimensionamento de tudo. E aí damos toda a assistência, sempre na parte do fotovoltaico”, argumentou.

Na maioria dos casos, como a irrigação ocorre no período noturno e não há produção naquele momento, é a energia armazenada que será utilizada.

“Por isso, é importante que, no meio do processo, não haja nenhum tipo de falta de energia, então, é feito este dimensionamento adequado e conforme a necessidade do uso. E para casa uso terá um formato e condição de dimensionamento de produção e tudo. E em Mato Grosso do Sul, em específico, temos de soluções de energia solar, principalmente para este período, de quebra de solo”, disse o empresário.

Bombeamento solar é solução para pecuária e pastagens

Entre as soluções, está o bombeamento solar, voltado especialmente para a pecuária e pastagens. “É a questão de levar água aonde não tem disponibilidade de rede elétrica, então, você faz um posto ali ou uma estrutura hídrica, para ter este atendimento. E, no caso de irrigação, se houver uma falta ou algo neste sentido, pode usar o mesmo princípio, de fazer um sistema de bombeamento, que é você fazer essa captação, armazenamento desta água, para uma utilização posterior”, explicou Ary.

Assim, a solução chega ao problema, com o bombeamento solar em uma região inóspita. “Quando falamos de irrigação, é preciso armazenar energia para que funcione no período noturno e, no final do dia, isso irá reduzir custos, então, tudo, visando no final do dia, é você ter uma redução de custos. Por exemplo, quando a gente traz a energia solar para a cidade, para o nosso dia a dia, um dos objetivos, mas, não o único, é você ter economia, então, a proposta é levar a solução para o problema e ter economia”, explanou o empresário.

Sobre os casos ocorridos no Estado, a coordenadora comercial da MS Energy, Amanda Chiminaccio, ressaltou que muitos produtores utilizam o gerador a diesel, às vezes, para suprir a necessidade, então, buscam trabalhar de forma híbrida, com o solar e o gerador a diesel.

“Temos casos de produtores que reduziram em até 60% o uso do óleo diesel, então, você não precisa, teoricamente, colocar 100% solar, mas, você consegue também fazer este investimento modular para você ir reduzindo o seu custo com óleo diesel, manutenção, porque não é só o custo”, disse.

De acordo com Amanda, é necessário também, para o produtor rural, levar em conta o trabalho que o óleo diesel gera, já que precisa de pessoas ao redor para alguma operação, enquanto a energia solar reduz essa necessidade.

“E aí, é o caso que eu falo, de trabalhar de forma híbrida com o gerador e com a rede também. E também temos muitos casos de fornecimento de má qualidade, em que o cliente já tem o pivô, por exemplo, porém, por necessitar de uma carga alta, ele tem dificuldades no fornecimento da rede elétrica, correndo risco até de queima ou dano em equipamentos”, informou.

Energia solar: inovação para MS

Palestra na Showtec sobre a importância da água e irrigação (Graziela Rezende/Jornal Midiamax)
Palestra na Showtec sobre a importância da água e irrigação (Graziela Rezende/Jornal Midiamax)

O agrônomo e consultor de agronegócio, João Pedro Cuti Dias, ressalta que, ao avaliar as perdas da última safra e tantas outras, a grande questão é a seguinte: por que a irrigação não avança?.

“A água e a irrigação nos colocaria em condições normais de clima e isso poderia ocupar um papel muito importante, com variável de plantas. Seria como ter cinco safras em dois anos, por exemplo, em que se plantaria soja, milho e depois outras culturas, é claro, com o uso mais intenso do solo, porém, sem ter que se preocupar com a questão da chuva, que prejudicou a safra este ano Brasil, em que perdemos 10 milhões de toneladas, na produção de soja, principalmente porque faltou água, então, você diminui o risco de perdas por falta de chuvas”, argumentou Dias.

Conforme o consultor, o milho é bem mais dependente da água e, com a irrigação, seria possível mais safras. “Aumenta muito o potencial, só que esta irrigação precisa de motores potentes. Hoje estamos viabilizando plataformas, de energia solar, que funcionem durante o dia, usando o período de sol, desde que tenha boa intensidade e assim pode usufruir disso à noite. No caso da forma híbrida, acho que encarece muito”, opinou.

Como exemplo, João Pedro cita propriedades rurais do Rio Grande do Sul, que produzem arroz. “É o grande produtor do Brasil e, em muitos locais, eles acumulam água no inverno e, no verão, bombeiam com óleo diesel para as lavouras. Acho que aqui ficaria muito caro, mas a tendência, a medida que vai baixando custos e vai aumentando a eficiência das placas, é buscarmos fazer desta forma, talvez em um futuro não tão remoto. O que ocorre é que hoje uma bateria de lítio custa uma fortuna. É esta usada em carros e fica ainda mais caro dependendo de onde vai ligar”, explicou.

Feira agropecuária trouxe 50 contratos de energia solar

Feira agropecuária trouxe inovações para o campo (Graziela Rezende/Jornal Midiamax)
Feira agropecuária trouxe inovações para o campo (Graziela Rezende/Jornal Midiamax)

De acordo com o analista, anúncio recente, também na Showtec, apontou que mais de 50 projetos foram vendidos para a irrigação, por meio da energia solar.

“É algo que já está acontecendo, ainda mais agora com mudança climática, porém, precisa ter água e a outorga de água para pegar nos rios será cada vez mais difícil. Assim, o mais viável seria o açude igual no Rio Grande do Sul, para usar no período da seca. É algo que está tá começando a acontecer e é um bom sinal. O próprio governo, aliás, está criando estímulos e recursos, agilizando os processos de construção de represas”, finalizou.

Fundação MS faz pesquisas sobre rotação de culturas e apoia uso da energia solar

A Fundação MS, que possui 32 anos de atuação no Estado, gerando e adaptando tecnologias agropecuárias, com a intenção de apoiar o crescimento na área cultivada e realiza pesquisas sobre rotação de cultura, eficiência de defensivos agrícolas, fertilizantes, materiais de soja e milho e sistemas integrados lavoura-pecuárua-floresta, além de organizar a Showtec, diz que a presença de empresas de energia solar foram fundamentais na edição 2024.

Pesquisador fala sobre inovação com a presença de empresas de energia solar em feira agropecuária (Graziela Rezende/Jornal Midiamax)
Pesquisador fala sobre inovação com a presença de empresas de energia solar em feira agropecuária (Graziela Rezende/Jornal Midiamax)

“Estas empresas trouxeram para a Showtec uma inovação bastante interessante e que vem ganhando espaço na questão da energia solar na agricultura, então, isso vai trazer mais economia, mobilidade e deixar o projeto mais sustentável, trazendo mais áreas irrigadas, segurança na agricultura e não teremos mais problemas na safrinha”, argumentou o pesquisador da Fundação MS e coordenador da Showtec, André Luis Faleiros Lourenção.

Segundo André, que é também engenheiro agrônomo e doutor em produção vegetal, a irrigação com energia solar também abre oportunidades para outras culturas, casando justamente com o estudo que a Fundação MS desempenha em Mato Grosso do Sul.

“A equipe de pesquisadores faz estudos deste tipo, de espectro de culturas e assim teríamos uma gama maior, com mais opções de culturas em sistema irrigado. É a evolução do agro em andamento e prova disso foi o número de contratos fechados pelas empresas de energia solar. E o Showtec foi e é sempre uma vitrine para estas novas tecnologias, lançando ali mesmo e já comercializando, então, para nós é muito gratificante”, finalizou.

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