Férias em montadoras não afetam entrega de novos, mas usados movimentam garagens de Campo Grande

Concessionárias alegam que estoque é capaz de atender demandas. Porém, queda na procura por novos aumenta a venda dos veículos usados nas garagens

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carros
(Foto: Natalia Alcântara/Jornal Midiamax)

Várias montadoras de carros anunciaram, neste mês de março, que vão conceder férias coletivas aos funcionários e paralisar a produção de veículos em suas fábricas brasileiras. Os principais motivos variam desde a falta de equipamentos até queda na venda de veículos novos. Em Campo Grande, concessionárias alegam que a paralisação não afetou a movimentação por causa do estoque disponível. Mesmo assim, carros usados conquistaram preferência do consumidor pelo valor reduzido em comparação aos novos e seminovos.

As montadoras da Volkswagen, Hyundai Motor Brasil, Mercedes-Benz do Brasil, GM e Stellantis (agrega Fiat, Peugeot e Citröen) já anunciaram a paralisação temporária das atividades. Para Carlos Villa, gerente de veículos novos da concessionária Chevrolet Perkal, que comercializa veículos da GM (General Motors), as vendas continuam normais porque loja tem estoque para atender demanda durante as férias coletivas.

“Temos estoque suficiente para que possa gerar vendas. Também criamos estratégias de vendas, como taxas a partir de zero, pagamento só daqui a 180 dias, planos para CNPJ e produtor rural. Tudo contribui para que as negociações continuem em andamento”, afirma.

Ele ainda explicou que os veículos da marca chegam de São Paulo até Campo Grande de 2 a 3 dias e que os mais procurados são Onix, Montana, S10 e as SUVs Tracker.

“A nossa economia é diferenciada porque é baseada no agronegócio, como estamos num período de safra, os preços estão condizentes com o mercado. Nosso carro-chefe são veículos novos, mas a procura por seminovos também é grande. A venda é semelhante para os dois segmentos”, ressalta.

Aumento da venda direta

Detentora das marcas Fiat, Jeep, Peugeot e Citroën, a Stellantis também adotou as férias coletivas na unidade de Goiana (PE) desde a última quarta-feira (22) até 10 de abril, em todos os três turnos de trabalho. De acordo com a multinacional, o objetivo também é ajustar o volume de produção à demanda disponível no momento.

Rhude Hermes Souza, gerente de vendas de carros novos da Fiat Enzo da Avenida Costa e Silva, também alega que a movimentação na loja funciona normalmente. Uma vez que a fábrica antecipou a produção, concessionária consegue atender a todas as demandas. Além disso, a venda direta para produtor rural triplicou em 2023 em comparação a 2022.

“Isso é sinal de que o mercado está retomando de forma gradativa. No varejo deu retraída, mas venda direta aumentou”, diz.

Souza ainda comenta que os carros mais procurados são Strada e Fiat Toro e que os novos têm previsão de chegada a Capital de 30 a 90 dias, dependendo do modelo.

Em outro espaço, esse especializado na venda de Jeep, a atendente da loja também afirmou que “o nosso processo está normal, [as férias coletivas] não afetaram em nada porque tem carro no estoque”. Porém, também comentou que a venda de novos está menor do que no ano passado.

Carros usados superam novos e seminovos

No setor de veículos há muitos anos, Felipe Carneiro de Carvalho é gestor da Teca Automóveis, especializada em seminovos. Ele contou à equipe de reportagem que teve queda 2,53% nas vendas de janeiro a março de 2023, em comparação ao mesmo período de 2022, por causa da taxa de juros, a não correção salarial conforme a inflação e preços do combustível, escola e demais produtos.

“A preferência das pessoas sempre vai ser pelo novo, mas devido ao alto preço e as taxas de juros, a pessoa não consegue pagar a parcela de um carro zero. Por isso, o que movimenta o setor hoje são os carros usados, ou seja, aqueles com mais de 5 anos de uso”, afirma.

Ele explica ainda que os carros seminovos são mais recentes, como de 2020 e 2021, enquanto os usados são datados em média de 2012 e 2014, por exemplo.

carros seminovos em garagens
(Foto: Ilustrativa/ Henrique Arakaki/Midiamax)

“Os seminovos de 2020 a 2021 não estão girando porque, mesmo sendo usados, ainda são caros. Carros até R$ 50 mil no âmbito popular saem mais porque a renda média do brasileiro consegue pagar parcelas de até mil reais”.

Em março, a loja de Felipe registrou a venda de 61 carros. Desse total, 60% custavam até R$ 50 mil. “O mercado de seminovo está ruim, mas para usado está bom”, afirma. Dessa forma, o empresário ressalta que essa é uma realidade em todo o Brasil.

Segundo informações da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores), o mês de janeiro de 2023 teve 1.060.073 transações de usados, resultado 10,6% acima do registrado no mesmo mês do ano passado. Na comparação com dezembro de 2022, a baixa é de 19,4%, devido, especialmente, à sazonalidade do período.

O início de ano é uma época em que muitos consumidores estão lidando com despesas como IPVA, IPTU, matrícula e materiais escolares e isso reflete nos números do nosso Setor”, afirma o Presidente da Fenabrave , Andreta Jr., que ressalta que, apesar disso, o resultado foi melhor do que no ano passado. “As transações superaram 1 milhão de unidades e todos os segmentos registraram alta sobre janeiro de 2022”, afirma. 

Férias coletivas das montadoras

A fábrica da Volkswagen Taubaté (SP) terá férias coletivas de 10 dias a partir desta segunda-feira (27) para manutenção de produção da unidade e pela instabilidade na cadeira de fornecimento de componentes.

Na Hyundai Motor Brasil, as férias coletivas começaram segunda-feira (20) para os três turnos de produção e equipes administrativas da fábrica em Piracicaba, no interior de São Paulo. As férias coletivas vão até o dia 2 de abril, mas não atingem as operações da fábrica de motores, localizada no mesmo complexo industrial. Segundo a empresa, o objetivo é adequar os volumes de produção para o mês de março, evitando a formação de estoques. A empresa informou que acompanhará a dinâmica do mercado interno de veículos para o primeiro trimestre deste ano.

Já a Mercedes-Benz do Brasil informou que vai conceder férias coletivas, de forma parcial, na fábrica de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, de 3 de abril e 2 de maio por necessidade de ajuste no programa de produção. De acordo com a montadora, a medida é necessária por causa da falta de componentes na indústria automotiva global e nacional e para adequação dos volumes de vendas do mercado de veículos comerciais.

As montadoras GM e Stellantis também vão conceder férias coletivas aos funcionários, paralisando a produção nas fábricas em São José dos Campos, em São Paulo, e Goiana, em Pernambuco.

Em entrevista à Agência Brasil, o professor Antônio Jorge Martins, coordenador dos cursos automotivos da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP), disse que as paralisações e as férias coletivas foram motivadas basicamente pelo aumento dos custos que, como consequência, fez subir o preço dos veículos e elevar os custos dos financiamentos.

“O mundo passou por grandes mudanças ao longo dos últimos anos e, em particular, após a pandemia. A pandemia, de forma geral, até por conta do início da digitalização das empresas mundiais, fez com que aumentassem os custos de várias peças e componentes da área automotiva, em particular, dos semicondutores”, disse o professor.

De acordo com Martins, o segundo motivo da paralisação da produção foi o cenário econômico brasileiro, principalmente por causa da alta dos juros. “A taxa de juros praticada pelo mercado financeiro também afetou a demanda de veículos até porque, na prática, de 60% a 70% das vendas são feitas por meio de financiamentos. Então, se a sociedade já está com o poder de compra abalado e, paralelamente, ainda tem dificuldades de cumprir os novos custos decorrentes de financiamentos, isso de forma geral acabou reforçando a necessidade de paralisação das montadoras que, por sua vez, não têm interesse em produzir para estoque”, afirmou.

Aumento da inadimplência e dos juros

A Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef) já havia alertado sobre tal cenário em seu último boletim. Segundo a Anef, o ano de 2022 foi fortemente impactado pela alta de preço dos veículos, bem como pelo aumento da inadimplência e dos juros. A associação ressaltou que a inadimplência de pessoas físicas com pagamentos em atraso superior a 90 dias chegou a 5,9% em 2022, o maior índice dos últimos anos.

Para Martins, a paralisação da produção de veículos não deve se prolongar ou durar muito tempo. “A estratégia das montadoras não é ficar muito tempo parada. As que têm estoque vão parar um pouquinho mais. Aquelas que têm menor estoque param menos, mas a estratégia é realmente adequar a produção a uma nova realidade de demanda.” O professor estima que, neste ano, o setor automotivo feche com crescimento entre 2% e 5% em relação ao ano passado.

*Com informações da Agência Brasil.

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