Rito de despedida pede justiça por morte brutal de haitiano em Campo Grande

Representantes do movimento negro e de imigrantes realizam um protesto pedindo celeridade para o caso de Mardoché

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Protesto em frente ao local do assassinato (Nathalia Alcântara, Midiamax)

“Os imigrantes vêm para esse país em busca da dignidade humana e nada tem o direito de tirar uma vida”, descreve Romilda Pizani, representante do Fórum Permanente das Entidades do Movimento Negro de Mato Grosso do Sul, durante ato, na manhã desta segunda-feira (20), pedindo por justiça e andamento das investigações sobre o caso de Mardoché Borgelin, haitiano assassinado por espancamento.

Em frente ao local do crime, representantes do movimento negro e de imigrantes realizam um ritual de despedida para Mardoché. O haitiano Orlando VX, 39 anos, explica que a cruz é um simbolismo da partida, reunida com pétalas de rosas e velas.

“Estamos no lugar que ele morreu pedindo por justiça. Fiz a cruz, pois é um símbolo de morte que não poderia ter acontecido. O significado das velas é procurar quem estava errado e as pétalas é a saudade. Nós, estrangeiros, somos trabalhadores, viemos em busca de uma vida melhor. A família dele está inconsolável”.

Haitiano vivia sozinho

O grupo também realizou preces em uma breve caminhada no local. Mardoché não tinha familiares em Campo Grande. Junel Ilora, preside a Ashabra (Associação para a Solidariedade dos Haitianos no Brasil), saiu de Gonaive, no Haiti, e vive em Campo Grande desde 2014. Ele ressalta que a comunidade está em choque com a brutalidade da morte do companheiro.

“Nunca vi uma notícia tão chocante. Um grupo de pessoas assassinou, talvez pela cor, talvez por de onde ele veio, mas nada justifica uma brutalidade. Estamos aqui pedindo um esclarecimento do Estado. Ele estava morando aqui em frente ao Ceasa, pois a visão dele era juntar uma renda e trabalhar a noite. Ele queria trazer, ainda nesse ano, a mulher e a esposa. A família dele está chocada, a mãe, de 76 anos, recebeu a notícia e ainda está chorando”.

(Nathalia Alcântara, Midiamax)
Haitiano estaria planejando trazer a família para Campo Grande (Nathalia Alcântara, Midiamax)

Justiça

Na noite de 8 de janeiro, Mardoché foi brutalmente espancado por 10 pessoas, próximo à Ceasa (Central de Abastecimento de MS). O Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) foi acionado, entretanto, ele morreu no local. Dois homens, de 30 e 31 aos, foram presos por envolvimento no crime, que ainda segue com as investigações em andamento.

Romilda Pizani descreve o racismo estrutural sofrido pelos imigrantes. O ato representa uma reflexão sobre a falta de oportunidades no país e que a violência impera entre os mais vulneráveis.

“Ninguém sai do país de origem para viver em outro país porque quer, porque gosta. Essas pessoas, em especial, elas vêm para um único objetivo, que é sobreviver. E nós sabemos que estamos falando de um corpo preto. Estamos falando de algo que, historicamente, é encoberto, mas que também existe uma violência muito grande. Porque se formos falar do genocídio da população negra, esse caso é mais um caso para a estatística brasileira. Estamos aqui também cobrando isso para que não se caia no esquecimento”.

Caminhada no trecho onde ele vivia (Nathalia Alcântara, Midiamax)

Relembre o caso

O haitiano Mardoché Borgelin, 35, morto a golpes de barra de ferro, pauladas e pedradas próximo à Ceasa em Campo Grande na noite de 8 de janeiro, teria sido espancado por grupo de 10 homens.

Testemunhas relataram à polícia que a vítima passou o dia transtornada, apresentando agressividade com os vizinhos, inclusive causou importunação na Ceasa (Central de Abastecimento de MS), quando seguranças tiveram que a tirar de lá.

Já à tarde se envolveu em confusão com frequentadores de um bar que fica ao lado da vila de casas onde mora. Na ocasião ele chegou a ser agredido por algumas pessoas no bar.

Presos

A polícia foi acionada e esteve no local, mas não teve condução para a delegacia, pois a vítima não soube informar quem eram os agressores e também não tinha interesse em representar criminalmente. Os policiais o orientaram a não voltar mais ao bar e não perturbar os vizinhos.

Porém, cerca de 20 minutos depois, a polícia foi acionada novamente, dessa vez porque os frequentadores do bar invadiram a vila de casas e passaram a espancar Mardoché.

O haitiano foi encontrado do lado de fora com fraturas severas na cabeça, com afundamento da face.

(Nathalia Alcântara, Midiamax)

Foram feitas buscas na região e dois suspeitos localizados. Eles apresentavam sangue nas roupas. Eles disseram que estavam no local e negaram participação nas agressões, mas a dupla foi reconhecida pelo segurança da Ceasa.

Várias testemunhas foram ouvidas na delegacia. Duas delas contaram que não viram os autores das agressões, mas que retiraram o corpo da vítima para fora da vila. Eles alegam que não sabiam que não podia.

Passagens

O rapaz já havia sido preso por tentativa de homicídio após esfaquear outro haitiano, na rua Frei Mariano, em Corumbá, cidade a 446 quilômetros de Campo Grande, em junho de 2023.

Na época, ambos ingeriam bebida alcoólica e iniciaram uma briga em frente a uma vila de casas. A vítima teria pegado um facão para golpear ele. Conforme o registro policial, o autor entrou em luta corporal com o desafeto, tomou o facão e golpeou a vítima. Na época, a vítima foi encaminhada ao hospital e Mardoché foi preso.

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