No início de setembro, um incêndio de grandes proporções em uma área de vegetação atingiu um comércio do bairro São Francisco, em Campo Grande. As labaredas destruíram a fiação elétrica, além de danificar as paredes do imóvel. “Foi assustador, tivemos que retirar os carros às pressas. A gente só via a fumaça e as labaredas de fogo”, relata o comerciante.
Diante dos extremos climáticos, como a estiagem e baixa umidade do ar, aliados à falta de manutenção em terrenos baldios, incidentes semelhantes tendem a ocorrer com frequência. Sendo assim, dá para proteger meu imóvel quando o fogo é no vizinho?
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Ao Jornal Midiamax, o engenheiro e conselheiro do Crea-MS (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Mato Grosso do Sul) João Victor Maciel de Andrade Silva, que também atua como empreendedor no setor de construções industrializadas, explica que há uma série de medidas que podem atenuar e reduzir os efeitos que um incêndio em um terreno vizinho pode causar no seu imóvel.
Soluções
O especialista ainda reforça que, na maioria das vezes, as soluções não tornam a edificação incombustível — o que seria inviável economicamente; no entanto, aumentam o tempo que a construção consegue resistir a uma situação de incêndio.
“Um conceito fundamental é o TRRF [Tempo Requerido de Resistência ao Fogo], que estabelece o tempo mínimo, em minutos, de resistência ao fogo de diferentes elementos construtivos — paredes, vigas, pilares, coberturas, entre outros. Outro parâmetro importante é a CMAR [Reação ao Fogo dos Materiais de Acabamento e Revestimento], que avalia como os materiais se comportam quando expostos ao fogo, diferindo do TRRF.”
“Além das propriedades dos materiais, há medidas passivas e ativas de proteção, como a compartimentação horizontal e vertical, que busca conter o fogo em um único ambiente, o isolamento de risco, por exemplo, distâncias seguras entre edificações e sistemas automáticos, como os sprinklers.”
Outras características da edificação também influenciam a definição das medidas adequadas de segurança, por exemplo, dimensões, altura, tipo de uso e ocupação. Logo, o engenheiro ressalta que é essencial que um profissional capacitado e habilitado, como os engenheiros registrados no Crea-MS, faça a correta especificação das soluções, sempre com base na legislação, nas normas técnicas e nas instruções do Corpo de Bombeiros, para garantir a máxima segurança contra incêndio.
Medidas adotadas na construção civil
As regras de proteção contra incêndio se tornaram muito mais rigorosas após a tragédia da Boate Kiss, em Santa Maria (RS), em 2013, na qual 242 pessoas perderam a vida. A partir dela, a Lei Federal nº 13.425/2017 (Lei Kiss) foi criada como marco regulatório.
Atualmente, a estrutura regulatória brasileira funciona de forma tripartite:
- Federal: leis e normas técnicas que estabelecem diretrizes gerais.
- Estadual: Corpos de Bombeiros Militares regulamentam, por meio de IT (Instruções Técnicas) e NPT (Normas de Procedimento Técnico), as medidas exigidas, as classes das edificações e a regularização dos PSCIP (Planos de Segurança Contra Incêndio e Pânico).
- Técnico: a ABNT, responsável pelas NBR (Normas Brasileiras), que servem de base para os projetos e as legislações.
“O PSCIP é o documento que reúne todas as medidas de segurança adotadas em uma edificação. Ele deve ser elaborado por um profissional habilitado, com emissão de ART [Anotação de Responsabilidade Técnica], e protocolado junto ao Corpo de Bombeiros.”
“De fato, um clima mais quente e seco favorece a propagação de incêndios. Contudo, na maior parte dos casos urbanos, a causa está ligada a ações humanas imprudentes — como queima de lixo seco, descarte inadequado de materiais combustíveis e instalações mal executadas. Essas ações, associadas às mudanças climáticas, têm causado um maior número de incêndios e devem ser evitadas por meio da conscientização dos riscos à população.”
Materiais inteligentes e antichamas
A construção civil tem incorporado cada vez mais materiais modernos e tecnologias de proteção contra incêndio. Atualmente, há um processo de transformação da construção civil e uma tendência de busca por construções mais eficientes e sustentáveis.
Engenheiros e construtores têm buscado sistemas construtivos modernos, como a construção a seco, para atender a requisitos cada vez mais exigentes. Nesses sistemas, eles aplicam materiais modernos e tecnológicos, inclusive materiais antichamas, visando alcançar o máximo de eficiência.
Alguns exemplos:
- Placas resistentes ao fogo: gesso acartonado ou placas cimentícias com aditivos antichamas, que, quando associadas à lã de rocha, podem alcançar até 120 minutos de resistência.
- Lãs minerais incombustíveis: como a lã de rocha, que, além de isolamento térmico e acústico, atua como barreira à propagação de chamas.
- Tintas e revestimentos intumescentes: aplicados em aço ou madeira engenheirada (CLT, MLC), expandem ao calor, criando camada protetora.
- Selos e massas corta-fogo: aplicados em passagens de tubulações, vedam frestas contra fogo e fumaça.
- Madeira tratada com retardantes de chama: reduz a inflamabilidade, mantendo desempenho estético e estrutural.
- Vidros resistentes ao fogo: laminados com camadas intumescentes, que bloqueiam calor e fumaça sem estilhaçar.
- Blocos de concreto celular autoclavado: é um material leve, preciso e de alto desempenho termoacústico, produzido a partir de uma mistura de cimento, cal, areia e aditivos curados em autoclave. Utilizado principalmente em vedações, garante rapidez de execução, resistência ao fogo e sustentabilidade, sendo uma alternativa moderna aos blocos convencionais.
“Assim, é possível projetar construções que vão além do mínimo exigido em norma, alcançando um nível superior de segurança. Isso depende da correta concepção do projeto, da escolha dos materiais e do PSCIP elaborado por profissionais habilitados, garantindo a segurança e a confiança do usuário final. Caso precise, busque o Crea-MS, para receber recomendações de profissionais habilitados para este tipo de trabalho”, destaca o engenheiro.

Multa para o vizinho
A falta de cuidado com o terreno e atear fogo em vegetação são considerados crimes ambientais e podem gerar multa de até R$ 12 mil. Contudo, há possibilidades para denunciar a fim de evitar episódios de incêndios em terrenos.
De acordo com a Semadur (Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano), o proprietário é o responsável pela limpeza do terreno, e o município deve fiscalizar em caso de irregularidade denunciada, como atear fogo sob a desculpa de “limpar” o terreno.
O Código de Polícia Administrativa do município autua o proprietário. O artigo 18-A, § 1º, da Lei 2.909, estabelece que “veda a prática de queimada nos terrenos baldios e quintais, sendo obrigação do proprietário tomar as medidas necessárias para evitá-la, sendo responsável nos casos de sua ocorrência”.
A multa, neste caso, varia entre R$ 3.091,50 e R$ 12.366, conforme a área afetada.
Como denunciar?
Em muitos casos, há um temor em denunciar o vizinho ou proprietário do terreno sujo por risco de represálias. Entretanto, a pasta afirma que há o disque-denúncia pelo telefone 156, no qual o morador pode formalizar a reclamação de forma anônima referente à queimada urbana.
Quando se tratar de ocorrência relacionada ao ato de provocar a queima de resíduos, a orientação é de que seja efetuada a denúncia imediatamente aos órgãos de segurança pública, para ser efetuado o flagrante. Assim, será possível a correta identificação do autor da queimada.
Além disso, os moradores sofrem um ato infracional, um crime ambiental. Se identificarem o infrator em flagrante, podem responsabilizá-lo e conduzi-lo à Decat (Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Ambientais e de Atendimento ao Turista), o órgão responsável pela repressão aos crimes ambientais.
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(Revisão: Dáfini Lisboa)