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Cotidiano

Grades não bastam: arquitetura de acolhimento pode reduzir casos de suicídio em Campo Grande?

O suicídio é um tema cercado de estigmas sociais que atravessam séculos. Por isso, uma série de recursos de enfrentamento deve ser explorada
Karina Campos -
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Trecho recebe mensagens de apoio emocional às vítimas em sofrimento mental (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

No último dia de setembro — mês marcado pela campanha do Setembro Amarelo, de prevenção ao suicídio — mais uma vida foi perdida em um pontilhão de . Entre 2018 e 2023, esses locais receberam grades como tentativa de evitar novos casos.

O suicídio é um tema cercado de estigmas sociais que atravessam séculos, sem que se admita que o cuidado com a saúde mental é uma responsabilidade coletiva. Por isso, é importante explorar uma série de recursos de enfrentamento.

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A discussão ganha força diante da ineficácia das chamadas “gaiolas de ferro” instaladas nos pontilhões. Embora pouco debatido e ainda menos valorizado, o desenvolvimento da arquitetura e do urbanismo voltado para a prevenção do suicídio pode oferecer caminhos. Afinal, um planejamento urbano mais humano pode proporcionar ferramentas de acolhimento?

Para a arquiteta e urbanista Regina Maura Lopes Couto Cortez, especialista em Direito Ambiental, ex-diretora de Trânsito da Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito) e ex-diretora técnica da Planurb (Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano), o assunto envolve várias vertentes, que vão do emocional a rotina de trabalho, por exemplo. Assim, embora arquitetura e urbanismo não sejam a solução única para os índices de suicídio, podem ser instrumentos importantes na estruturação de uma sociedade mais acolhedora.

“Como nós podemos pensar as cidades para que elas sejam o lugar da felicidade das pessoas? É pensar a cidade para pessoas. Isso significa criar uma cidade igualitária, que não exclui, que oferece espaços públicos de qualidade, com boa manutenção, uma arborização de qualidade, auspiciosa. A cidade deve ser o lugar onde as pessoas se encontram, sejam felizes. Estamos construindo cidades cada vez mais individualistas. Nosso transporte coletivo é lamentável — e não falo só de Campo Grande, mas do Brasil. Temos hoje uma visão de cidade ainda mais individualista do que no início do século XX. Regredimos muito”, afirma Cortez.

O crescimento urbano e seus efeitos

Um artigo publicado na Revista Científica de Ciências Aplicadas, assinado pelos arquitetos Beatriz Frasão Tonon e Bruno de Souza Porto, aponta que a própria história da arquitetura reflete a evolução humana — desde a proteção contra predadores até a construção em concreto diante do crescimento urbano.

O estudo destaca que a interação das pessoas com os ambientes construídos pode influenciar diretamente o comportamento humano. Os espaços, planejados ou não, influenciam quem os frequenta. Materiais, formas, cores, texturas e iluminação compõem cada local e todos esses elementos podem gerar diferentes emoções nos indivíduos.

Além disso, outro dado importante citado no estudo vem da Cartilha da Ambiência, do Ministério da Saúde. O documento reforça que o espaço deve buscar o conforto por meio da interação harmoniosa entre elementos físicos e as pessoas.

“A gente tem que pensar uma cidade ou numa arquitetura urbana, em espaços urbanos, que não ofereça riscos para as pessoas? Isso é de uma tristeza imensa. Fazer grades enormes, telas em tudo canto? Se for pensar assim, estamos construindo uma epidemia do suicídio e nós estamos atacando o efeito sem atacar a causa. A primeira questão é: onde estão as políticas sociais que encaram de frente esse problema?”, questiona Regina.

“Agora, é claro, precisamos de espaços seguros. Mas eu prefiro pensar que devemos construir cidades para pessoas felizes. Isso exige espaços públicos de qualidade. Como estão os espaços públicos nas periferias? Que tipo de conforto oferecem?”, completa.

Soluções arquitetônicas

Para o professor e arquiteto Fábio Fernando Martins Oliveira, a arquitetura, aliada à engenharia e ao urbanismo, tem um papel fundamental não apenas na estética e funcionalidade das cidades, mas também na promoção da saúde mental e na proteção da vida.

Ele ainda dá o exemplo emblemático da Ponte Internacional da Amizade, que liga Foz do Iguaçu e Ciudad del Este, entre o Brasil e o . Além de sua importância estratégica e econômica, a estrutura se destaca pelo projeto da passagem de pedestres, que é coberta e possui proteção nas laterais — uma solução que atua também como barreira física e psicológica à prática do suicídio.

“Em tempos em que os índices de transtornos mentais vêm crescendo globalmente, é urgente que Estados e municípios passem a considerar, em suas políticas públicas e projetos urbanos, soluções arquitetônicas preventivas em pontos críticos como viadutos, passarelas e pontes”.

Ele destaca soluções como:

  • Passagens cobertas: além de proporcionarem conforto térmico e segurança, dificultam o acesso a áreas vulneráveis;
  • Laterais com elementos vazados (como cobogós): esses elementos, tradicionais na arquitetura brasileira, permitem ventilação e iluminação natural, mantendo a visibilidade e, ao mesmo tempo atuando como barreira;
  • Fechamentos verticais elevados: grades, painéis transparentes ou outros materiais que impeçam escaladas ou saltos;
  • Materiais adequados ao contexto local: cada projeto deve respeitar a cultura, o clima e a identidade da região, valorizando soluções sustentáveis e de fácil manutenção;
  • Monitoramento por câmeras e iluminação estratégica: contribuem para a vigilância e ação preventiva por parte de órgãos de segurança e assistência social.

“A prevenção ao suicídio deve ser pensada de forma multidisciplinar. O espaço urbano, quando projetado com empatia e responsabilidade, torna-se um aliado poderoso na proteção da vida. Portanto, é essencial que arquitetos, engenheiros, psicólogos, urbanistas e gestores públicos atuem em conjunto para transformar esses pontos críticos em lugares mais seguros, humanos e integrados à cidade”.

Ponte Internacional da Amizade possui proteção para pedestres (Divulgação, DNIT)

Atendimento de saúde

Criado em 2018, mas restituído em 2024, o CEPS-MS (Comitê Estadual de Prevenção ao Suicídio de ) é uma instância interinstitucional dedicada ao monitoramento, acompanhamento, elaboração e desenvolvimento de ações voltadas à prevenção do suicídio e promoção da saúde mental.

O CEPS-MS é composto por representantes de diferentes secretarias estaduais, conselhos profissionais, universidades e municípios sede de macrorregiões de saúde. Assim, as reuniões são realizadas bimestralmente, com registro em atas.

O monitoramento identificou a necessidade de padronizar condutas assistenciais e fluxos intersetoriais para os casos de tentativa de suicídio, garantindo cuidado oportuno e humanizado, conforme a entidade.

Contudo, as polícias ainda estão em andamento, como a publicação de uma nota técnica, prevista para novembro deste ano, com orientações para acolhimento e encaminhamento adequado e a fase de pactuação sobre as responsabilidades de atendimentos de urgência e emergência, por exemplo, da regulação à Sejusp (Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública)

O plano de ação entre 2025 e 2027 prevê:

  • Integração intersetorial: fluxo único em 100% das macrorregiões;
  • Gestão do cuidado: educação permanente e capacitações regionais;
  • Vigilância: notificação, boletins quadrimestrais e painéis de monitoramento;
  • Prevenção comunitária: ações no Programa Saúde na Escola, campanhas e oficinas de sensibilização;
  • ampliar a cobertura de saúde mental para 87% dos municípios do Estado.

Apoio

Em Mato Grosso do Sul, o GAV (Grupo Amor Vida) oferece apoio emocional imediato para pessoas que estão precisando de ajuda por não se sentirem bem e por estarem em crise. Portanto, o GAV é uma associação civil sem fins lucrativos, fundada no ano de 2001 e com sede em Campo Grande.

A pessoa que está mal e com pensamentos suicidas pode entrar em contato pelo número do GAV:

  • 0800 750 5554

Do outro lado da linha, voluntários estarão em regime de plantão, das 7h às 23h, inclusive sábados, domingos e feriados, para oferecer o apoio.

O GAV garante o anonimato, o sigilo e a não discriminação das pessoas que ligam pedindo ajuda, inclusive a identificação de chamadas está desativada nas operadoras de telefonia.

No nível nacional, outro grupo que oferece apoio é o CVV (Centro de Valorização da Vida), que realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar.

O CVV disponibiliza canais de atendimento diversos:

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