O Pantanal sul-mato-grossense sofre com as queimadas que já destruíram mais de 600 mil hectares do bioma em 2024. Esses incêndios, segundo autoridades e especialistas, são agravados pela seca severa que assola Mato Grosso do Sul.

O biólogo e diretor-presidente a ONG Ecoa, André Luiz Siqueira, atua há quase 20 anos no Pantanal de Mato Grosso do Sul na região de Miranda e afirma que em 2024 a seca pegou os pesquisadores de surpresa.

“De uns anos pra cá, [as baias] têm perdido muita, muita água. Elas ficaram décadas sem secar. Décadas! Então, agora estão secando e o que assustou o pessoal é que muito mais cedo do que o nível que ela chegou hoje. A ‘secura’ que chegou em junho, deveria ser a partir de agosto”, explica ao Jornal Midiamax.

Vídeo postado pela ONG mostrou peixes agonizando até a morte em uma baía hidrográfica que virou apenas um lamaçal por conta da seca extrema.

Ciclos de cheia e seca

Segundo André, antes de 1974 os ciclos de estiagem no Pantanal eram muito mais profundos. Entretanto, o cenário era outro. “A ocupação do solo era muito diferente antes de 1960. Então, o que a gente fez, os impactos, as ações antrópicas tornaram os impactos em grandes ciclos de secas, como a gente vem provavelmente enfrentando”, afirma.

Os efeitos do La Niña e El Niño também interferem diretamente no clico da seca em MS. Entretanto, em 1974, o Pantanal enfrentou uma cheia que deixou grande parte do bioma permanentemente alagada.

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Peixes agonizaram até a morte (Reprodução, Ecoa)

“Nosso Pantanal começou a secar de novo em 2019; 2017 foi a última grande cheia regular que nós tivemos”, afirma André. De 1975 para cá, o Estado viveu ciclos de cheias regulares. Assim, o biólogo destaca os anos de 2006, 2011 e 2014 como ‘extraordinárias’ para o Pantanal.

“De lá para cá sempre se mantinha em níveis muito bons e com isso você também mantinha o Pantanal. É umidade no campo e não tínhamos incêndios. E aí, 2018 a gente começa a baixar bem; 2019 a gente já entra numa situação muito ruim de nível de rios”, relembra à reportagem.

Secas extremas

Segundo o biólogo, de 2018 até 2021 a seca piorou muito. “2021 foi extremamente seco; até acho que mais que 2020, se [não] me engano, só que em 2021 já tinha queimado tudo; não existia biomassa para queimar”, cita o biólogo, relembrando os grandes incêndios florestais que marcaram o Pantanal em 2020.

André explica que a biomassa cresceu em 2023 com algumas chuvas regulares, mas lembra que houve queimadas em novembro e dezembro por conta da onda de calor. “Esse ano acho que foi o ápice, por conta dos níveis muito baixos [de umidade], muita biomassa e secura absurda, com calor também tenso”, explica ao Jornal Midiamax.

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Porto geral em Corumbá (Henrique Arakaki, Jornal Midiamax)

Pantanal: o bioma que mais secou

Segundo pesquisa do MapBiomas Água divulgada nesta semana, em relação ao tamanho do próprio bioma, o Pantanal foi o que mais secou ao longo da série histórica, que cobre o período entre 1985 e 2023.

A superfície de água anual (pelo menos 6 meses com água) em 2023 foi de 382 mil hectares – 61% abaixo da média histórica. Houve redução da área alagada e do tempo de permanência da água. No ano passado, apenas 2,6% do bioma estava coberto por água. O Pantanal responde por 2% da superfície de água do total nacional. 

O ano de 2023 foi 50% mais seco que 2018. Naquele ano, a água no Pantanal já estava abaixo da média da série histórica, que compara com os dados desde 1985. “Em 2024, nós não tivemos o pico de cheia. Então, o ano registra um pico de seca, que deve se estender até setembro. O Pantanal em extrema seca já enfrenta incêndios de difícil controle”, ressalta Eduardo Rosa, do MapBiomas.

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Nível do Rio Paraguai (Divulgação, Ecoa)