Com 18,4 mil indígenas em Campo Grande, caciques aguardam por demarcação de terras: “nosso sonho”
Povos originários relatam abandono da Prefeitura e pedem por melhorias na infraestrutura e documentação de terras
Lucas Caxito –
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Você sabia que 18,4 mil indígenas moram em Campo Grande? Este é o quantitativo registrado no Censo de 2022 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). São 24 comunidades, sendo oito reconhecidas pela Prefeitura, duas em fase de reassentamento e 14 em trâmites para serem reconhecidas. E entre as principais demandas dos povos originários na Capital está a demarcação de terras.
É o que ressalta a cacica Alcinda Tibério, líder da aldeia Água Funda no bairro Nova Lima. Lar de 320 famílias e 706 pessoas, a comunidade abriga indígenas das etnias Guarani, Kadiwéu e Terena.
“A gente não tem as documentações da nossa área e ter esse documento é o nosso sonho. Nós estamos em cima de uma terra que não é nossa, e quem tem o poder de tudo isso é o Estado. A Agehab (Agência de Habitação Popular do Estado de Mato Grosso do Sul) diz que tem o projeto de criar as casas, mas a gente quer a terra”, relata.
“Nós, enquanto indígenas, queremos a nossa mãe terra porque ela é sagrada e é dali que a gente vem. Mas ela não está na nossa mão ainda”, complementa Alcinda.
A cacica da aldeia Água Bonita relata ainda que a comunidade sofre com o abandono da Prefeitura, que desde novembro de 2023 não dá retorno aos ofícios enviados pela comunidade.
“Nossa maior dificuldade é o município não nos atender. O porquê a gente não entende, já mandamos ofício várias vezes para a Sisep (Secretaria Municipal de Infraestrutura e Serviços Públicos) e nada. É uma responsabilidade que às vezes a prefeita não tá dando conta, o município está falhando conosco nesse ponto”, complementou Alcinda.
‘A questão fundiária precisa ser resolvida’
A mesma situação de abandono é sofrida na aldeia Marçal de Souza, localizada no bairro Tiradentes. Segundo o cacique Josias Ramires, vivem no local 617 pessoas, um total de 232 famílias e 147 casas. Ele chama atenção para a principal reclamação dos moradores: a cobrança do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano).
“Hoje nós temos um impasse com relação à demarcação do território, a questão fundiária. É uma luta que vem de vários anos, e a Prefeitura está nos cobrando impostos da nossa terra, está cobrando o IPTU da gente. Essa é uma preocupação, se aqui é uma área indígena, pela legislação não se pode cobrar impostos”, protesta.
A Legislação que Josias comenta está presente na Constituição Federal brasileira, inciso XVI do caput do art. 49 e no § 3º do art. 231 da Constituição Federal. Na Carta Magna, está presente que as terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades indígenas possuem plena isenção tributária, vedada a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns ou outros.
Falta de infraestrutura
Outra questão levantada pelos indígenas é a falta de infraestrutura vivida nas aldeias. Ainda segundo o levantamento do Senso 2022, Mato Grosso do Sul tem ao todo mais de 110 mil indígenas autodeclarados. Desses, 27 mil indígenas não têm acesso a banheiros, utilizando sanitários ou buracos para dejeções e 1.395 não tinham acesso nem a sanitários.
As estatísticas chamam atenção para a falta de saneamento básico e extrema pobreza a qual as comunidades são expostas. Nesse sentido, o cacique Josias chama atenção para a falta de um espaço adequado destinado ao lazer das crianças da aldeia Marçal de Souza.
“A gente também tem muita dificuldade em encontrar um lugar específico para as crianças. As crianças daqui precisam de um lazer. A nossa comunidade indígena é muito tranquila, todos se respeitam, mas falta esse lugar. Falta esse lugar específico dentro da comunidade”, relata.
Na aldeia Água Bonita, Alcinda chama atenção para a baixa qualidade das ruas da comunidade. Apesar de ter a linha de ônibus em frente à oca, ela chama atenção para o risco de acidentes.
“O asfalto aqui em frente está rachando, é um perigo para quem tem carro. Sem contar que bem em frente ao ponto de ônibus tem um buraco grande. Ali é um perigo, há o risco de uma criança cair, um carro ou um ônibus mesmo que tá passando ali no momento cair. Nós estamos totalmente sem respostas”, disse.
A resposta do poder público
O vereador Coronel Villasanti (União Brasil), presidente da Comissão Permanente das Causas Indígenas, comenta que a comissão está focada em conseguir tanto a melhora da questão fundiária quanto da infraestrutura aos indígenas.
“A Comissão foi importante para que nós possamos ainda esse ano regularizar a questão fundiária da água funda no bairro Noroeste e lá também no Jardim Inápoles, região do Indu Brasil. Temos avançado em outras áreas, por exemplo, questão da saúde e segurança pública, com a criação dos concelhos comunitários de segurança direcionado aos indígenas com reuniões pontuais”, disse.
Criada em maio de 2023, o vereador enfatiza que a comissão está sendo importante para que, aos poucos, Campo Grande possa regularizar e reconhecer as aldeias urbanas.
“Nós temos várias aldeias que precisam dessa regularização, felizmente estamos conseguindo de duas. Em um segundo momento, vamos investir em habitação, porque eles têm muita dificuldade em ter um local adequado de moradia. E que essa habitação possa efetivamente levar em consideração a cultura indígena, que é diferente da cultura dos brancos”, falou.
“Eles têm levado essa reivindicação à comissão e entendemos que é uma das maiores. Nós temos procurado melhorar esse atendimento e esse debate, para que ele seja coletivo e efetivo”, relatou.
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