Não, este material não contém um teste que habilita o diagnóstico de uma doença que acomete uma pessoa. Vídeos com informações rasas intituladas de “faça o teste”, viralizam pelas redes sociais. Em alguns deles, testes para saber se uma pessoa tem TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade) estão espalhados em plataformas digitais sem nenhuma regulação.

Para a neurologista infantil e membro titular da Academia Brasileira de Neurologia, Rebeca Dinardi, há prós e contras na difusão desse tipo de conteúdo. Ela indica que diagnósticos de quaisquer transtornos, comportamentais ou físicos, devem sempre ser realizados por um profissional capacitado.

“A simples constatação de determinados sinais, sintomas ou tendências comportamentais em nossa vida cotidiana não se correlaciona obrigatoriamente a um diagnóstico, ou a presença de um transtorno. A ideia de que um transtorno comportamental possa ser diagnosticado pela simples presença dos sinais e/ou sintomas que o compõem, é uma perigosa inversão do método investigativo de qualquer transtorno médico e pode resultar em patologizações ou simplesmente em um diagnóstico errado. A presença de um transtorno comportamental ou mental deve, obrigatoriamente, gerar prejuízos funcionais constantes em mais de um âmbito da vida do indivíduo. Além disso, o diagnóstico correto só pode ser feito após a investigação e exclusão de outras alterações ou transtornos que possam causar sintomas e prejuízos semelhantes”.

Quer dizer que a identificação de sinais pode ser confundida com nuances comportamentais, o que pode ser característico de “costumes” da rotina ou sentimentos temporários, como, por exemplo, a raiva ou tristeza.

Ponto positivo

Entretanto, síndromes continuam sendo tabus para muitos, principalmente para gerações antigas. Um transtorno como o TDAH, por exemplo, ganha julgamentos: uma criança que possuía sinais era intitulada como “preguiçosa” nos estudos, por não se adaptar ou entender o conteúdo. Os testes, portanto, ajudam a esclarecer que se trata de uma síndrome.

“A sociedade atual se tornou extremamente intolerante a sentimentos de tristeza, frustração, desatenção, ou qualquer manifestação que se relacione potencialmente à queda de produtividade social e/ou profissional. Nosso cérebro, no entanto, precisa tanto desses sentimentos e estados emocionais para funcionar como de qualquer outro. Nossa arquitetura neuronal não foi feita para funcionar 24 horas por dia, 7 dias por semana, atenta, vígil e feliz.  Desatenção, ansiedade, tristeza e inquietude também precisam estar presentes eventualmente, sendo essenciais para o nosso equilíbrio mental”.

Contudo, a discussão acerca dos transtornos mentais é válida e bem-vinda para desmistificar o sofrimento mental, favorecendo a busca de ajuda especializada para quem sofre. Entretanto, é necessário equilíbrio na difusão de informações ou buscas simplificadas de diagnóstico.

“Ainda que haja discussão sobre a possibilidade do início dos sintomas na vida adulta, o TDAH se manifesta habitualmente nos primeiros anos de vida da criança, quando o cérebro, se bem estimulado, começa a ganhar habilidades cada vez mais complexas. A atenção é uma dessas habilidades que, como todas as outras, não vem de fábrica, é construída. Após os seis e sete anos, a maturação de sistemas cerebrais, como o córtex pré-frontal, permite que, exposto a estímulos adequados, o cérebro desenvolva a capacidade de prestar atenção e aprimora essa habilidade ao longo dos anos”.

Ambiente preparado

Nesse contexto, Dinardi reforça que a infância necessita de ambientes preparados para esses estímulos, dando notoriedade para a vida adulta, como brincar e socializar.

“Nem sempre é fácil identificar se um comportamento pode estar exagerado ou anormal para pais e cuidadores. Mas precisamos nos lembrar de que o cérebro da criança é diferente do adulto com necessidades diferentes também. Demandar habilidades ou comportamentos não compatíveis com a etapa do neurodesenvolvimento que a criança se encontra pode ser extremamente prejudicial”.

De forma geral, conforme a especialista, o mais importante é procurar um profissional para entender os eventuais sintomas e chegar a um diagnóstico. Assim, é a avaliação profissional que indicará a forma de tratamento, sempre prescrito por um médico habilitado.

“Há essencialidade em procurar um profissional para entender sintomas. A avaliação correta permite diagnóstico e tratamento adequados, além de ajudar muito pais e cuidadores a entenderem o processo de maturação cerebral e emocional das crianças”.