O termo acessibilidade sugere a inclusão de pessoas com deficiência em quesitos amplos, desde a educação ao mercado de trabalho. Porém, em Campo Grande, moradores apontam que a acessibilidade na infraestrutura se limita à área central. Nesta quarta-feira (21), é celebrado o Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência para alcance de direitos mínimos.

Ciclista amputado, Gilvan Pereira da Silva, de 39 anos, se viu em outra realidade de rotina após sofrer um acidente em 2013. Não se limita a reclamar, já que passou dias internados em risco de morte. “Em 2020, comecei a pedalar, depois que um amigo me convidou. No início era 7 km, depois foi para 20 e hoje faço tranquilamente 100 km em um dia de percursos”, afirma.

“Confesso que tem lugares que fico com medo de pedalar, ali perto da rotatória [bairro Aeroporto] tem carro que passa ‘tirando tinta’ [expressão para proximidade], não tem ciclovia. No Nova Campo Grande, onde moro, está melhor depois de recapeamento na Avenida Manoel de Costa Lima, mas nas calçadas têm muita irregularidade, tem casa que tem 1 metro de altura”, questiona.

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Gilvan durante percurso em estrada de MS (Foto: Arquivo Pessoal)

Deficiente visual e subsecretária de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência do Estado de Mato Grosso do Sul, Telma Nantes de Matos, considera que enquanto o debate se restringe apenas ao público com deficiência, a luta se limita apenas aos que brigam por direitos que são amplos e envolvem todos os moradores.

“A acessibilidade é o caminho para inclusão que as pessoas com deficiência precisam. É bom para pessoas com deficiência e excelente para as demais pessoas, por isso deve ser um compromisso de toda a sociedade. [Por exemplo] se um espaço acessível é bom para um deficiente, será bom para uma criança brincar, um idoso andar com segurança. É preciso de um debate para que as políticas públicas aconteçam, senão fica só nós implorando acessibilidade. É um ponto de reflexão muito importante”.

Quando se fala em arquitetura, vem à cabeça o piso rebaixado para cadeirantes, entretanto a questão de acessibilidade arquitetônica se amplia para avisos sonoros, piso tátil, calçadas adequadas. A arquitetura acessível observa o desenho universal que é bom para todas as pessoas.

“O Dia foi criado em um momento onde pessoas estavam reivindicando arduamente por legislações que atendessem as necessidades. Hoje vivemos um momento diferente, reivindicamos políticas públicas para as pessoas com deficiência, para que esteja em todos os estados, municípios e cheguem até as pessoas”.

Mercado de trabalho

Comparado ao ano passado, as vagas de trabalho oferecidas exclusivamente para pessoas com deficiência aumentaram 42%. De janeiro a agosto, foram de 7.091 para 10.137, em 33 cidades. Distribuídas entre 1.310 para deficientes auditivos, 6.789 físicos, 370 visual, 1.668 múltipla. Janeiro foi o mês que mais empregou, totalizando 1.370 vagas no ano passado e 1.550 este ano.

Paula Teodoro, de 33 anos, é advogada e atua há 10 anos, está estudando para magistratura estadual. Ela é cadeirante, portadora de uma patologia congênita rara chamada osteogenese imperfeita. Costuma viajar pelo país e enfrenta grandes certames, mas avalia as situações desagradáveis como qualquer outra pessoa e acredita que existem milhares de experiências positivas de pessoas com deficiência tendo uma vida normal no mercado de trabalho.

Paula cadeirante
Paula atua na advocacia há 10 anos (Foto: Arquivo Pessoal)

“Por incrível que pareça, eu nunca passei por situação de preconceito no meu ambiente de trabalho. Ocorre diariamente e não somente no ambiente de trabalho, é que nós sejamos cadeirantes ou não, qualquer situação que fuja do ‘padrão’ desperta curiosidade nas pessoas. É importante sabermos nos blindar dos olhares sejam de curiosidade, sejam de admiração [ou de] piedade, e também saber lidar com o despreparo e a falta de informação, muitas pessoas não sabem como lidar”.

Sobre a acessibilidade nos ambientes de trabalho, argumenta que a maioria dos locais que frequenta proporciona um meio acessível, pois, são órgãos públicos, embora não muitas vezes devidamente adequados.

“O fato é que, embora seja necessário e garantido por lei, é utópico esperar que tudo esteja totalmente acessível para que se enfrente o mercado de trabalho. Independente das lutas de cada um, não esperem o mercado de trabalho estar totalmente acessível, vão em busca de oportunidades, acreditam o mundo existe muitas pessoas boas e dispostas a nos ajudar com os obstáculos cotidianos”.

Turismo

Gyselle Saddi, presidente do Instituto Pestalozzi, ressalta que Campo Grande, assim como a maior parte das capitais brasileiras, ainda possui incontáveis barreiras para o pleno exercício da cidadania da pessoa com deficiência, tanto ambientais, arquitetônicas como atitudinais.

“Temos uma demanda reprimida muito importante, em especial no tocante à reabilitação de pessoas com deficiência neuromotora. Filas de espera para atendimentos de fonoaudiologia, psicologia, dentre outros, são comuns e prejudicam muito o desenvolvimento dos pacientes, que necessitam aguardar meses por um atendimento”.

Outras pautas limitam o acesso às experiências, como o turismo. Para Gyselle, o turismo adaptado necessita urgentemente de atenção. “Além da necessária ampliação dos recursos nos orçamentos públicos com enfoque em novas oportunidades para empreendimentos de pessoas com deficiência. São raras as oportunidades de crédito específico para o empreendedorismo para PcD”.