Assim como a 14 de Julho, ‘Rua Barão’ já foi menina dos olhos do Centro
Trecho da via era conhecido como Calçadão e foi construído a partir de um projeto assinado pelo arquiteto curitibano Jaime Lerner, em 1979, como parte de uma série de intervenções que dariam a Campo Grande “cara de capital” que lhe faltava na ocasião da criação de Mato Grosso do Sul, há 40 anos.
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A Avenida Afonso Pena é possivelmente o endereço mais famoso de Campo Grande. Porém, uma quadra acima, está a aquela que é considerada o primeiro corredor cultural e comercial de Campo Grande, a Rua Barão do Rio Branco.
Diferentemente de suas vizinhas, a Barão é a única rua do perímetro central histórico que tem o mesmo nome desde sua projeção, em 1909, segundo apontou o escritor Paulo Coelho Machado no livro ‘Pelas Ruas de Campo Grande’. E pasme! Muito antes do projeto que pretende adaptar a Rua 14 de Julho para pedestres, a via era a verdadeira menina dos olhos do centro da cidade.
Já notou que no trecho compreendido entre a Avenida Calógeras e a Rua 13 de Maio, bem no coração do centro da cidade, as calçadas da Rua Barão do Rio Branco são mais largas? Não é a toa. A Rua tinha espaço privilegiado para pedestres porque foi pensada para ser um espaço de convivência, tal qual como pretende-se na Rua 14 de Julho.
“Nos anos 90, mesmo, ir ao Calçadão da Rua Barão era um passeio de família. Eu juntava as crianças e a gente ia para lá. Tinha dança, música, teatro, capoeira, tudo no calçadão”, conta a historiadora Maria Madalena Dib Mereb Greco, do IHGMS (Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul).
De fato, são comuns os relatos da Barão como um espaço cultural da cidade, na época em que Campo Grande era bem menor e tinha menos opções de lazer. O local era conhecido como “Calçadão” e foi construído a partir de um projeto assinado pelo célebre arquiteto curitibano Jaime Lerner, em 1979, como parte de uma série de intervenções que dariam a Campo Grande “cara de capital” que lhe faltava na ocasião da criação de Mato Grosso do Sul, há 40 anos.
A ideia era justamente oferecer área de circulação e lazer aos pedestres em detrimento dos veículos. Além das calçadas largas e iluminação chique, a via também ganhou uma passarela e escadaria que cruzava a Avenida Noroeste, por onde passavam os trilhos do trem.
“Mas, com o tempo ali foi se tornando um lugar que não se andava. Na década de 90 já era um ponto de delinquência, só foi resolver quando demoliram”, conta Maria Madalena. A demolição, no caso, ocorreu quando os trilhos foram retirados em 1999, durante a gestão do então prefeito André Puccinelli.
O primeiro corredor
Três ex-governadores do Mato Grosso “uno” e um do atual Mato Grosso do Sul tiveram moradia na Barão: Nicolau Fragelli, Fernando Correia da Costa, Arnaldo Estevão de Figueiredo e Wilson Barbosa Martins. Era um lugar chique de se morar, por assim dizer. Até hoje, ainda há alguns palacetes, mais para perto da Rua Rui Barbosa. Só que o perfil residencial da via mudou com o passar do tempo.
Isso se explica porque era a partir da Barão que se fazia a conexão entre os setores econômicos da cidade e o terminal de transbordo, inaugurado em 1976 – a rodoviária antiga de Campo Grande, que também fica na mesma rua.
“Historicamente, essa conexão entre a rodoviária antiga e a Prefeitura proporcionou o surgimento de muitos comércios, mas também de equipamentos culturais. Só de praças são três, a Praça Aquidauana, a Praça do Rádio Clube e a Praça Belmar Fidalgo”, aponta o escritor Américo Calheiros, autor do livro Campo Grande Aquarela de Luz.
Zona cinzenta e cafezinho
Não é de hoje que o entorno da rodoviária é considerado problemático. Relatos apontam que o trecho da Rua Barão do Rio Branco que partia da rodoviária antiga até a Avenida Calógeras era frequentado por criminosos. O problema da insegurança na região, portanto, foi amenizado com intervenções urbanísticas.
Na passarela que ficava sobre a Noroeste, a propósito, camelôs comercializavam produtos trazidos do Paraguai, no período em que importações eram proibidas.
“Era um ponto de venda de muamba e muitos desavisados eram assaltados por aquela região. Isso só resolveu com a demolição [da passarela], mesmo. Os camelôs foram para onde hoje é o camelódromo e a região melhorou bastante”, conta o aposentado Carlos Alberto Muniz, 76, frequentador da região central. “Aqui mesmo nessa área a gente não passava de carro, era fechada. Dava muito marginal, a gente sabia até de ‘desova’ de corpo no córrego”, completa.
Apesar do lado obscuro, uma quadra acima do ponto “perigoso” da rua, fica uma das célebres referências da Barão, que até hoje faz um dos cafés famosos da cidade. Com muita simplicidade, o Bar do Zé era ponto de encontro de fazendeiros e políticos, justamente por estar nesse corredor.
“A importância do bar era pelos frequentadores. A gente ouvia dizer que acordos, negociações, coisas do tipo tinham sido fechadas lá. Mas, para quem quiser um cafezinho bom, ainda vale a pena visitar o local. Dá para saber muito da história da cidade sentando ali”, aponta Calheiros. “De uma forma ou de outra, havia manifestações políticas por ali”, conclui.
Falando em manifestações políticas, foi em frente ao Bar do Zé, por sinal, que ocorreu um episódio tenso da história da rua quando, em novembro de 2005, o ambientalista Francisco Ancelmo de Barros, mais conhecido como Francelmo, ateou fogo no próprio corpo para denunciar crimes ambientais na região do Pantanal. Em homenagem ao ambientalista, o local ganhou um pequeno memorial criado pelo arquiteto Gil Carlos de Camillo, com uma maquete do Pantanal.
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