Acadêmicos afirmam que dividiram comissões para cuidar do local

O movimento dos estudantes que ocuparam o maior câmpus da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) em , distante cerca de 338 quilômetros de Campo Grande, começou pequeno e autônomo, conforme explicaram os acadêmicos. Agora, no entanto, já reúne apoiadores e desenvolve uma estrutura que organiza atividades de manutenção do local. É o que explica a acadêmica de história Thais Lima, 22, que participa da ocupação. Os estudantes buscam pressionar o governo contra a PEC 55 – que passou pela Câmara como -, e a MP (Medida Provisória) que reformou o Ensino Médio.

O início da ocupação, no domingo, aconteceu de forma espontânea, e dividiu opiniões dentro do movimento estudantil. “Ontem [3] a gente fez uma conversa aberta de como procedeu uma ocupação. Desde o final de outubro o movimento já vinha pensando em fazer uma assembleia pra conversarmos com os acadêmicos sobre o que eles achavam. No dia 2 nós fomos informados de que um grupo autônomo tinha ocupado a Universidade então todo o pessoal do movimento estudantil foi pro câmpus, fecharam todos os portões”, conta

“A notícia espalhou muito rápido, já tinha gente perguntando se precisaria de alimentos, dois advogados se disponibilizaram caso precisássemos de resposta jurídica, foi uma comoção muito rápida, acho que ninguém estava esperando”, explica a estudante. Thais explicou que os acadêmicos fecharam os portões do câmpus II, mas outros estudantes retiraram o bloqueio e a ocupação foi transferida, temporariamente, para o bloco dos cursos de História e Geografia.

 
“Negociamos com a direção e professores, sobre a rematrícula. Os acadêmicos não são nossos inimigos, não são os alvos do nosso movimento, eu acho que em questão de calendário, pouco vai alterar, a PEC vai ser votada no dia 18, 19, vão ser duas semanas de ocupação, a reitoria já fez um calendário que não tem a ver, ao invés de terem colocado 15, 20 dias de férias, colocaram férias de 45 dias, então, o que são mais duas semanas?”, explicou Thais. De acordo com ela, a ocupação acaba quando a matéria for votada no Senado.

Comissões

“A Universidade é nosso patrimônio”, declara Thais. A acadêmica de história, pontua que, por entender dessa forma, o movimento organizou-se em comissões, que se dividem em atividades, como limpeza, manutenção e comunicação. Palestras e debates movimentam a rotina dos acadêmicos e no sábado (5), durante a noite, realizam um Sarau. O “coletivo” chamou a atenção de apoiodores, como os secundaristas. Cerca de 100 alunos do ensino médio e fundamental participaram dos debates. Já são 60 acadêmicos dormindo no câmpus.

 

 

 

Mas também atraiu dissidentes. “A gente começou a fazer roda de debates, aí começou os ataques, as professoras foram denunciadas pro conselho tutelar, a gente também começou a ser taxado como ‘proliferadores de discurso político radical'. Me emocionei, porque ontem foi um dia muito difícil, tivemos o corte do portão, derrubaram a barricada e agrediram uma das nossas apoiadoras”,contou Thais.

As agressões, de acordo com ela, tiveram até um episódio de injúria racial. “Ela, inclusive, foi chamada de macaca por um homem quando derrubaram a barricada. Aí a gente falou: o campus já não vai dar pra segurar, aí fomos ocupar o bloco de geografia e história, mas é provisório”.

Ainda assim, conforme explicou, a solidariedade também marca a ocupação. “Muito se fala e pouco se explica [sobre a PEC 55 e a MP do ensino médio], a informação é a forma mais eficiente de trazer pessoas pro nosso lado. Durante o dia todo conseguimos muita aderência, essa noite já foram 60 alunos. Então, pra uma movimentação há menos de 72h, já conseguimos bastante aderência”, comenta a estudante.

A direção do câmpus explicou que negocia com o movimento, mas se posiciona de forma “contrária” à ocupação. “A direção é contrária à forma de ocupação, é favorável à causa, mas não à ocupação do jeito que foi feita. Agora, estamos com uma comissão que foi instituída depois de assembleia do conselho e essa comuissão faz as negociações com eles. Em troca de dois banheiros pra tomarem banho, eles liberaram a entrada dos professores e do pessoal da matrícula. A Universidade está funcionando só nos serviços essenciais”, afirmou Ines Francisca Neves Silva, diretora em exercício.

PEC 55 e MP do Ensino Médio

O governo federal pretende aprovar um projeto de ajuste fiscal – que já teve a votação aprovada na Câmara dos deputados – a PEC 55 – que pretende congelar gastos em áreas como a Saúde e Educação por 20 anos. De acordo com o texto do projeto, os orçamentos para essas áreas seriam aprovados nos valores relativos ao ano anterior, apenas corrigindo a inflação. A matéria deve ser votada pela CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) do Senado no dia 9.

Na prática, ela acaba com a obrigatoriedade, prevista na Constituição de 1988 , de que a União aplique 18% de sua receita líquida de impostos (o total de impostos arrecadados já descontadas as transferências que a União faz para Estados e municípios) na educação. A desvinculação dessa obrigatoriedade passa a valer, caso a PEC seja aprovada, no Orçamento de 2018.

 

Alunos participam de debates nas salas de aula (divulgação)

 

A ‘Reforma no ensino médio' é uma Medida Provisória (MP) do Executivo Federal que propõe alterações no currículo escolar, ampliação da carga horária dos alunos para até 1.400 horas anuais (hoje são 800 horas), e a possibilidade de inserir o ensino técnico já no ensino médio.

Outra mudança é o fim da obrigação atual de estudar 13 disciplinas por três anos. Elas seriam obrigatórias pelo prazo de um ano e meio e depois, seriam optativas, segundo o interesse do aluno. Assim, se aprovado o projeto, um aluno de escola pública deixaria de ter a obrigação de fazer cursos de Artes e Educação Física, por exemplo, depois de um ano e meio de curso. Cai, ainda, a obrigatoriedade do espanhol no currículo. Há, dúvidas, ainda, se Sociologia e Filosofia deixariam de ser obrigatórios da metade do curso para o final.

“A gente está tentando passar para as pessoas que ela é inconstitucional [PEC 55], ela retira muitos direitos conquistados nos últimos anos, é um retrocesso, é retroceder aos anos 90 ou até antes disso. Eu me movimento muito, também, pela reforma do ensino médio, não necessitar de uma formação didática, uma formação em licencitura pra exercer o papel de professor,é voltar àqueles aulões de ginásio pra aprender o básico, entrarem no mercado e não quesitonarem. Esse congelamento [da PEC] vai sucatear a educação e a saúde pública. Porque eles jogam a conta pra classe trabalhadora e não tiraram dos deputados, do senado? Uma semana depois de conseguirem aprovar na Câmara, eles conseguiram aumento salarial novamente. É eles recebendo mais no bolso e a gente pagando a conta”, afirma Thais.