Autoridades brasileiras confirmaram a chegada de novas drogas ao país, entre elas um opioide sintético da família dos nitazenos, capaz de ser até 25 vezes mais potente que o fentanil e provocar parada respiratória quase imediata.
O risco da nova droga ficou evidente em um acaso clínico registrado em Campinas (SP). Em julho, um paciente apresentou sonolência e rebaixamento de consciência após ingerir álcool e um comprimido não identificado. O exame feito pelo laboratório da Unicamp confirmou a presença de N-pirrolidino protonitazeno, considerado até 25 vezes mais potente que o fentanil.
Hospitalizado, o homem só sobreviveu após receber três doses de naxolona, um antídoto usado em intoxicação por opioides. O uso repetido do medicamento já indicava a gravidade do quadro. A análise também revelou no organismo traços de MDA (derivado do ecstasy), catinonas sintéticas, álcool e nicotina.
Duas novas substâncias também foram identificadas em balas industrializadas. A Polícia Científica de Santa Catarina, com apoio da Polícia Federal, analisou em junho as Magic Mushroom Gummies, importadas da empresa TRE House e vendidas como “cogumelo mágico”. O exame revelou as triptaminas sintéticas 4-HO-DET e 4-AcO-DET, já notificados em países como Chile, Canadá e Bélgica, mas nunca antes registras oficialmente no Brasil.
Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) reagiu com atualização regulatória para tentar frear a circulação dessas substâncias. A agência incluiu rapidamente as três drogas na Lista F2 de substâncias proibidas. N o caso do nitazeno, a decisão saiu 19 dias após a notificação; para as duas triptaminas, o prazo foi de 56 dias.
As descobertas constam do relatório semestral da Senad (Secretaria de Politicas sobre Drogas e Gestão de Ativos), publicado em agosto. Produzido pelo SAR (Sistema de Alerta Rápido), rede criada pelo Ministério da Justiça, o documento reúne registros feitos entre 21 de fevereiro e 31 de julho e detalha a atuação para monitorar o mercado ilícito, confirmar resultados em laboratórios de referência e repassar informações a hospitais, secretarias de saúde e forças de segurança.
Nitazeno pode matar
O nitazeno identificado no Brasil, o N-pirrolidino protonitazeno, é um opioide sintético sem uso médico aprovado e produzido apenas em laboratório. Segundo o professor doutor Mauricio Yonamine, do Departamento de Análises Clíncias e Toxicolóicas da FCF-USP (Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo), ele é muito mais potente do que opioides conhecidos, como morfina, heroína e fentanil. “O N-pirrolidino protonitazeno é cerca de 25 vezes mais potente que o fentanil, que por sua veze é 50 vezes mais forte que heroína”, explica.
A depressão respiratória é o principal risco. “Uma dose mínima pode levar rapidamente à morte por asfixia”, afirma Yonamine. O caso registrado em Campinas ilustra o perigo: o paciente só resistiu porque recebeu três doses de naloxona.
O perigo aumenta porque usuários podem consumir sem saber. “O usuário acredita que está consumindo uma droga conhecida, mas recebe junto um opioide de altíssima potência. Isso multiplica os riscos de overdose fatal”, diz professor.
Balas de cogumelo enganam usuários
As duas outras substâncias encontradas são triptaminas sintéticas ligadas à psilocibina. Elas apareceram nas Magic Mushroom Gummies, balas vendidas como uma versão industrial dos “cogumelos mágicos”. A psilocibina é o princípio ativo natural de alguns cogumelos, mas, nesse caso, o exame revelou versões sintéticas até então desconhecidas. Segundo Yonamine, embora tenham menos chances de provocar overdose fatal, podem causar “efeitos imprevisíveis e intensos, incluindo alucinações, ansiedade e paranoias”.
O formato industrializado aumenta o risco de consumo desavisado. “O fato de o produto ter aparência de industrializado cria uma falsa sensação de segurança”, diz Yonamine. Para ele, a apresentação em forma de balas pode induzir a ingestão de doses mais altas e até facilitar o acesso de crianças.
Uso terapêutico
Pesquisas recentes avaliam psicodélicos como possíveis aliados contra depressão e ansiedade. Em todo o mundo, universidades investigam substâncias como a psilocibina, o MDMA (3,4- metilenodioximetanfetamina, popularmente conhecido como ecstasy) e até cetamina em protocolos clínicos rigorosos, com pacientes monitorados, doses controladas e acompanhamento médico.
As triptaminas achadas no Brasil não fazem parte desses estudos. “Especificamente sobre essas duas triptaminas, nunca foram realizados ensaios clínicos para se avaliar potencial terapêutico”, diz Yonamine.
A diferença entre pesquisa e mercado ilícito é fundamental. “Nos testes clínicos, todos os procedimentos são monitorados e os pacientes são assistidos por profissionais da saúde. No mercado ilícito, não há qualquer controle de dosagem e pureza; pelo contrário, frequentemente drogas são misturadas com outras substâncias ativas, aumentando o risco de intoxicação”, afirma o professor.
O que deve ser feito agora
Hospitais e serviços de emergência precisam estar preparados para lidar com novas drogas. Segundo professor Yonamine, a prioridade é a capacitação das equipes de saúde para reconhecer sinais e sintomas associadas às novas substâncias psicoativas e aplicar tratamento adequado.
Para o professor, também é necessário adotar medidas a longo prazo, como o monitoramento constante do mercado ilícito e a rápida divulgação de informações técnicas, objetivas e centrais do Sistema de Alerta Rápido.
*Reportagem do portal UOL
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