Documentário traz sonhos e desafios dos jovens do ensino médio público

Angústias em relação ao futuro

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Angústias em relação ao futuro

Estreia em 8 de junho o documentário Nunca me Sonharam, que apresenta um panorama do ensino médio nas escolas públicas do Brasil por meio de depoimentos de jovens estudantes, professores e especialistas em educação. Percorrendo as cinco regiões do país, o filme é capaz de aproximar o público dessa realidade de forma intensa, mostrando a grandeza dos sonhos de cada jovem, suas angústias em relação ao futuro e a complexidade de educar diante de tantas adversidades que é imposta aos professores.Documentário traz sonhos e desafios dos jovens do ensino médio público

A partir da iniciativa do Instituto Unibanco, que desenvolve um projeto de gestão em mais de 2,5 mil escolas públicas do Brasil, o filme foi construído durante dois anos e teve direção de Cacau Rhoden. “Sou grato pela oportunidade de mergulhar neste país e ouvir esses meninos que têm tanto para falar e nos ensinaram muito. Foi um trabalho muito coletivo de exercitar a escuta e colocar esse assunto na mesa de jantar, na mesa do bar, em outros âmbitos, transcendendo os muros da escola”, disse.

Do interior do Ceará, da cidade de Nova Olinda, veio a fala do estudante Felipe Lima que dá nome ao documentário. Ele conta que seus pais acreditavam que só filho de rico entrava na universidade. “Para eles, o máximo era terminar o ensino médio e arrumar um emprego. Trabalhador de roça, vendedor, alguma coisa desse tipo. Acho que nunca me sonharam sendo um psicólogo, nunca me sonharam sendo professor, nunca me sonharam sendo um médico, não me sonharam. Eles não sonhavam e nunca me ensinaram a sonhar. Estou aprendendo a sonhar”, disse no filme.

Em entrevista à Agência Brasil, Felipe disse que o documentário é um legado que pode servir de inspiração para vários jovens. No fim do ano passado, ele formou-se no ensino médio e hoje cursa Gestão de Recursos Humanos por meio de bolsa integral do Programa Universidade para Todos (Prouni), do governo federal. “Para mim, chegar até aqui já tem sido uma imensa vitória. O que eu penso, a partir de agora, é que o céu é o limite. Para quem sonha, não tem limites, você não para, você está em constante transformação, em constante busca pelo conhecimento”, declarou.

“Hoje os jovens talvez estejam meio ofuscados nessa turbulência toda, nessa escuridão que o país está vivendo, mas é necessário, é muito importante os jovens acreditarem nesse poder transformador da educação. A educação, por mais que esteja em um caos, não deve ser vista como um problema e sim como uma solução para todas as mazelas sociais”, acrescentou o jovem.

Direito à educação

Referindo-se diversas vezes ao valor da educação como um direito fundamental, o filme apresenta depoimentos como os do professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) Gersem Baniwa. Para ele, a educação é uma ferramenta fundamental de libertação e o ensino médio é um rito de passagem (para os jovens).

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 82% das crianças e jovens até 19 anos que estão estudando são atendidos pela escola pública. No entanto, há ainda 1,6 milhão de adolescentes de 15 a 17 anos fora da escola. Para o superintendente executivo do Instituto Unibanco, Ricardo Henriques, o filme coloca de forma explícita o desafio das políticas públicas no Brasil de assumirem a responsabilidade de “sonhar seus jovens”.

“Sonhar seus jovens hoje implica ter uma visão sistêmica de estruturação de toda a agenda política em torno da garantia do direito de aprendizagem da juventude, recolocar o jovem como elemento central do desafio do ensino médio público e instituir procedimentos da esfera do governo federal e do estadual que cheguem até a sala de aula, que estejam o tempo todo, de forma recorrente, atentos à garantia do direito de os jovens ficarem na escola, não abandonarem, e aprenderem o necessário”, explicou Henriques.

Para ele, a motivação do filme é provocar um debate em torno dos caminhos possíveis, não de uma solução única, para construir modos de garantir a aprendizagem dos jovens na escola pública. “A criação do filme, a busca dos personagens, a identificação de situações-problema, de gargalos a serem resolvidos e dos personagens a serem entrevistados foram todos em cima de escolas [públicas] que são do Jovem de Futuro [projeto de gestão escolar do instituto]”, acrescentou.

Presidente

Estudante formada na escola estadual Professor José de Souza Marques, no Rio de Janeiro, Thaianne de Souza Santos, de 18 anos, e que hoje cursa Administração na Faculdade Souza Marques com bolsa integral, sonha em ser presidente. “Eu sonho em ser professora e posteriormente em ser presidente. Interessante é sonhar e mais interessante ainda é motivar alguém a sonhar”, disse à Agência Brasil.

Segundo ela, o documentário trouxe uma realidade interessante. “Coisas que aconteceram, por exemplo, no Ceará, são coisas que eu sei da minha realidade no Rio de Janeiro. Eu chorei o filme todo porque eu vivi parte daquilo e porque eu conheço pessoas que viveram parte daquilo. Não é uma coisa isolada, é a realidade”, declarou.

“E não é todo dia que acontece um filme que mostra a realidade. A gente vê comercial na televisão que não mostra a realidade, a gente vê propaganda do governo que não mostra a realidade, que dá impressão para o jovem que o poder está na nossa mão, que a gente está decidindo, mas, na verdade, a gente não está decidindo. Já foi decidido, e a gente está assistindo a todas essas decisões”, comentou a estudante.

Diversidade

A antropóloga Regina Novaes avaliou o documentário de forma positiva, citando a abrangência regional e a diversidade de debates produzidos, incluindo jovens e professores. Para ela, a discussão possibilita denunciar o que é ruim e reconhecer o que está funcionando bem. “Os alunos são sensacionais porque eles colocam críticas à escola, percebem o que não está bom, mas, ao mesmo tempo, percebem o que a escola dá de oportunidade para eles mudarem o sentido dela”, disse.

A especialista considera a democratização da escola pública como um avanço. “No passado, a escola pública era para poucos e só refletia a elite da sociedade que a frequentava. A maioria dos jovens estava no mercado de trabalho, de uma maneira precoce e precarizada”, explicou.

Para Regina, o filme é um instrumento importante de discussão no momento atual. “Ele [o documentário] mostra que, justamente quanto mais se tem a possibilidade de os alunos discutirem, mais eles vão aprender. Eles [produtores do filme] dizem isso de uma maneira brilhante. Ser acolhido na escola faz você aprender melhor as coisas. O filme é uma vacina nesse momento que estamos vivendo, nesse momento de retrocesso, de generalização, de crítica. Ele vai ajudar a pensar os processos em curso, o que tem que melhorar, sem dúvida nenhuma, mas o que não volta para trás mais”, finalizou.

A partir de 8 de junho, o documentário estará em cartaz no Espaço Itaú de Cinema de São Paulo e do Rio de Janeiro, além de ficar disponível gratuitamente no link: http://www.videocamp.com/pt/movies/nuncamesonharam. Enquanto isso, o público pode assistir ao trailer na mesma página.

 

 

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