Fiems quer posse de imóvel de R$ 6 milhões após ‘barganhar’ com terrenos doados
Ação na Justiça revela manobra na legislação que passou área para entidade dos industriais comandada por Sérgio Longen
Gabriel Maymone –
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A Fiems (Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul) tenta manobra na Justiça para conseguir tomar posse de área de R$ 6.184.638,00 que ganhou do município de Três Lagoas – a 326 km de Campo Grande. Ação popular pede que o imóvel seja revertido ao município, uma vez que foi doado exclusivamente para a manutenção de escola do Sesi (Serviço Social da Indústria) como benefício à população. Porém, a construção está abandonada desde 2016.
Para conseguir de vez a posse do imóvel, o Sesi alega à Justiça que não recebeu a área como doação, mas sim por permuta. Assim, afirma que trocou duas áreas de 3 mil metros quadrados pela área de 10 mil metros quadrados, avaliada em R$ 6,1 milhões.
No entanto, conforme as próprias matrículas dos imóveis anexados aos autos do processo, as duas áreas que o Sesi alega que permutou com o município também foram ‘ganhadas’.
Conforme os documentos, em 1966, o município transferiu a posse desses dois terrenos menores – às margens da lagoa – ao Sesi por aforamento. Isso significa que o Sesi ganhou, em caráter perpétuo, o domínio útil, a posse direta, o uso, o gozo e o direito de disposição sobre o imóvel.
A justificativa era de que a Fiems, através do Sesi, construiria lá a escola. No entanto, dois anos depois, sem utilizar as áreas, a entidade as utilizou como ‘barganha’ para trocá-las por uma área maior e localizada em região mais valorizada da cidade, na região central. A negociação afirma que as duas áreas menores às margens da lagoa possuem mesmo valor da área 4 mil metros maior e localizada em região central.
Procurada pela reportagem para explicar a doação dos dois terrenos e a permuta com a Fiems, a assessoria de comunicação do município respondeu. “Em contato com a Procuradoria Jurídica do Município, foi informado que a manifestação sobre esse assunto foi apresentada no processo e agora cabe à Justiça decidir sobre a controvérsia”.
A Fiems também foi procurada pela reportagem, mas não respondeu ao e-mail, enviado para endereços oficiais da assessoria de comunicação e devidamente documentados no dia 29 de julho. Porém, o espaço segue aberto para posicionamento.
Vereador diz que Sesi esconde informações
O autor da ação é o médico Paulo Carlos Veron da Motta – que também exerce cargo de vereador pelo PL no município.
À reportagem do Jornal Midiamax, Veron afirma que recebeu com estranheza as informações apresentadas pela Fiems através do Sesi na ação. “Não comentam que a área à beira da lagoa [recebida em 1966] foi doada, era para construir [a escola] e não poderia ser permutada, nem vendida e nem alugara. Estão escondendo”.
Ainda conforme o vereador, dois meses antes de vencer o prazo que o Sesi havia se comprometido para construir a escola, houve uma mudança na lei e, logo em seguida, ocorreu a permuta.
“Mudaram a lei um mês e pouco depois já prevendo que ia acontecer isso no futuro. Então, aquelas duas áreas doadas não poderia permutar, mas em abril de 68 mudaram a lei, foi quando fizeram a permuta”, pontuou.
Município se contradiz ao barrar venda, mas defender posse
Contestação apresentada pela procuradoria-jurídica do município sustenta que houve uma permuta e não doação, portanto, não haveria como fazer a reintegração de posse do imóvel.
“Evidencia que a Municipalidade não dispôs de bem sem contrapartida, o significa que a propriedade do bem pelo SESI é definitiva, e que não se aplicando ao caso a cláusula reversibilidade”.
Apesar de afirmar que a área é ‘definitiva propriedade do Sesi’, o município, em 2015, notificou a entidade a suspender a venda da área.
Por fim, o município alega que a área terá destinação social de interesse comum da cidade, baseando-se em projeto que está há 8 anos em ‘fase de estudos’ pelo Sesi.
Município denunciado por ‘esconder’ informações
Em pedido protocolado na Justiça, Veron pediu que o MPMS (Ministério Público de MS) abra procedimento para investigar o município por crime de improbidade administrativa.
Conforme o autor do pedido, ele questionou o município sobre os imóveis. No entanto, em 6 de julho deste ano, recebeu ofício da prefeitura alegando que não iria responder pedidos de informações feitos por ele por meio da Lei de Acesso à Informação.
A juíza Aline Beatriz de Oliveira Lacerda ainda vai analisar o pedido, bem como as manifestações das partes para tomar decisão em relação ao caso.
Fiems tentou vender imóvel de R$ 6 milhões que ganhou
O imóvel que recebeu em 1968 pela prefeitura e que abrigava a escola do Sesi está abandonado desde 2016, quando a entidade transferiu a unidade para um novo prédio.
Nesse intervalo, a Fiems tentou vender, em 2018, o prédio que fica em área de 10 mil metros quadrados, avaliado em R$ 6,1 milhões.
A Fiems mudou a escola do Sesi de endereço e tentou lucrar com a venda do prédio, que foi construído como contrapartida por ter recebido a cessão da área.
Após não ter mais utilidade, a Fiems decidiu abandonar o imóvel. Na época do leilão, o então prefeito Ângelo Guerreiro tentou negociar uma destinação para o imóvel, cogitando até utilizá-lo para a sede da prefeitura. Porém, a Fiems recusou todas as tentativas de negociação.
Projeto que não sai do papel
Por outro lado, o Sesi afirma que há intenção de instalar novo projeto no local. “SESI/MS conduz estudos mercadológicos com o objetivo de atender às necessidades dos trabalhadores da indústria e seus dependentes, tendo como premissa a otimização dos espaços disponíveis. Como resultado dessas análises, está em desenvolvimento um projeto para a utilização do imóvel situado na Avenida Dr. Eloy de M. Chaves, 1.060, no município de Três Lagoas/MS, voltado para atender os dependentes da indústria. Este projeto inclui a implementação de uma creche e um espaço destinado a treinamentos e capacitações dos trabalhadores da indústria”, afirmou.
No entanto, apesar de o imóvel estar sem utilização há 8 anos, o projeto, segundo o próprio Sesi, encontra-se ainda em fase de estudos.
CGU dá ‘bronca’ por Fiems manter imóvel ocioso
Dada a natureza jurídica do Sesi, que tem como objetivo prestar um serviço social e não gerar lucros, o fato de possuir um imóvel parado é alvo de recomendação da CGU (Controladoria-Geral da União).
Apesar de informar à controladoria sobre possível nova destinação do imóvel, a CGU manteve a recomendação para que o Sesi ‘dê um jeito’ nos imóveis parados. Isso significa que a entidade precisa utilizá-los com destinação social ou, então, se desfazer deles.
Fiems ‘ganhou’ nova área em Três Lagoas
Ainda em 2011, enquanto a atual escola estava em funcionamento, a Fiems recebeu doação do município de Três Lagoas de outra área para sua nova escola. Dessa vez, com área total de 60 mil metros quadrados – equivalente a 6 campos de futebol.
Entretanto, na reunião que envolveu a cúpula da Fiems e a administração municipal de Três Lagoas, bem como representantes do Estado, não definiu a destinação da antiga área.
Enquanto isso, o processo que pode definir o destino da área segue na Justiça.
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