Parceria milionária para internet de alta velocidade em MS é questionada na Justiça
Associação questiona PPP para contratação de rede de internet de alta velocidade por R$ 2,29 milhões ao mês
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Anunciado pelo Governo do Estado como capaz de dar agilidade a vários serviços e processos virtuais, a PPP (Parceria Público-Privada) da Infovia Digital é contestada judicialmente.
Entre os motivos para tanto, está, curiosamente, a acusação de que Mato Grosso do Sul estará adquirindo, ao custo de R$ 2,29 milhões ao mês por 30 anos, um projeto que já pode ser considerado obsoleto.
A Infovia Digital foi leiloada na quinta-feira (17) na B3, a Bolsa de Valores de São Paulo, sendo arrematada pelo Consórcio Sonda, de origem chilena e com atuação nos EUA e em países da América do Sul. Pelo acordo, os vencedores devem investir R$ 887 milhões no Estado, sendo R$ 306 milhões para implantação da rede de fibra óptica de alta velocidade e outros R$ 581 milhões para sua manutenção e operação.
A PPP envolve a concessão administrativa da rede de dados, que deve estar operante em até 24 meses após a assinatura do contrato.
Serão 6.950 km de rede de fibra óptica — quase a distância linear de Campo Grande à Cidade do México — com backbones de núcleo e de distribuição e a instalação de 1.634 PAGs (Pontos de Acesso do Governo) com diferentes velocidades: a maioria (1.450) terá 30Mbps (30 megabits por segundo), mesma capacidade dos 153 PAGs considerados “reserva”.
Há, ainda, 30 PAGs com 10 Gbps (gigabits por segundo, sendo 1 gigabit equivalente a 1.000 Mbps) e 1 PAG com 130 Gbps de velocidade. A licitação ainda inclui 15 mil ramais de uso do Governo do Estado, 129 pontos de acesso público via wi-fi em praças públicas e 28 câmeras de reconhecimento óptico de caracteres.
Projeto grande, mas defasado
Contudo, a concorrência 1/2021 foi alvo de contestação da Apims (Associação dos Provedores de Internet de Mato Grosso do Sul) tanto no Judiciário Estadual como no TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado).
“Depois de muitas conversas e debates, percebemos que a maneira com que o projeto estava sendo apresentado não seguia alguns parâmetros legais que favoreciam o setor e a população”, destacou a Apims em nota, para justificar a contestação à PPP. Algumas irregularidades foram encontradas em relação principalmente a preço, demanda, infraestrutura e viabilidade.
A associação argumenta que a previsão de contrapartida na licitação era de R$ 4,9 milhões mensais, mas o certame fechou bem abaixo disso. “Somente a empresa que fechou o projeto cobrou R$ 2,8 milhões”, destacou.
Entre os pontos contestados pela associação na Corte de Contas estão: a falta de uma justificativa sólida para a formação da PPP; deficiência em relação a estudos técnicos sobre o preço a ser pago pelo Governo do Estado e a qualidade dos serviços; e a obsoleta qualidade e quantidade da velocidade mínima de conexão prevista no edital — além da falta de estudos sobre a demanda de internet em cada PAG —; faltando, ainda, dados técnicos sobre equipamentos e tecnologias na infraestrutura da rede.
“O estudo elaborado pela denunciada [a Secretaria de Estado de Fazenda] foi entregue em 2017, o qual, segundo o denunciante [Apims], se encontra defasado com a realidade atual, bem como a velocidade indicada mostra-se obsoleta frente a evolução do mercado e os preços praticados no Estado”, apontou despacho do conselheiro Ronaldo Chadid, responsável pelo caso no TCE-MS.
Ainda segundo Chadid, o lapso superior a 4 anos entre o estudo e a concorrência pedem “cautela” na análise dos dados.
A Apims afirmou ter obtido decisão no Tribunal de Contas para suspender o pregão, que depois acabou convertida de forma a permitir que a sessão pública na B3 fosse realizada, sendo aberto prazo de 5 dias para que a Sefaz apresente documentos ou justificativas que considerar pertinentes para comprovar a regularidade da licitação ou eventuais medidas para sua correção. Tais questões serão avaliadas no mérito da ação no TCE-MS.
Ambiente ‘extremamente favorável’
Conforme divulgado pelo Governo do Estado, a Infovia Digital prevê o pagamento de R$ 2,29 milhões mensais em um contrato de 30 anos com o Consórcio Sonda. Jaime Verruck, secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar do Estado, qualificou o projeto como “inovador” e que traz “um novo elemento de competitividade para atração de novos negócios, desenvolvimento, agilidade e eficiência do setor público”.
A ideia é que a nova base de tecnologia permita melhorias nos serviços públicos e no ambiente de negócios. “Com a Infovia Digital, vamos criar novos serviços, que vão da telemedicina à emissão de notas, monitoramento e fiscalização. A partir da infovia, todos os órgãos públicos serão mais eficientes. E por outro lado, nós criamos um ambiente, sob o ponto de vista da competitividade, extremamente favorável”, completou o secretário.
‘Série de vantagens’
Procurado via assessoria, o Governo do Estado justificou a preferência pela PPP no lugar de uma concorrência “comum” por conta da “série de vantagens em relação ao modelo de contratação atual”.
A mudança permitirá a otimização do gerenciamento de contratos, substituindo os atuais 2.057 existentes em serviços de telecomunicações por apenas um. O deságio de 54% (passando de R$ 4,3 milhões para R$ 2,29 milhões) representou um menor custo na unidade de dados — R$ 4,82 por Mbps ao mês.
Outra vantagem estaria na velocidade de transmissão, com a garantia de entrega de uma velocidade mínima de 300 Mbps nos mais de 1,5 mil pontos do governo, “sem variação decorrente de utilização dos mesmos serviços por outros clientes”. Neste caso, a queda na velocidade deve resultar em um pagamento menor ao Sonda.
O Governo do Estado ainda defendeu a existência de uma rede dedicada pela facilidade na futura integração de serviços, do videomonitoramento à telemedicina, e da amortização do contrato da PPP, com reversão da infraestrutura ao Estado. Além disso, a contraprestação do Estado pode ficar menor a partir do “compartilhamento de receitas acessórias”.
O contrato também prevê aumento nas velocidades contratadas, caso haja aumento de demanda. Por isso, os equipamentos adquiridos devem ter modularidade, de forma a atender a essa possível necessidade.
Nesse sentido, o Governo do Estado argumenta que a velocidade contratada atende à demanda atual e, um eventual aumento, tornaria a contraprestação mais cara com uma estrutura ociosa. “A opção foi por aumentar a capacidade da rede conforme demanda ao longo da execução do contrato”.
A vencedora poderá “explorar economicamente a Infovia Digital”, desde que não atue como provedor de internet, para evitar concorrência com os já instalados.
A documentação do consórcio deve ser avaliada até 31 de março. Após a data, estando tudo regular, o contrato deverá ser assinado, com 24 meses para implantação total da estrutura.
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