Os advogados sul-mato-grossenses Raul Canal e Danny Fabrício Cabral Gomes representam, em ação na 1.ª Vara Federal de Brasília, a médica oncologista e imunologista Nise Hitomi Yamaguchi, que R$ 360 mil em danos morais dos senadores (PSD-AM) e Otto Alencar (PSD-BA).

A base para o pedido é o depoimento da médica à CPI da do Senado em 1.º de junho.

Marcado por um noticiário em que as opiniões de Yamaguchi –defensora do tratamento precoce contra a Covid-19, incluindo o uso da cloroquina– foram contestadas pelos dois senadores, o depoimento, para os advogados, tornou-se um “massacre moral” praticado por Aziz e Alencar, contendo momentos de misoginia (discurso de ódio contra as mulheres) e humilhação, bem como a prática de abusos de direito e de autoridade cometidos pelos parlamentares.

A ação, que começa destacando o currículo profissional e acadêmico de Yamaguchi –especialista no tratamento de câncer com reconhecimento internacional–, frisa sua disposição em falar à CPI da Pandemia de forma voluntária e, logo no início, aponta o “massacre moral” contra a médica, alvo, entre outras manifestações de solidariedade, de nota de repúdio do Conselho Federal de Medicina contra senadores da comissão de inquérito.

A defesa reforça, ainda, intenção dos membros de “destruir a imagem” da médica perante a sociedade. Entre os abusos, são inicialmente destacados os questionamentos de Otto Alencar –reproduzidos por diferentes veículos– envolvendo o uso de antiprotozoário (cloroquina) no lugar de antiviral contra o vírus da Covid-19, fazendo um paralelo no combate ao H1N1.

‘Gritos e admoestações'

A ação incluiu as interrupções durante as respostas da autora, “com gritos e admoestações abusivos e desnecessários, não permitindo que a autora concluísse suas frases e seus raciocínios, deixando toda sociedade brasileira perplexa com a barbárie inquisitorial dos requeridos, que não agiram como congressistas eleitos por um sistema democrático e equânime, mas sim, como verdugos de um regime ditatorial”, destaca a inicial.

A troca de falas sobre a diferença entre vírus e protozoário –também destacada no noticiário– foi vista como tentativa de “diminuir e humilhar” Yamaguchi, “desprestigiando seu conhecimento científico”.

Destacou-se, ainda, que o fato se tornou o “meme do dia” na imprensa nacional, bem como o alcance do assunto na internet –com o tema atingindo milhões de acessos em diferentes portais de notícias.

Fala de Aziz, presidente da CPI, pedindo a quem estivesse assistindo ao depoimento que desconsiderasse as palavras da médica, também foram destacados pelo “tom de voz e do caráter intimidatório”. Ele também foi cobrado por não ter interrompido Alencar nos supostos abusos, “sendo cúmplice e corresponsável pelos abusos suportados pela requerente”.

Também foi feito paralelo entre o depoimento e o julgamento de Mariana Ferrer, que teria sido vítima de estupro, na Justiça de Santa Catarina –em que o advogado do acusado de cometer o crime a humilhou sem ser interrompido pelo magistrado. Os advogados pedem que a Procuradoria-Geral da República analise se houve abuso de autoridade por parte dos senadores.

Abuso de direito

A ação destaca precedentes para que os senadores respondam na Justiça Comum por práticas que, a princípio, seriam protegidas pela imunidade parlamentar.

Além disso, pontua necessidade de responsabilização dos senadores por abuso de direito, já que, ao ocupante do cargo, “é vedado o uso de expressões descorteses ou insultuosas, sendo caso de abertura de inquérito parlamentar”, como previsto no regimento interno da Casa. O direito à honra, à reputação e a consideração social, previstos na Constituição, também foram salientados.

Por atingirem a “dignidade e o decoro” da médica, os advogados pedem a condenação dos senadores ao pagamento de danos morais, juntos, de R$ 360 mil, bem como das custas do processo. De modo a sustentar a tese, também é pedido ao Judiciário que requisite as notas taquigráficas e a íntegra, em vídeo, do depoimento de Nise Yamaguchi à CPI da Pandemia.

Conforme a CNN Brasil, Omar Aziz aguardará a notificação judicial para se manifestar. Já Otto Alencar informou que seu advogado, assim que for notificado, responderá conforme a lei que dá o direito de questionamentos em uma CPI.

Alencar ainda rebateu a acusação de que a pergunta sobre vírus e protozoário visava a criar um meme com a situação: segundo ele, buscou-se demonstrar que a medicação contra protozoários não funciona em vírus. “Todo o tempo que perguntei, a tratei como doutora, senhora e Vossa Senhora” argumentou.