Depois de virar alvo de inquérito e até motivo de mudança sobre regras no (Departamento Estadual de Trânsito), vistoriadoras credenciadas voltaram a ser alvo de investigação do MP-MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) por suposto esquema fraudulento na inspeção veicular, desta vez em – distante 225 km da Capital.

Ouvidoria do órgão registrou denúncia que envolve não somente empresários do ramo de vistoria, como despachantes e garagistas, tudo para lucrar e onerar o contribuinte. Didático, o denunciante até explica como funcionaria o suposto esquema, que não é novidade para o Detran-MS.

Além do valor tabelado nas empresas, o cliente pagaria um valor extra aos despachantes e, depois de aprovada em vistoria (o que sempre acontece, haja vista a quantidade de vistorias e aprovações, segundo a denúncia), o proprietário da credenciada do Detran-MS ainda repassaria parte de seu próprio lucro ao despachante.

As informações que devem nortear a investigação mais ampla ainda sugerem que as credenciadas de Dourados não teriam critério algum para inspeção, quando parte do suposto esquema, e ainda exerceria uma atribuição exclusiva de servidores do órgão de trânsito.

“Já é público e notório que as -empresas credenciadas para vistoria, aprovam veículos sem condições de trafegabilidade e ainda exercem poder de polícia. Em Dourados não é diferente. As ECVs também aprovam veículos sem condições ou com condições parciais para trafegar nas ruas”, diz a denúncia.

Quando o veículo é reprovado por servidores do Detran-MS, segundo a denúncia, servidores têm que ouvir: “Vou lá na terceirizada, porque lá passa”. E a situação é recorrente, narra. Quanto mais veículos são vistoriados nas credenciadas, “apontadas por despachantes e garagistas”, maior o lucro dessa suposta organização.

Irritados

Assim a denúncia narra o comportamento de empresários, despachantes e garagistas, “quando as vistorias são determinadas, judicialmente, a serem realizadas somente no Detran-MS, pois impede a realização desse esquema”, afirma.

“O Estado sabe disso, mas tanto a gerência do Detran-MS, como seus chefes, se omitem e não impedem que a população seja duplamente lesada”, questiona.

Em Dourados, ainda segundo o procedimento do MP-MS, “não há funcionários suficientes para fiscalizarem as vistorias das empresas terceirizadas, porque o Detran-MS não tem interesse em fazer concurso público”, esclarece.

Resolver o problema não seria tão difícil assim, narra a denúncia. “Se todas as vistorias veiculares fossem realizadas no Detran-MS, com quadro de pessoal próprio, além de todo valor ser arrecadado diretamente pelo órgão, haveria maior rigor na fiscalização e o cidadão não pagaria tão mais caro por ela, pois não ficariam refém daquele esquema”, recomenda.

Entretanto, ainda conforme o procedimento, para justificar a manutenção das credenciadas e os lucros para despachantes e garagistas, “o estado não investe em infraestrutura para realização deste procedimento, faltando itens mais básicos” para vistoria, alerta.

Faltariam funcionários do Detran-MS fiscalizando credenciadas em Dourados, o que, segundo a denúncia, se resolveria com concurso público para vistoriadores. Apesar da investigação poder ser consultada virtualmente, o Detran-MS informou que ainda não foi citado e, por isso, desconhece o teor da investigação.

‘Na mão das credenciadas’

A suspeita de que haja ‘desinteresse’ por parte de setores do Detran-MS em investigar as ilegalidades flagradas em credenciadas gerou até denúncia do Sindetran. O sindicato questiona o fato de o serviço ser prestado por credenciadas – e não exclusivamente por servidores de carreira do órgão, o que abriria espaço para as fraudes flagradas.

“O servidor de carreira é o único apto a realizar a vistoria, mas o Detran-MS preferiu entregar o serviço nas mãos de empresários que visam unicamente o lucro. Deixaram os concursados de lado para atender interesses particulares. Isso abre margem para muita coisa errada. Vistoria é papel do Estado”, cobra o presidente do sindicado, Octacílio Sakai Júnior.

MP-MS investigando (de novo)

A investigação sobre os casos de ‘vista grossa’ praticadas pelas terceirizadas, iniciada em 2015, durou três anos e resultou em arquivamento, em maio de 2018, após recomendação do Conselho Superior do MP-MS e promessa de apuração interna do Detran-MS.

Entretanto, o inquérito civil foi reaberto pelo promotor de Justiça Humberto Lapa Ferri que garantiu que, além de ‘reinvestigar’ as terceirizadas, vai apurar também suposta omissão do Detran-MS, diante dos reincidentes casos.

Reclamações quanto a má prestação do serviços basearam decisão do juiz David Oliveira Gomes Filho, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos, Individuais Homogêneos pela proibição de vistorias por empresas credenciadas, o que posteriormente foi revertido no TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul)

‘Montagens para fod** empresas’

Sem saber que era gravado por um denunciante que tem colaborado com as reportagens do Jornal Midiamax sobre falhas no sistema de inspeção veicular em MS, o corregedor – cuja atribuição funcional é justamente receber e investigar denúncias – não esconde a irritação por causa dos sucessivos casos flagrados e denunciados.

Com laudos em mãos, o cidadão tentou cobrar providências de um antigo caso, tocado pela corregedora anterior, cuja resolução, segundo ele, ninguém viu acontecer.

“Eu não tenho que saber disso daqui”, diz o corregedor, complementando: “eu não era corregedor, não era presidente do órgão, não era nada disso… (…) então, antes de ler, eu já sabia o que o senhor vinha fazer. Isso aqui não me interessa”.

Fernando Villa fala alto, gesticula, usa termos agressivos e chega, em determinado momento, a dizer ao cidadão que tenta ajudar: ‘não tem problema nenhum em te colocar em cana’. Após o registro em vídeo, a Corregedoria da Polícia Civil abriu procedimento para “acompanhar o caso”, mas o resultado da investigação ainda não foi divulgado.

Questionada pela reportagem, a corregedoria informou que o procedimento aberto contra o delegado está em fase final de instrução, mas detalhes não serão divulgados porque a investigação é sigilosa.

O flagra, em vídeo, que revelou inconsistência nos padrões técnicos de vistoria credenciada – e que motivou reabertura de inquérito – pode ser relembrado clicando neste link.