‘Paternidade socioafetiva é um direito da criança’, diz advogada, após medida do TJ

Provimente permite reconhecimento direto no cartório

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Provimente permite reconhecimento direto no cartório

Além de regulamentar e facilitar a chamada paternidade socioafetiva – quando o vínculo paterno não é sanguíneo – o provimento da corregedoria do TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) também fortalece o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). É que explica a presidente da Comissão de Direito da Família e Sucessões da Ordem dos Advogados Seccional Mato Grosso do Sul, Ildália Aguiar de Souza Santos. O que advogada, especialista em direito da família conta, é que a regulamentação é uma conquista aos direitos da criança.

“A paternidade socioafetiva, a gente vem buscando ela há muito tempo. E na verdade é um direito da criança. Amor é dado indiferentemente da paternidade. As vezes conta na certidão de nascimento da criança e nunca nem compareceu. É um direito da criança e de reconhecimento daquele que prestou. Essa medida veio justamente para proteger as crianças que estão sofrendo com divórcios de pais – e eu faço no mínimo 10 divórcios por semana – e nessa situação tem que ter um cuidado absoluto com a criança, e minha preocupação nunca é o patrimônio, minha preocupação é a criança. Isso é um fortalecimento do ECA e da Constituição Federal. Esse pai adotivo também pode ser responsabilizado por abandono afetivo”.

O provimento 149/2017 publicado no dia 18 de janeiro, facilita o processo para as famílias. A mãe, e o pai afetivo, que  desejam regulamentar a situação paterna não precisam mais ingressar no Judiciário. Isso porque, agora, basta ir até o cartório de registro civil. Além de documento com identidade e certidão de nascimento da criança, os cartórios exigirão requisitos que comprovem a verdade afetiva da relação entre o pai e a criança.

A garantia não só facilita o processo como garante que o pai afetivo terá os mesmos deveres de um pai biológico, no que diz respeito tanto à presença na vida da criança, como à responsabilidade de sustentá-la. Conforme explicou Ildália, é um novo contexto do Judiciário brasileiro: o de desjudicializar questões que podem ser resolvidas na própria sociedade.

Ainda assim, o provimento esbarra em outras questões. A primeira dela, conforme explicou, são os requisitos. Não há clareza no provimento sobre quais características devem ser comprovadas pela família na hora de registrar a criança. Uma política que ainda será desenvolvida, nas palavras da advogada.

“É difícil falar nesse caráter extrajudicial, porque, judicialmente falando, como a gente trabalha com isso, sabe do que precisa, porque se não vira oba oba, todo mundo vai lá querendo registrar e depois não vai saber o que está fazendo. Creio que esta política preventiva de estabelecer requisitos vai ser criada agora. Como o provimento foi criado agora dia 18, ele vai começar agora a surtir efeito em cartório”, explica.

 

 

 

 

Mas os obstáculos não acabam aí. É o que conta a presidente. A sociedade ainda tem pouco conhecimento sobre o conceito de afetividade nos laços de família. Além disso, Mato Grosso do Sul, conforme explicou, parece apresentar certa ausência de conhecimento jurídico nos cartórios, que terão que adaptar-se a nova regulamentação.

“Aqui a gente tem uma política muito feia até, dos cartórios, o advogado chega e falam: ‘pera aí, que eu vou ver se pode’. Não é assim. O advogado é que sabe se pode ou não. O cartório está ali como um servidor público. Em Campo Grande é ruim essa ignorância dos cartórios, até com divórcio. Eu tive um trabalho muito grande de ter que ficar trazendo portaria. Então, infelizmente, o cartorário não tem buscado, hoje, estar informado acerca da legislação. É uma cultura que não auxilia, a gente espera que mude”, conta a advogada.

Direito da criança, direito da mãe

Outra mudança trazida pelo provimento é a ajuda para as mães. Se antes, ao terminarem relações, elas continuavam com a responsabilidade, afetiva e financeira, sozinhas, com a regulamentação a questão pode mudar. A mudança vai além da legislação. Ela altera a cultura do ‘peso’ da atribuição dos filhos ser apenas da mãe. É o que relata Ildália.

“Quando vem de outros casamentos, a mãe é quem traz essa bagagem e é a mãe quem cuida efetivamente. Ela tem, na sua concepção, que a responsabilidade é dela. No entanto, não é assim. Se uma outra pessoa aceitou criar a criança com ela, quando viveu e teve a convivência, aquela pessoa tem que estar ciente do que vai estar assumindo”, explica.

“O que tem que ficar claro para a sociedade é que não é assim, o pai chega e fala ‘ah, quero ser o pai’. Saiba que vai haver responsabilidades advindas disso. Nos casos das crianças criadas, quando, por exemplo, a mulher divorcia, que é muito comum hoje em dia, e é casada 12 ou 15 anos com outra pessoa e a criança entende como sendo pai, quando a relação acaba a pessoa simplesmente ‘dá um pé na bunda’ da criança, fala que não quer saber da criança. E eu não estou falando financeiramente, falo afetivamente. Isso [provimento] veio pra que? Pra proteger a criança”, complementa.

 

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