Segundo a ABCG, proprietária original da Santa Casa, a um mês da devolução do hospital não há prestação de contas e a Junta nem deu um telefonema para iniciar o processo.

A ABCG (Associação Beneficente de ), proprietária original da Santa Casa, entrou na Justiça para que as Juntas Interventiva e Administrativa que estão no hospital desde 2005 prestem contas sobre os 8 anos de intervenção. Isso porque, conforme decisão judicial, a Santa Casa será devolvida para a Associação em 17 de maio. Os integrantes da ABGC afirmam que o processo de transição deve ser iniciado imediatamente para que não peguem o Hospital no ‘escuro' e comprometam os atendimentos.

A decisão da Justiça foi proferida no dia 1º de abril e dá 48h, a partir da notificação dos integrantes da Junta – administrada pelos secretários estadual e municipal de saúde – para começar o repasse de todas as informações para a devolução definitiva do Hospital à ABGC. Em caso de descumprimento da ordem judicial estado e município serão multados em R$ 10 mil por dia e o valor será revertido para os cofres da Associação.

Entre os documentos solicitados estão os comprovantes de pagamento de dívidas; informações sobre quadro de pessoal; negociação com fornecedores; projetos em andamento em órgãos governamentais, especialmente Ministério da Saúde; pontos de estrangulamento do funcionamento do hospital; e principalmente o encerramento imediato do déficit e pagamento de todas as dívidas, previsto em decisão judicial que autorizou a Junta a assumir a Santa Casa.

De acordo com o presidente da ABCG, Wilson Teslenco, o pedido de transição é necessário não comprometer os atendimentos. Ele disse que a associação está com um projeto de gestão hospitalar, mas que faltam os dados e documentações da Santa Casa para fechá-lo.

Sem revelar nomes, Teslenco afirmou ainda que está fechando uma parceria gratuita com um grande hospital de para apoiar a gestão da Santa Casa e afastou qualquer ligação com a SPDM ou Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

A SPDM é uma empresa de gestão hospitalar da Unifesp, que foi contratada pela Junta Interventiva para a Santa Casa e segundo o assessor jurídico da ABCG, Carmelino Rezende, ‘levou pelo menos R$ 1,8 milhão do Governo, sem apresentar nenhum resultado prático do serviço prestado'.

A empresa é investigada pelo TCU e apresenta irregularidades em um grande número de hospitais estaduais e municipais onde atuou. O Tribunal de Contas de São Paulo chegou a afirmar que a SPDM não tinha capacitação para realizar aquilo que propôs nos contratos milionários.

Dívida milionária

Na ação judicial, a associação pede que o governador André Puccinelli e o prefeito Alcides Bernal (PP) sejam intimados para quitar a dívida do Hospital, conforme determinação de decisão antecipatória, dada quando da autorização da intervenção.

“Considerando que a intervenção foi realizada para salvar o hospital do caos que propaladamente se encontrava, obviamente deverá ser entregue com ativo suficiente para pagamento de todo seu passivo, pois foi como excelente administrador que o município requisitou a intevenção”. (fl 1947 – vol.)

Na intervenção feita em 2005, a dívida era de R$ 34 milhões. Integrantes da ABCG estimam que o valor da dívida atual seja de R$ 140 milhões. Contudo, auditoria feita pela empresa KPMG Auditores Independentes, de Goiás, divulgou no Diário Oficial de Campo Grande, no dia 25 de julho de 2012, que o hospital tinha acumulado uma dívida de R$ 159 milhões, em 2011.

Teslenco informou que mesmo sem ser responsabilidade da Associação, foi proposto a Junta que eles assumiriam 1/3 da dívida. Contudo, nunca recebeu resposta. O volume milionário da dívida mantém a conta bancária do Hospital bloqueada, o que obriga que os gestores trabalhem com cheques administrativos.

“É impensável que o Hospital continue trabalhando assim. São mais de 400 ações de penhora na Justiça que não temos conhecimento”, frisou Teslenco.

Para Caramelino, o que levou à intervenção foi o saneamento das dívidas, mas isso não aconteceu. “Passamos de R$ 34 milhões para R$ 140 milhões. Que tipo de saneamento de dívida é esse? O promotor Mauri Riciotti que criou toda essa situação (intervenção) não toma nenhuma providência e permite o endividamento. Os gestores têm que ser responsabilizados. O MPE tinha que pedir a prisão deles como consta na ação judicial”, disparou.

O item 10 da decisão antecipatória da sentença diz que “O Estado de Mato Grosso do Sul e o município de Campo Grande repassem verbas mensais necessárias ao hospital durante o período de intervenção, de modo a garantir a continuidade dos serviços do nosocômio, sob pena de multa diária de R$ 10 mil para cada um dos entes e prisão dos responsáveis”.

Golpe

Às vésperas do PMDB perder a prefeitura, uma manobra realizada pela Junta Interventiva que controla a Santa Casa tentou substituir os membros da ABCG.

Um edital foi publicado, tentando atualizara lista de associados, reunindo basicamente servidores públicos em cargos de comissão ligados ao grupo político de Puccinelli e do ex-prefeito Nelsinho Trad (PMDB). O documento foi assinado pela secretária estadual de Saúde, Beatriz Figueiredo Dobashi, e pelo secretário de Saúde da Capital, Martins.

Entre os nomes estavam a secretária de Administração, Thie Higushi Viegas dos Santos, o diretor da Funsau, Ronaldo Perches Queiroz, e o próprio governador André Puccinelli. Membros históricos da Associação, como o ex-governador Wilson Barbosa Martins, o ex-senador Valter Pereira, e até o atual presidente com eleição registrada em ata, Wilson Teslenco, curiosamente ficaram fora.

Para Carmelino Rezende, a manobra foi uma tentativa de evitar a devolução do hospital e arcar com as responsabilidades, depois de provocar um verdadeiro caos no atendimento médico hospitalar.

Planos

A Associação divulgou algumas medidas que serão tomadas assim que assumir o comando do maior Hospital do Estado. Teslenco disse que o principal objetivo será reduzir o custo operacional.

“As terceirizações serão revistas e aquilo que pudermos, vamos assumir. As irregulares serão canceladas. Os funcionários que tem vínculo serão mantidos. A mão de obra do setor administrativo será remanejada porque tem um número muito elevado de pessoal. Com isso, acreditamos que o custo operacional será drasticamente reduzido já nos dois primeiros meses e poderemos ampliar o número de leitos que hoje é de 535, com expansão imediata em mais 100 leitos”, explicou.

Outra notícia é que os recursos para a reforma da Santa Casa devem começar a chegar. “Tem projetos em Brasília em fase inicial e em fase de liberação de recursos. São ações da atual Junta e que já estamos planejando como fazer para não comprometer o atendimento. A princípio, a ideia é fechar um andar de cada vez para reforma”, afirmou Teslenco.

Falhou

A intervenção não foi capaz de melhorar os atendimentos e a crise da gestão recai sobre médicos e pacientes. Em 2005 a intervenção foi concedida porque não havia dinheiro para os médicos e fornecedores, e o Pronto Socorro tinha sido fechado por falta de recursos.

Hoje, o hospital não conta com cardiologistas no Pronto Socorro, o setor de ortopedia tem pacientes que passam dias esperando por uma cirurgia. Transplantes de rins e coração chegaram a ser suspensos, além das diversas irregularidades encontradas em vistoria da Vigilância Sanitária de agosto de 2012, que ameaçou fechar setores do hospital.

Na terça-feira, 2 de abril de 2013, a Santa Casa informou oficialmente ao Corpo de Bombeiros e ao Samu que não estava recebendo pacientes por falta de vagas. Segundo a assessoria, a falta de leitos é constante e vem se repetido quase que diariamente.