Deputado classifica de ‘esdrúxulo’ discurso de André Puccinelli sobre questão indígena

Governador disse que índio que invade terra ou bloqueia estrada é “bagunceiro” e que as terras confiscadas de traficantes deviam virar aldeias; Pedro Kemp acha que o pronunciamento do governador “envergonhou o Estado”

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Governador disse que índio que invade terra ou bloqueia estrada é “bagunceiro” e que as terras confiscadas de traficantes deviam virar aldeias; Pedro Kemp acha que o pronunciamento do governador “envergonhou o Estado”

O deputado estadual Pedro Kemp, do PT, chamou de “esdrúxulo” o pronunciamento do governador André Puccinelli, do PMDB, anteontem, em Dourados, durante o seminário “Questões Fundiárias em Dourados”, evento promovido pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

O governador propôs que os índios habitem fazendas confiscadas de traficantes ou então do reverendo Mon, líder religioso que comprou terras na cidade Bonito, além dizer que a Funai não faz nada e que considera como “bagunceiros” os índios que invadem terras ou trancam estrada.

“Ele [Puccinelli] deixou claro que o governo estadual é contra a criação de novas aldeias. A fala do governador foi lamentável, ele deixou claro que nada conhece da causa indígena, que o índio deve viver numa terra tradicionalmente indígena, não em qualquer lugar”, alfinetou o parlamentar.

“Puccinelli quis jogar para a platéia, falou o que os fazendeiros queriam, desrespeitou os índios e o presidente da Funai, enfim, o discurso dele não contribuiu em nada. Pelo contrário, envergonhou o nosso Estado”, completou.

A ideia do seminário, disse Kemp, é um instrumento para estudar propostas sem ferir os direitos do índio e também dos proprietários rurais.

Kemp disse que durante o seminário, debateu-se, por exemplo, a possibilidade de o governo brasileiro captar recursos de um fundo internacional. Esse serviria, por exemplo, para indenizar os donos de áreas demarcadas como território dos índios.

“Temos de buscar alternativas, instrumentos jurídicos para resolver os conflitos envolvendo os índios e os fazendeiros, não dizer que a Funai não faz nada, isso é desrespeitoso, esdrúxulo”, repetiu o petista.

O discurso de Puccinelli inflamou os ânimos dos índios, quando disse que ele fazia aqui no Estado pelos índios “muito mais que a Funai”.

“Mentira” retrucou um dos líderes indígenas. “Mentiroso é o senhor”, retrucou Puccinelli.

Proposta supera

A presidente da Copai (Comissão Permanente de Assuntos Indígenas da OAB/MS, Samia Roges, disse que o tom do discurso de Puccinelli causou uma discordância com o propósito do CNJ que, para ela, promoveu o seminário como meio de pregar a paz.

“A proposta do CNJ supera e muito o discurso do governador, o acontecimento é um divisor de águas”, disse Samia.

Tirando de lado o polêmico discurso de Puccinelli, depois de dois dias de discussão, o CNJ decidiu, ontem (26/05), criar uma comissão para solucionar o conflito fundiário entre índios e produtores rurais na região de Dourados.

A comissão será composta por indígenas, produtores rurais, Ministério Público Federal, Advocacia-Geral da União, representantes de academias, Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

Comissão criada

A criação da comissão vem ao encontro de uma recomendação do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), afirmou Christiana Freitas, coordenadora-geral do Conselho, que representou a ministra Maria do Rosário no seminário “Questões Fundiárias em Dourados”, promovido pelo CNJ. “Entre nós, pessoas, está a possibilidade de resolver a questão”, afirmou Christiana.

A comissão será instalada o mais rápido possível, informou Marcelo Martins Berthe, juiz auxiliar da Presidência do CNJ e coordenador do Fórum de Assuntos Fundiários. “Temos esperança de, no prazo mais curto possível, pelo menos diminuir um pouco o sofrimento do povo indígena e a insegurança dos produtores rurais”, disse.

Os integrantes da comissão vão analisar todos os pontos levantados durante o seminário, entre eles a possibilidade de estabelecer uma nova política indigenista para o Brasil. Durante os debates, indígenas, produtores, especialistas e autoridades públicas reclamaram da falta de política pública para as populações indígenas. Para eles, o modelo adotado até hoje de demarcação de reservas não soluciona o problema dos índios, que precisam ter condições de produzir e de obter renda para viver com dignidade.

Os indígenas aplaudiram a decisão e encerraram o evento com um ritual religioso, quando benzeram os juízes do CNJ e também líderes dos produtores rurais. “É uma reza para resolver um problema de 500 anos”, informou o cacique Anastácio Peralta, acrescentando: “Nosso país não é feito só de soja. É feito de pessoas”. (com informações da assessoria de imprensa do CNJ)

 

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