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Polícia

PF ouve indígenas de Mato Grosso do Sul para apurar ataques e ameaças de estupros por ‘jagunços’

Clima entre moradores do entorno da Reserva Federal e ‘jagunços privados’ ficou tenso na semana passada
Marcos Morandi - Publicado em
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Agentes estiveram na retomada Avae'te, acompanhados de antropólogas da DPE-MS e DPU (Foto: Reprodução, leitor Midiamax)

Agentes da PF (Polícia Federal) de Dourados estiveram na retomada Avae’te, nesta quinta-feira (24). Eles ouviram os relatos dos moradores da comunidade sobre as denúncias de ataques e também ameaças de estupros feitas supostamente por ‘jagunços privados’ na semana passada, durante dias de tensão envolvendo conflito fundiário.

Após mediações conjuntas da DPE-MS (Defensoria Pública Estadual de Mato Grosso do Sul) e DPU (Defensoria Pública da União), o MPI (Ministério dos Povos Indígenas) pediu a abertura de inquérito da Polícia Federal para o caso. No momento os ânimos entre as partes envolvidas nos conflitos estão mais calmos.

A reportagem do Jornal Midiamax apurou que os depoimentos dos indígenas duraram cerca de uma hora e meia e foram colhidos na própria comunidade, em razão da dificuldade de deslocamento dos moradores, constituídos em grande parte por mulheres, crianças e idosos. A oitiva itinerante foi acompanhada pelas antropólogas da DPE-MS e também da DPU.

“O povo indígena Guarani e Kaiowá da comunidade Tekoha Avae’te foi violentamente atacado por pistoleiros na madrugada do dia 15 de agosto e na tarde do dia de hoje”, diz o trecho do pedido feito ao superintendente da Polícia Federal de MS, Agnaldo Mendonça Alves, e também ao delegado da PF em Dourados, Alexandre Taketomi Ferreira.

“Assim, considerando este novo episódio odioso e criminoso vitimando o povo Guarani e Kaiowá que, legitimamente, luta pelo reconhecimento de seus direitos territoriais e faz jus à proteção de sua integridade física e moral, vem o Ministério dos Povos Indígenas solicitar a imediata instalação de inquérito policial para apuração dos fatos narrados”, justifica o secretário Executivo do MPI, Eloy Terena.

15 barracos foram incendiados

Encravadas entre duas rodovias, as retomadas estão entregues à sorte e convivem há anos com ataques e hostilidades de seguranças particulares de proprietários rurais. Após crescimento recente da tensão na área, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, por meio do Nupiir (Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Povos Indígenas e da Igualdade Racial e Étnica), fez uma visita técnica ao local na tarde dessa quinta-feira (17).

“Estamos aqui para ouvir de vocês o que realmente aconteceu diante do que vem sendo noticiado nos últimos dias”, disse o defensor Lucas Colares Pimentel, que também anunciou o apoio da DPU (Defensoria Pública da União). O encontro foi acompanhado com exclusividade pela reportagem do Jornal Midiamax.

Na área disputada entre sitiantes locais e indígenas, os restos dos 15 barracos incendiados e outros derrubados ainda estão à mostra em meio aos vestígios da última colheita de milho. “Eles avançaram com as lavouras para cima das nossas casas com intenção de nos empurrar cada vez mais, invadindo nosso espaço. Como a gente não sai, eles usam da força bruta de seguranças contratados”, relata um dos moradores que está no local desde 2016.

“Estou há muitos dias sem conseguir dormir, com medo do que pode acontecer com a gente. Os tiros durante a noite estão cada vez mais frequentes. No ataque de segunda-feira tive que correr para o meio da mata para não ser agredida”, relata a anciã indígena de 85 anos, uma das moradoras da retomada. “Minha avó viveu aqui e minha mãe também e por isso não sairei desse lugar que pertence ao povo Guarani-Kaiowá”, ressalta.

Mulheres também denunciam ameaças de estupros (Foto: Marcos Morandi, Midiamax)

‘Caveirão e ameaça de estupro’

Além das constantes promessas de ataques com uso do ‘caveirão’ (trator blindado), os moradores da Avae’te confirmaram o uso de drones para monitoramento de tudo que acontece na retomada. Entretanto, as ameaças de violência contra as mulheres chamaram a atenção da equipe da Defensoria.

“Além de dizer que vão nos matar, os ‘jagunços privados’ estão falando também que vão nos estuprar primeiro, inclusive as nossas meninas. E a gente sabe que eles são capazes de qualquer coisa porque inclusive um deles estava preso e agora faz parte do grupo que tem nos atacado. A gente conhece cada um deles. São pessoas muito violentas”, denunciou uma das moradoras da comunidade.

Reconstrução de barracos

Sob o sol escaldante de uma tarde típica de agosto, os indígenas juntavam partes da madeira que sobrou dos barracos derrubados pelos ‘jagunços’ para tentar reconstruir as moradias. “Enquanto tivermos forças, vamos fazer o que for preciso para continuar na nossa terra. Se destruírem tudo, a gente reconstrói tudo”, conta o indígena da Avae’te que cavava buracos para fincar as estacas.

Durante o ataque da última quarta-feira, os seguranças privados também derrubaram alguns pés de banana da lavoura da retomada. “Chegam destruindo tudo como se não existisse ninguém. Tudo isso deixa a gente muito triste”, reclama uma das moradoras da comunidade, com o filho pequeno no colo.

Resguardar a vida e a segurança das comunidades

No entendimento da Defensoria Pública, os relatos dos indígenas da comunidade Avae’te são extremamente preocupantes e requerem uma ação imediata do poder público, em especial dos órgãos de segurança. “Precisamos cessar os conflitos nessas áreas de retomadas para evitar consequências ainda mais desastrosas”, explicou Lucas, que já fez uma série de encaminhamentos pedindo providências em relação aos recentes conflitos.

“Consta que no dia 15 de agosto oito pessoas armadas invadiram e incendiaram as casas da comunidade, obrigando os moradores a correr e a se esconderem nos matos da vizinhança para se protegerem dos disparos de arma de fogo”, diz um trecho do ofício assinado pela DPU e também pela Defensoria Pública de MS.

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