A Justiça do Rio de Janeiro ouvirá na tarde desta quarta-feira testemunhas de defesa da suposta tortura e desaparecimento do auxiliar de pedreiro Amarildo de Souza, em julho do ano passado, na favela da Rocinha. Esta será a quarta audiência de instrução e julgamento realizada pela 35ª Vara Criminal da Capital dos 25 policiais militares acusados de terem torturado e sumido com o corpo de Amarildo. Segundo o Tribunal de Justiça, devem ser ouvidas pelo menos seis testemunhas arroladas pela defesa. Na sequência, a próxima fase é o interrogatório dos réus.

O Ministério Público afirma que os PMs levaram o ajudante de pedreiro para a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da favela no dia 14 de julho de 2013, onde ele teria sido torturado. Segundo a denúncia do MP, alguns policiais teriam vigiado o entorno da base e não teriam impedido os supostos atos de violência. O MP acusa os policiais também de terem desaparecido com o corpo do ajudante de pedreiro.

Os 25 PMs respondem pelos crimes de tortura, ocultação de cadáver, fraude processual, omissão imprópria e formação de quadrilha. Somadas, as penas podem chegar a 33 anos de reclusão, dependendo do envolvimento de cada um no caso.

Segundo o Tribunal de Justiça, pelo menos 10 testemunhas já prestaram depoimento na 35ª Vara Criminal do Rio. Na semana passada, o técnico pericial do Ministério Público Robson Spinelli visitou a sede da UPP da Rocinha e disse que os contêineres em que funciona a polícia não têm revestimento acústico. Para ele, não há dúvidas de que gritos dados dentro das salas poderiam ser ouvidos do lado de fora. Três soldados da PM afirmaram que ouviram gritos e murmúrios por cerca de 40 minutos, originados do contêiner principal.

De acordo com a denúncia apresentada pelo Ministério Público (MP), o tenente Luiz Medeiros, o sargento Reinaldo Gonçalves e os soldados Anderson Maia e Douglas Roberto Vital teriam torturado Amarildo depois de ele ter sido levado para a base da UPP. Moradores que prestaram depoimento disseram que os policiais da UPP eram extremamente violentos.

O delegado Orlando Zaccone, então titular da 15ª DP (Gávea) à época do desaparecimento de Amarildo, e a atual comandante da UPP da Rocinha, major Priscila Azevedo afirmaram nunca ter recebido denúncias de tortura contra os PMs da UPP. O delegado disse ainda que o então delegado adjunto da 15ª DP, Ruchester Barbosa, que iniciou as investigações do caso Amarildo, mentiu ao afirmar que ele havia sido morto pelo traficante Catatau.

O soldado Alan Jardim relatou que sofreu ameaças por ter se tornado uma das 19 testemunhas de acusação arroladas para o caso pelo Ministério Público. Pelas redes sociais, Jardim, que cuidava da parte administrativa da UPP da Rocinha, disse ter recebido a seguinte mensagem: “bom cabrito não berra”. No entanto, ele negou ter sofrido qualquer tipo de ameaça direta do major Edson Santos, comandante da unidade na época, tampouco de qualquer um dos réus do processo. O major Edson Santos era o suposto líder de um grupo que teria torturado não só Amarildo, mas outros cerca de 30 moradores da Rocinha.

Primeira testemunha ouvida no julgamento, o delegado titular da Delegacia de Homicídios, Rivaldo Barbosa, que comandou a investigação, disse que a princípio o inquérito apontava que Amarildo foi morto por um traficante, mas depois o caso mudou de figura. “A ação dos policiais foi manobra ardilosa para imputar a terceiros a tortura contra Amarildo”, afirmou Rivaldo. Para Rivaldo Barbosa, os depoimentos eram incongruentes, pois todos tinham a mesma versão. A Polícia Civil desconfiou que o major Edson Santos pressionava os PMs a fazer isso.

À Justiça, a delegada assistente da Divisão de Homicídios Ellen Souto afirmou que os policiais da UPP da Rocinha envolvidos no caso compraram fraldas, deram dinheiro e chegaram até a prometer casas para que os moradores da comunidade sustentassem a versão de que Amarildo teria sido morto por traficantes que atuam na favela.