O cineasta estava em sua casa no Porto (norte de Portugal), sua cidade natal

O cineasta português Manoel de Oliveira, decano mundial dos cineastas, faleceu nesta quinta-feira aos 106 anos, uma notícia que provocou muita emoção no meio cultural e entre os políticos.

O produtor dos filmes de Oliveira, Luis Urbano, anunciou a morte à AFP. O cineasta estava em sua casa no Porto (norte de Portugal), sua cidade natal.

Com inesgotável “fome de viver e filmar”, o diretor completou 106 anos ao lado do público, por ocasião da estreia em Portugal de seu último trabalho, “O Velho do Restelo”, um curta-metragem, em dezembro.

Apesar do frágil estado de saúde, Oliveira dirigiu o curta-metragem, que descreveu como uma “reflexão sobre a humanidade”.

Manoel de Oliveira explorou até o fim seu olhar sobre a condição humana em uma pergunta perpétua sobre o sentido da vida.

O título do curta-metragem é inspirado em um personagem que é uma espécie de profeta da desgraça no poema épico “Os Lusíadas”, escrito no século XVI por Luís de Camões.

Nascido em 11 de dezembro de 1908 na cidade do Porto, norte do país, mas registrado oficialmente um dia depois, Oliveira era o último sobrevivente dos “belos velhos tempos do cinema mudo”, que citava com nostalgia.

O diretor realizou grande parte de sua obra depois dos 60 anos e ganhou fama mundial depois dos 80.

Filho de um empresário que o levava para assistir os filmes de Charlie Chaplin e de Max Linder, que o presenteou com sua primeira câmera, Manoel de Oliveira, atleta campeão de salto com vara e de corridas automobilísticas, estreou no cinema com 20 anos como figurante no filme mudo “Fátima Milagrosa”.

Em 1931 ele rodou seu primeiro documentário, também mudo, “Douro, Faina Fluvial”, sobre a vida dos trabalhadores do rio que passa por sua cidade natal.

Ator no primeiro filme falado de Portugal, “A Canção de Lisboa”, de 1933, Manoel de Oliveira era interessado realmente pela direção. Depois de vários documentários, estreou na ficção com “Aniki-Bobo”, de 1942, sobre a vida das crianças de um bairro popular do Porto.

Com a situação política e a falta de infraestruturas em Portugal durante o regime de Salazar, permaneceu afastado das câmeras. Comandou a fábrica têxtil herdada do pai e os vinhedos da família.

O diretor só conseguiu lançar o segundo longa-metragem, “Acto da primavera”, sobre a paixão de Cristo, em 1963.

A partir de 1971, Oliveira se concentrou na tetralogia “Amores frustrados”, com “Amor de Perdição” (1979) e “Francisca” (1981), principalmente, que rendeu a fama de “cineasta exigente”.

Em 1985 ele comprovou a fama com “Le soulier de Satin”, uma obra de quase sete horas de duração baseada na obra de Paul Claudel, que venceu o Leão de Ouro no Festival de Veneza.

Criador prolífico, dirigiu a partir de 1985 praticamente um filme por ano e trabalhou com atores consagrados, como o americano John Malkovich, os franceses Catherine Deneuve e Michel Piccoli, o italiano Marcello Mastroianni ou os portugueses Luis Miguel Cintra e Leonor Silveira.

Seus filmes, nos quais os diálogos e a música têm um lugar especial, têm a lentidão do Douro de seu Porto natal, com longos planos fixos, parecidos com quadros, e lentos movimentos de câmera.

Várias vezes premiado em Cannes ou Veneza, este “cineasta dos cinéfilos”, casado e pai de quatro filhos, conquistou o grande público já com mais de 80 anos, com “Je rentre à la maison” (2001), no qual Piccoli interpreta um ator veterano que se questiona sobre a solidão, a morte e a velhice depois de perder a família.

Em 2008, o cineasta recebeu uma Palma de Ouro em Cannes por sua trajetória.

“Receber prêmios é algo simpático”, declarou com uma certa malícia.

“O mais belo presente que alguém pode me dar é deixar que eu faça os filmes que me restam. E não são poucos”, completou.