“Eles não nos representam”, afirmam islamitas da Capital sobre ataques à França
Em meio a guerra, a comunidade teme ser associada à violência
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Em meio a guerra, a comunidade teme ser associada à violência
Desde a última sexta-feira (13), o mundo assiste perplexo ao desenrolar da trama que resultou na morte de 129 pessoas em Paris, na França. Os ataques a seis pontos distintos da cidade chocaram a Europa e trouxeram de volta o estado de alerta contra a ameça terrorista. O Estado Islâmico (EI) reivindicou a autoria das mortes e desafiou as potências mundiais que agora se aliam no endurecimento dos bombardeios ao reduto do grupo na Síria. No meio de tudo isso, estão os seguidores do islamismo que lutam para defender sua religião do preconceito e da intolerância.
“Essas pessoas [integrantes do Estado Islâmico] não nos representam. Na verdade, o profeta Maomé rejeita completamente a forma como eles agem. Não fazem isso por fé, é por vingança”, explica o sírio Ghassaan Chaffouni, 57 anos. Distantes, fisicamente, do conflito, ele e outros membros da comunidade islâmica de Campo Grande acompanham com tristeza e preocupação os desdobramentos da guerra.
De acordo com a comunidade, o Islã não pode ser confundido com terrorismo. “A nossa religião é de paz, de respeito. As pessoas precisam entender que não temos nada a ver com estes grupos que têm outros interesses e motivações por trás das ações”, explica o também sírio Marzuk Hauauche, 70 anos.
Ele chegou a Campo Grande aos 19 anos, se casou e constituiu família. “Costumo dizer que sou mais brasileiro do que quem nasce aqui, pois escolhi ser brasileiro”, diz ao explicar que o adjetivo de “pacífico” foi um dos motivos de ter se fixado por aqui.
Preconceito
Usando a fé como justificativa para suas ações terroristas, o Estado Islâmico, a Al Qaeda e outras organizações terroristas acabaram por reforçar o preconceito e desconhecimento do ocidente diante do islamismo. Estima-se que pelo menos 1,5 bilhão de pessoas siga a religião em todo o mundo, segundo o instituto americano Pew Forum on Religion & Public Life. O número equivale a quase 25% da população do planeta, ou seja, imaginar que todo este contingente populacional é formado por terroristas é no mínimo ingênuo, não?
No entanto, ainda segundo Marzuk, é inevitável admitir que os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 às torres gêmeas mudaram a maneira como a comunidade é vista. Se o Islamismo já era desconhecido, agora ele ganha rótulos e associações cada vez mais negativas, uma verdadeira perseguição. “As pessoas passaram a nos identificar como terroristas. Isso é muito complicado e nos preocupa muito”, diz.
Quem também percebe tal mudança é a brasileira Laila Dawud, 26 anos. Filha de palestinos, ela explica que dificilmente sofre com demonstrações de intolerância e preconceito em Campo Grande, mas confirma que essas práticas não são novidade para a comunidade.
“É complicado pois hoje a mídia mostra muito isso. Qualquer tipo de terrorismo é associado ao islã, sendo que qualquer pessoa que se preste a se informar saberia que não é isso que a religião prega, muito pelo contrário, o Alcorão pune qualquer tipo de ato terrorista, violência e coisas do gênero. A palavra Islã significa Paz, a começar por aí. Esse preconceito gera medo sim, aqui em Campo Grande dificilmente passo por esse tipo de preconceito, mas muitas amigas que moram em São Paulo relatam diariamente como é frustrante a ignorância e o preconceito das pessoas, algumas até já sofreram agressão física como se não bastasse verbal e moral.”
Quem mais sofre somos nós
Imediatamente após os ataques a Paris, o governo francês iniciou suas respostas à barbárie terrorista. Raqqa na Síria, principal reduto do grupo, tem sido bombardeado incessantemente desde a sexta-feira (13). Nesta terça (17), a França e a Rússia anunciaram cooperação, inédita em 70 anos, na missão de eliminar o EI. No entanto, quando os ataques são realizados pelo o outro lado, as informações não são divulgadas com tanto empenho, pelo menos é o que alega a comunidade islâmica.
“Não aparece muito os ataques que eles fazem lá na Síria, por exemplo. Muitas pessoas morrem lá também. No fim, quem mais sofre somos nós”, diz Mazurk.
Há muito tempo o norte da África e o Oriente Médio sofrem com os ataques e guerras travadas ali por países como EUA, França, Inglaterra e outros aliados. Sob a justificativa de combater grupos ditatoriais – e explorar recursos – , essas nações levaram muita violência e medo ao mundo árabe-muçulmano.
Sob a alegação de que o regime de que Saddam Hussein estocava armamento nuclear, George W. Bush justificou ataques e invasões ao Iraque, em 2003. E as incursões bélicas não param por aí. Em 2011, a França articulou uma coalizão bélica para intervir na Líbia e assassinar Muamar Kadafi.
Com as ações, se multiplicam a violência, as mortes e a fuga de refugiados que tentam chegar à Europa. Por lá, os fugitivos da guerra não são bem-vindos e vários países estudam fechar as fronteiras para este povo. Com o último atentado e o possível envolvimento de um refugiado nas ações, a situação de quem procura uma vida longe do conflito deve ficar ainda mais complicada. Uma guerra sem fim, que se alimenta das feridas abertas pela exploração história nessa região.
Islamismo, Islã, islamitas e muçulmanos?
Há muita confusão e desconhecimento sobre os termos relacionados a esta fé. O islamismo é a religião enquanto a palavra islã se refere ao mundo dos seguidores do islamismo. Islamitas são os seguidores do islamismo, também conhecidos como muçulmanos. Já o termo árabe se aplica àqueles que nascem em países de língua árabe.
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