Família não sabe da profissão

Enquanto o jeito de achar clientes mudou com anúncios na internet, grupos no Facebook e WhatsApp, o medo de assumir as atividades ainda assombra profissionais do sexo em . São inúmeras histórias de vidas duplas como a ‘falsa diarista’ que atua como garota de programa enquanto marido e filhos acham que faz faxinas, ou o paraguaio que sai com mulheres e diz aos parentes que é vendedor.

A necessidade de ‘esconder essa vida’ é tanta, que a maioria dos profissionais do sexo passam a viajar de cidade em cidade, atuando em casas locais como ‘atração de fora’ até enjoar a clientela. “Recém chegada a Campo Grande” é uma das frases comuns nos anúncios que tentam atrair clientes para a ‘novidade’.

Depois de alguns meses, as garotas partem para outras ‘praças’ e o ciclo recomeça, sempre longe de familiares e amigos. Mas, tem gente que decide manter a vida dupla com raízes locais, como uma ‘falsa diarista’ que sai de casa pelo menos três vezes por semana para fazer programas, enquanto o marido e os dois filhos acham que faz faxinas.

A mulher tem 32 anos, é bonita, tem cabelos longos e um belo corpo. Mãe de duas crianças, ela conta que faz o trabalho de ‘massagista’ pelo menos três vezes a cada semana para garantir ganhos que não ganharia como diarista. Casada há 10 anos, ela mantém o marido alheio ao que realmente faz. Para ele o trabalho é de diarista. “Não falo para ele de todo o dinheiro que ganho. O resto fica comigo e gasto comigo”, diz ela.

Receosa, já que o marido não sabe de sua profissão, ela é contida e às vezes reticente durante a conversa. Mas, ao falar sobre os perigos, um tom de preocupação toma conta de sua voz. Segundo ela, nunca foi agredida por nenhum cliente, e o medo de que pudesse acontecer a fez optar por uma casa de massagem.

Já sobre os clientes ela é categórica, “Não é fácil, já que você não pode ficar recusando clientes. Mas, já cheguei a recusar alguns pela aparência ou pelo medo da cara de ‘doidos’”, conta. Clientes apaixonados já foram muitos, mas ela tira de letra. A paixão dela é pelo marido e pelos filhos, garante.

O quanto ganha por semana, ela não revela. Mas conta que chega a fazer quatro programas por dia, e ganha R$ 100 por cada ‘atendimento’. Com o dinheiro ‘extra’ ela já comprou uma motocicleta e diz que mantém os luxos do salão de beleza. “Tudo é muito caro e nessa profissão a aparência conta muito”, explica.

Além disso, ela conta que usa a parte do dinheiro que não contabiliza no orçamento doméstico com mimos para os filhos que não teria condições de bancar sem fazer programa. Segundo ela, o marido nunca desconfiou. “Ele nem sonha. Trabalho três vezes na semana como ‘diarista’, levo algum dinheiro para casa, e o restante fica comigo”, conta.

Falta de oportunidades

Ramón é paraguaio, mas usa ‘Felipe’ como nome profissional porque acha ‘mais tchique e brassilêro’, conforme explica sem esconder o sotaque carregado. Além do nome falso, o jovem de 28 anos também inventou uma carreira para justificar as saídas em casa. Ele mora com parentes em Campo Grande há um ano, desde que veio de Assunção em busca de oportunidades.

O emprego, que seria mais fácil no Brasil, demorou a chegar e ele recorreu para um serviço que já tinha feito no Paraguai: é garoto de programa. Com anúncio de jornal, arruma clientes e se orguilha de ‘só atender mulheres’. “Realizo fantasias, mas tem de deixar claro aí que só atendo mulheres. Aqui tem muitos homens que procuram”, ressalta.

Em Assunção, ele trabalhava como vendedor e esporadicamente fazia extras como garoto de programa. Por cada serviço, cobrava 100 mil guaranis, aproximadamente R$ 60. Em Campo Grande, passou a cobrar R$ 50 reais e chega a atender até três clientes por dia. Ele diz que dá para pagar o aluguel e ‘tentar sobreviver’.

Tanto aqui como no Paraguai, ninguém desconfia da vida dupla e Felipe diz que ‘inventa’ produtos para dizer que é vendedor e justificar as saídas. “Como eu me viro com o dinheiro, ninguém fica perguntando”, explica.

Para o futuro, os planos do jovem são de ‘largar esta vida e ter uma família”.

Ele diz que os perigos são os mesmos para mulheres e homens quando mantêm uma vida secreta. “Nunca faço programas de noite para não correr riscos. Esta vida não é boa”, explica.