‘Posso não convidar’? Natal e Ano Novo reacendem debate sobre romantização de mães
Afinal, filhos têm o direito de não convidar mães ou de não ceiar com elas nas festas de fim de ano? Psicóloga comenta problemática envolvendo a romantização da figura materna na sociedade sul-mato-grossense
João Ramos –
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Se não convidar a mãe para próprio o casamento já é uma polêmica e tanto, excluir a matriarca das festas de fim de ano é outra atitude corajosa que dá muito pano pra manga. Com Natal e Ano Novo se aproximando, a dúvida sobre chamar ou não a figura materna “desquerida” toma conta de algumas famílias e reacende o debate sobre romantização de mães. Afinal, “mãe é mãe” mesmo e é preciso “ser honrada” a qualquer custo, independente do quão ruim tenha sido para seus filhos?
A discussão é profunda e envolve uma série de questões pragmáticas e religiosas – estas que muitas vezes interferem e até impedem filhos de não convidarem genitoras desagradáveis para confraternizações importantes: formaturas, casamentos, aniversários, ceias de Natal e Ano Novo…
Até porque escolher deixar a mãe de fora desses eventos, ou se recusar a ceiar com elas causa julgamento – e não importa quais tenham sido as motivações dos que decidiram deixá-las de fora.
Normalmente, o julgamento costuma vir acompanhado da romantização da figura materna: “é sua mãe”, “mãe é sagrada” e “não pode fazer isso” são comentários comuns ouvidos por aqueles que optam por exclui-las de certos momentos da vida.
E encarar essa idealização da sociedade em cima das mães é “barra” para filhos que já sofreram tanto com certos comportamentos das mesmas, muitas vezes considerados narcisistas e que foram destrutivos ao longo dos anos.
Colocar limites nas mães é importante, destaca piscóloga
Para a psicóloga Antônia Brito, que realizou um estudo chamado “Função Materna Narcisista: o impacto do desenvolvimento psíquico”, em Campo Grande (MS), os filhos têm total direito de não convidar suas mães para celebrações pessoais se não se sentirem a vontade.
“As pessoas que a realizam [qualquer festa] têm o direito de chamar aqueles que gostam e se sentem confortáveis em estar próximos. No caso de uma mãe ou qualquer outro familiar abusivo, convidá-los poderá estragar essa comemoração“, inicia a psicóloga.
A profissional ainda destaca a pressão da sociedade a respeito da decisão de deixar essas figuras de fora. “Infelizmente continuará existindo, afinal vivemos em uma sociedade patriarcal, majoritariamente cristã, onde os conceitos morais superam questões pessoais. Mas cabe aos responsáveis pelos eventos colocar limites e tomar as decisões que considerarem ser mais saudáveis“, observa.
Romantização de mães está atrelada ao cristianismo, afirma profissional
Questionada pela reportagem, Antônia concorda que as mães sejam romantizadas, não só em Mato Grosso do Sul, mas de modo geral na sociedade brasileira. “Isso é perpetuado principalmente pelo cristianismo, tendo como exemplo a Virgem Maria, que representa a pureza e o amor incondicional”, pontua.
“É algo que impacta diretamente na maternidade de modo geral, pois entende-se que mães são seres divinos, que não podem errar, que se dedicam integralmente aos filhos, gerando uma pressão gigantesca para as mulheres que se sentem culpadas e insuficientes, mesmo exercendo uma excelente maternidade. O oposto também ocorre, mesmo nos casos em que essa mãe abusa e violenta seus filhos, estes devem aceitar e perpetuar esses abusos pelo pressuposto da bíblia de ‘honrar pai e mãe’“, salienta Antônia sobre a problemática.
Para ela, o conceito citado acima deve ser desmistificado, pois mães e pessoas que exercem essa função são seres humanos, passíveis de erros e estão em constante aprendizado.
Afinal, como age uma mãe narcisista?
A psicóloga também comenta que é preciso entender que mãe, acima de tudo, é uma função que também pode ser exercida por diversas pessoas como avós, tias, irmãos. “Segundo Donald Woods Winnicott, pediatra e psicanalista no qual a minha pesquisa se baseou, a mãe é aquela que cuida e protege, mas que entende que o filho é um ser independente dela, com desejos e preferências, e que não cabe a ela julgar ou ditar o que é ‘correto’. Mas cabe a ela oferecer à criança um ambiente seguro, que contenha regras mas que permita a exploração e a autonomia para que possa chegar a vida adulta com a psique desenvolvida de maneira satisfatória”, explica.
E embora o termo “mãe narcisista” tenha se tornado popular para justificar ou enquadrar comportamentos abusivos oriundos de genitoras, Antônia chama atenção. “É importante salientar que nem toda mãe ou parente tóxico é narcisista, afinal esse transtorno de personalidade é difícil de ser detectado e requer a identificação de diversas características”.
Para o profissional confirmar o diagnóstico de Transtorno de Personalidade Narcisista é necessário que a pessoa avaliada apresente: “um padrão difuso de grandiosidade, necessidade de atenção e falta de empatia. Em relação à função materna, esse quadro apresenta especificidades, pois a mãe tem um comportamento infantil, incongruente e inflexível, entende-se como ‘dona da verdade’ não aceitando contestações ou opiniões, ao mesmo tempo que nunca se considera culpada pelos próprios erros, terceirizando a responsabilidade para a vítima e invertendo situações“, ressalta.
“Mostra-se arrogante, soberba, grosseira, vingativa e tóxica com a família, mas devido a necessidade de aprovação, constrói uma personalidade oposta para amigos e colegas, principalmente pela necessidade de poder e influência na comunidade. Utiliza do título de mãe para validar suas atitudes abusivas, não respeitar limites, não pedir desculpas e praticar bullying. Essas ações ocorrem durante toda a criação, usando a manipulação e a agressivo-passividade para controlar os filhos”, cita a profissional.
Como o convívio com uma mãe narcisista afeta os filhos para o resto da vida
Diante disso, Antônia Brito pontua algumas recomendações que qualquer pessoa pode colocar em prática ao notar que está diante de uma mãe ou sogra narcisista. “Buscar a psicoterapia é o primeiro passo para entender como a relação com essa mãe vem afetando o individuo e suas relações, mas, em muitos casos, por ser uma relação de difícil solução, ter que cortar relações com a mãe ou sogra poderá mostrar-se como a única saída provável para que a pessoa consiga encontrar a sua liberdade, independência e felicidade”.
Caso o corte não seja estabelecido de maneira eficaz, a psicóloga diz que o ciclo geracional de violência pode ser perpetuado pelos filhos, que poderão se tornar pais ou mães que não conseguem transmitir segurança e apoio a seus herdeiros, além de consequências para suas vidas pessoais.
“Aqueles que crescem e convivem com pessoas narcisistas podem apresentar problemas de autonomia, necessidade de aprovação, comportamentos de autossabotagem, masoquismo e dificuldade de desvincular-se devido ao controle exercido a partir dos abusos. Uma vítima sobrevivente a seu crescimento pós-traumático precisa de uma rede de apoio e aconselhamento, participar de um processo psicoterapêutico e quebrar o ciclo geracional da família desestruturada”, elenca.
Como “cortar as asinhas” de uma mãe abusiva?
E qual a melhor maneira de agir diante da insistência de ações tóxicas de uma mãe narcisista da qual você rompeu e cortou laços, mas que insiste em tentar interferir na sua vida e participar de eventos como casamentos, aniversários ou festas de fim de ano?
“Em casos mais graves, a vítima pode recorrer à polícia, abrindo um boletim de ocorrência, e até solicitar uma medida protetiva se entender que pode estar correndo riscos. Em suma, é necessário afastar-se completamente da mãe para que se possa viver com felicidade e individualidade, pois isso permite a emancipação psicológica e emocional, cultivando o amor próprio e a autonomia“, finaliza a profissional.
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