Nas ruas de Campo Grande, árvores frutíferas fazem alegria dos ‘mãos leves’ de plantão

É possível encontrar frutas em vários espaços públicos  

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É possível encontrar frutas em vários espaços públicos

 

Só mesmo quem vive numa capital com ‘cara’ de interior, como é Campo Grande, sabe o privilégio que é desfrutar dos prazeres de uma vida mais tranquila. Embora os tempos sejam outros, muitas características ainda estão presentes no dia a dia do campo-grandense. Como, por exemplo, a tranquilidade de ‘panhar’ uma fruta no pé e degustá-la ali mesmo, debaixo da sombra da própria árvore. 

Nessa época do ano, na qual muitas delas estão fartas de frutos, não é difícil encontrar os chamados ‘mãos leves’ aproveitando a oportunidade. Mas, quem nunca? Segundo levantamento da Semadur (Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano), feito em 2011, para elaboração do PDAU (Plano Diretor de Arborização Urbana), nas sete regiões da cidade foram computadas pouco mais de 153 mil árvores em vias urbanas, sendo 59% de espécies nativas. Não há dados estatísticos sobre a quantidade de frutíferas.

Moisés Cominesi / Foto: Cleber Gellio

Para não dar espaço ao azar e muito menos aos vizinhos ranzinzas, o Jornal Midiamax foi atrás dessas frutíferas que estão dando ‘sopa’ pelas ruas. Encontramos uma porção de frutas que não imaginávamos. A manga, abundante entre novembro e dezembro, é a mais conhecida e fácil de ser achada, está presente em quase todos os bairros. Alguns minutos circulando e já demos de cara com o mecânico Moisés Cominesi, 40, na busca por uma amarelinha no alto da mangueira. Na ponta da vara um cesto feito artesanalmente para amortecer a queda da fruta. Tudo calculado para não deixar a sobremesa cair. “Tem que fazer corretamente, assim não desperdiça. Depois do almoço a gente tem uma fruta saudável para comer e ainda dá para fazer um suco no final da tarde”.  

Luiz Mauro/Fotos: Cleber GellioNão menos conhecida, a goiaba é outra das preferidas do público ligeirinho, por ser prática para se consumir. Na Mata do Jacinto, encontramos umas ‘gigantes’ daquelas que só encontramos no mercado e custa o olho da cara. Com tamanho fora dos padrões, chegam a envergar os galhos da goiabeira. Embora estejam dentro do quintal, algumas ultrapassam o limite do muro e o que fica para o lado de lá, o dono Luiz Mauro Soares, 42, não se importa de compartilhar. “Foi plantada para isso mesmo. Ter uma goiaba com essa qualidade no fundo de casa é muito bom e seria injusto não dividir”, salienta o repositor, que ainda cultiva no mesmo terreno um exemplar de ata.

Zélia Silva / Fotos: Cleber Gellio

Bem próximo dali, topamos com um renegado que virou xodó: o limoeiro da Avenida Alberto Araújo Arruda. Ele é do tipo rosa e nasceu sem querer, foram algumas sementes misturadas com os restos orgânicos utilizados para adubar uma palmeira real. “Foi a única que sobrou de várias que havia aqui e que foram roubadas por causa de seu valor. Daí o pé de limão germinou e foi crescendo no mesmo espaço com a palmeira e seus espinhos impediam que ela fosse levada. No inicio minha intenção era retirá-lo, mas depois ele se tornou o queridinho”, brinca Zélia Silva de Moraes, 59, costureira no local há 15 anos. Ela ainda ressalta que, além da sombra que quase sempre está ocupada, quando o preço do limão dispara muita gente colhe o fruto. 

O reduto 

Carambola, tamarindo, laranja, romã, amora, manga e jaca. Isso tudo quase num mesmo local: a rua Joaquim Avelino de Rezende, na Vila Rosa Pires.  Uma das responsáveis por boa parte desta diversidade é dona Altamira Vilela Roland, 70. Pioneira, há 45 anos iniciou o trabalho de disseminação da ideia de se ter frutas pelas ruas do bairro. Em frente ao sobrado onde mora está uma das árvores mais bonitas e que chama atenção de quem passa por ali: a caramboleira. Ao falar sobre as pessoas que pegam os frutos, ela é categórica. “Sempre digo com aquele que está com uma sacolinha: pensa no próximo. É um privilégio ter uma árvore dessas em seu caminho. Na verdade não sou eu quem doa a fruta, mas sim Deus. Pois se a natureza não quiser, quem sou eu paga negar?”, interroga.

Altamira Vilela / Fotos: Cleber Gellio

Com as cores, verde e amarela, tão habituais aos nossos olhos, a árvore ornamental de pequeno porte, além de produtiva, se destaca por ser uma das poucas em espaço livre na cidade. “Essa tem mais ou menos uns 25 anos, mas antes dela já havia outra que foi retirada sem eu saber. Além dela, tem mais outra lá na esquina. Eu que incentivei a proprietária a plantar”. Realmente tem e junto com ela duas amoreiras.

Um pouco mais abaixo é mole notar a espalhafatosa e vitima de bullying frutífero: a jaqueira. Fica bem aos ‘pés’ da Capela São Cristóvão, à esquerda de quem desce a Chaadi Scaf sentido centro. Baixinha, essa não estava carregada, mas sim ‘bufando’. É fácil de tocar, se tiver uma estatura mediana é preciso abaixar a cabeça para não dar de cara com uma das mais pesadas. Notável e resistente pelo tamanho de seus frutos é capaz de sustentar uma pessoa durante horas. “É um alimento abençoado, eu adoro jaca”, conta dona Maria Aparecida Almeida, 60, que se mudou para a casa onde já estava a jaqueira há mais de 20 anos.   

Ata, araçá, acerola e laranja

No meio do caminho tinha uma fruta

“No meio do caminho uma fruta do pé, laçar o gado na casa do vizinho, tomar banho gelado no chuveiro forte e as árvores que eu nunca tinha reparado que estavam ali. Seu senso crítico é tão mais puro”. Não, esse não é um trecho de nenhum livro romântico, muito menos dos autores anônimos da internet, mas confesso foi por meio dela que conhecemos essa história.

Num post publicado em sua time-line a cabeleireira Daniele Gaspariam (Dani), 24, que mora em São Paulo desde que nasceu, descreve ter descoberto que na maior metrópole do mundo também existem coisas simples e surpreendentes ao mesmo tempo: como as amoras. 

Daniele Gaspariam/Arquivo Pessoal

Isso foi há pouco mais de dois meses quando o namorado, o diretor de arte sul-mato-grossense Jhully Espíndola, 24, colheu os frutos durante um rolê pela capital paulista. “Quando você nasce em uma cidade como São Paulo, você não dá valor às coisas simples. Não percebe que tem nem árvores na cidade, pois aqui é caótico, muito estresse. A gente não sabe o que é comer uma fruta do pé. Você não sobe em árvores e nem sabe laçar gado. Não sabe como é tomar banho de rio e nem essas coisas todas tão lindas e simples. Mas daí você conhece um sul-mato-grossense que te mostra que tudo isso pode sim ter aqui na sua cidade”.

Amante da bike, Dani tirou um tempinho, encostou a ‘magrela’ e veio conhecer Campo Grande. Por aqui teve a oportunidade de conviver um pouco mais com a realidade da capital morena. “Tem muita fruta na cidade. Muitas árvores, cachorros, gatos e pássaros. É outra coisa, outro clima, enfim, outra vida. Sem preocupação, sem buzina e todo mundo calmo”, revela.

Foi essa calmaria que, Nalva Souza,50, encontrou quando se mudou com família de Santos, no litoral paulista, para Campo Grande há 15 anos. Com perfil de cidade grande “lá era impossível cultivar qualquer tipo de planta sem que alguém destruísse”, lamenta. Para compensar, ela transformou a casa de esquina no bairro Tiradentes num verdadeiro pomar. “Na calçada tem quatro tipos de frutas: acerola, caju, laranja e romã. Sem contar o pé de pitanga que temos na parte de dentro”.

Improvável
Durante nossas buscas fomos surpreendidos por uma espécie bastante incomum: o araçá, conhecido popularmente como goiabinha, por ter o aspecto parecido. São três pequenas árvores localizadas na Avenida das Bandeiras. “Essa fruta a gente só acha na beira do rio, aqui na cidade nunca vi. Dizem que foi a Prefeitura que plantou há alguns anos atrás”, diz Celso Josué Vilhagra, 52, funcionário do lava-jato em que se encontram as raridades. Sempre vigilante, entre uma mão e outra, ele alerta: “Não pega verde, amarelinha é bem mais gostosa”.

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